sábado, 7 de agosto de 2010

AFFONSO ROMANO DE SANT'ANNA

Affonso Romano de Sant’Anna, 1937, é um dos maiores nomes das letras do nosso país. Do nosso país e do mundo. Esse mineiro de Belo Horizonte, que reside oficialmente no Rio de Janeiro, mas que pode estar a qualquer momento em qualquer lugar, é incansável arauto da poesia. Só da poesia? Não. Embora, em seu caso, ser só poeta já nos bastasse. Ele é jornalista. Foi considerado um dos dez que mais influenciam a opinião pública. Exímio cronista, teve a árdua tarefa – mais que honra, grandíssima responsabilidade! – de substituir o amigo Carlos Drummond de Andrade, em 1984, no Jornal do Brasil. Professor em várias universidades nacionais, trabalhou também em outras do exterior. Na ditadura militar, fora proibido de sair do país. Mas saiu. Lecionando nos Estados Unidos aumentava a nota de muitos dos seus alunos, para impedir que estes fossem mandados à guerra do Vietnã. É conferencista, mundial, de altíssimo nível. Escritor versátil, ensaísta e crítico de reconhecida cultura. Aliás, é admirável esta sua capacidade extraordinária de dialogar com as mais diversas culturas e gerações. Homem que fala e é entendido pelo povo, mesmo quando tem sob perfeito domínio as línguas de fogo quase ininteligíveis da academia. Recebeu incontáveis prêmios. Sua tese de doutoramento, transformada em livro – Carlos Drummond de Andrade, o poeta ‘gauche’ no tempo – mereceu nada menos de quatro prêmios nacionais. Quem já leu essa obra intuirá que dificilmente alguma coisa pode ter sido escrita sobre o poeta de Itabira, naquela ocasião, em mais alto nível e tão perfeita qualidade. Affonso fez e continua a fazer muito pela cultura do Brasil. Ele já presidiu a Biblioteca Nacional – a oitava maior do mundo – e foi, entre os anos de 1990/1996, o mentor da modernização tecnológica dessa instituição. Nesse período lançou programas de projeção nacional e internacional. Por isso, quando ele hoje critica ou insiste em determinados aspectos dos métodos de Educação (leitura, por exemplo), ele o faz com a autoridade de quem sabe o que diz, porque já experimentou meios bem sucedidos aí, tanto quanto na sua vasta experiência profissional em diversas partes do mundo.
Mas fixemo-nos um pouco mais no poeta, porque isso ele o é em tempo integral. Além de marido da Marina Colasanti, também escritora, e pai de duas lindas filhas. Seu primeiro livro de poesia é de 1965, "Canto e Palavra". Seu nome, entretanto, já era conhecido em publicações culturais do país desde 1956. Participou dos movimentos de vanguarda que agitaram a poesia brasileira dos anos 1960. Só a poesia? Não, embora em seu caso bastasse. Ele quis atuar, também, nos movimentos políticos e sociais de então. Foi, por exemplo, em perigosos tempos de ditadura que veio a lume o desconcertante “Que País É Este?” (1980). Com poesia fez revolução, seus versos invadiram jornais e lugares até então pouco usuais a coisas de poeta. Nas barbas do ditador, todo mundo ousou não apenas perguntar, mas também responder, com a lira feérica do Affonso.
Outros livros de poesia: “Poesia Sobre Poesia” (1975), “A Grande Fala Do Índio Guarani” (1978), “Política E Paixão” (1984), “A Catedral De Colônia” (1985), “O Lado Esquerdo Do Meu Peito” (1992), “Textamentos” (1999). Quis aqui apenas ressaltar o poeta, mas não nos esqueçamos que é bem mais ampla a sua bibliografia em prosa: ensaios, livros de crônica, etc.
Affonso foi amigo de pessoas muito especiais, como Clarice Lispector. Sempre esteve próximo das maiores expressões literárias do seu tempo, do seu país e de todo o mundo (como Octavio Paz, Elizabeth Bishop, Saramago e muitos outros). Trouxe, inclusive, o filósofo francês Michel Foucault ao Brasil. Mas nunca perdeu a simplicidade, não se distanciou daqueles que o admiram e veneram. Sendo tão grande, faz-se às vezes pequeno para estar mais próximo dos que dele muito aprendem. E não é apenas um grande poeta, mas uma grande pessoa. Está aí um homem que se deixou seduzir pela palavra, e pela mesma palavra nos seduz. Quis ser poeta e não sossegou enquanto a poesia não baixou de vez, para além dos lençóis adolescentes, nos seus versos todos. Explico. Quando ele era adolescente, uma vez procurou Manuel Bandeira. Este era considerado então o maior poeta do país. O rapazinho mineiro não se intimidou, juntou seus versos e foi levá-los pessoalmente ao “poetão” nacional. Bandeira o recebeu, prometeu que leria e escreveria dizendo o que achou. Um dia chegou a carta, que começava assim: “Achei muito ruins os teus versos”... Mas logo Manuel citou três poemas “melhores” e os derradeiros versos do Poema aos poemas que ainda não foram escritos. Affonso, que sempre amou a verdade, ficou feliz com a crítica sincera. Concluiu, nesse dia, que a poesia era possível. E, como já sabemos, ela aconteceu.

Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 07 de agosto de 2010.
Blog: http://www.antoniofabiano.blogspot.com/
E-mail: seridoano@gmail.com

Um comentário:

  1. Nesse feriado prolongado tive a alegria de conhecer a bela Vitória-ES. E andando pela rua dessa mesma passei em frete de um sebo. Não resisti e tive que entrar. E logo pensei num frei que é apaixonado pelo Affonso. Eu pensei comigo vou ver se tem algo de desse tal cara e perguntei para atendente. Logo me mostrou algumas de suas obras. E tive que comprar algo de um tal Affonso. Pois, ao lê-lo não tem como deixar de gostar. Uma leitura de um requinte, de uma inteligência enfim, cessem as palavras. Como disse um professor para mim em sala: "Poesias, crônicas, música você não precisar interpretar, ou seja, somente tirar uma mensagem para ti, pois ela transcede a nossa interpretação". É isso mesmo a leitura desse homem transcede a nossa razão, ou seja, nem tudo a razão alcança.Basta sentir. Sintam, leiam, desgustem, amem, embriaga-se a leitura deste cara. E o livro que eu comprei dele chama-se Mistérios Gososos. Então "gosem" da leitura deste grande poeta, cronista, jornalista, enfim "gosemos" de sua leitura. São os mistérios. Valeu pela indicação... Fellipe Toledo.

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