terça-feira, 30 de novembro de 2010

LÊDO IVO - numa formidável entrevista...


O escritor Lêdo Ivo em descontraída fotografia disponível na Web

Em entrevista a Geneton Moraes Neto, o acadêmico Lêdo Ivo, poeta e ensaísta, diz o que pensa sobre poesia, literatura, educação etc. Revela até qual o pior verso da língua portuguesa, e qual sumidade – das nossas letras – ele considera um “b*****”. Boa entrevista, vocês rirão bastante, mas ouvirão também coisas muito sérias.

Veja o vídeo por este link:
http://video.globo.com/Videos/Player/Noticias/0,,GIM1219770-7823-ESCRITOR+LEDO+IVO+DIZ+O+QUE+PENSA+SOBRE+O+BRASIL,00.html

Fonte: globo.com

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

PERDA EM TRÂNSITO

Esta semana fui surpreendido por uma daquelas notícias que, simultaneamente, nos entristecem e revoltam. Da minha longínqua cidade de origem, a preciosa Cerro Corá, informaram-me de um acidente automobilístico sofrido por um casal amigo nosso e vizinho. A mulher feriu-se gravemente, sob duras penas recupera-se. O marido perdeu a vida. Isso entristece. A causa do acidente? No outro lado da história um inqualificável, alcoolizado, no volante. Essa é a parte que revolta.
Acidentes acontecem todos os dias, em todo o mundo. Alguns são mesmo inevitáveis, e qualquer um de nós está exposto a perigos – seja eu ou você, o papa que é pop ou a linda princesa da Grã-Bretanha. Mas quando se trata de algo assim, que poderia muito facilmente ter sido evitado e só aconteceu por causa da irresponsabilidade de alguém que não respeitou as leis do seu país, os bons costumes da civilidade e aquilo que chamamos de bem do próximo... O que dizer?
Aqui em Minas nos deparamos frequentemente com esse problema. Vocês estão cansados de ver nos noticiários os recordes de acidentes em nossas rodovias. As estatísticas são alarmantes, sobretudo nos feriados e nas grandes festas do ano. O pior é a constatação de que muitos desses males poderiam ter sido evitados e têm quase sempre a mesma causa: imprudência na direção e álcool (não nos motores, mas nos motoristas). Aliada a isso, não bastasse o muito já dito, vê-se com frequência a impunidade dos que matam no trânsito e por sorte não morrem.
Somos obrigados a ouvir muitas vezes a assertiva “se beber não dirija” ou “aprecie com moderação”... E, no entanto, muitos dos que bebem – com ou sem moderação – se julgam aptos para o volante, aptos para a vida em veloz velocidade. Para esses, acidente é coisa que só acontece aos outros, no máximo a meu vizinho, nunca comigo nem com os meus. Quem pensa e procede assim, não apenas corre o risco de perder a vida, mas ainda pode arrastar consigo outras, inocentes, de gente de bem, pais de família, pessoas notadamente sérias na vida e no trânsito.
São muitas as famílias que se desfazem, em situações análogas. Amores que se partem. Filhos que ficam órfãos, como os do meu vizinho. Pais que se desalentam, pela inversão da ordem natural que é perder um filho. Amigos que nem sequer tiveram tempo de dizer “adeus”. E no meio disso tudo a violência (como a de ousar dirigir em estado alterado pelo álcool), o desrespeito ao humano, a impressão de que morrer é banal, porque alguns vivem de modo banal e matam dolosamente, banalmente...
Mas eu e muitos ainda cremos que viver não é banal.

Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 29 de novembro de 2010.
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
E-mail: seridoano@gmail.com

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

MÁRIO DE ANDRADE E O CINEMA

A Folha de S. Paulo de hoje, em seu caderno de cultura – E12 ilustrada – traz uma notícia deveras interessante para os que amam pari passu o cinema e a literatura. Trata-se de uma obra intitulada “No Cinema”, a qual chegará às livrarias no mês de dezembro próximo, com 19 críticas escritas por Mário de Andrade (1893-1945), todas publicadas esparsamente, referentes a cinematografia. Só agora foram reunidas, a facilitar uma leitura organizada, por iniciativa do pesquisador Paulo José da Silva Cunha e da editora Nova Fronteira. Dessas críticas, apenas um texto de 1934 é inédito. Como lembra Alcino Leite Neto, editor da Publifolha, tais textos integram em seu conjunto uma das reflexões mais importantes da primeira metade do século XX no Brasil, a respeito da arte cinematográfica. Cabe lembrar que aquele era um tempo em que ainda se discutia a validade artística da nova linguagem, a que se chamaria definitivamente “sétima arte”. Para Mário de Andrade o cinema já era, indiscutivelmente, Arte.

– NO CINEMA –
AUTOR: Mário de Andrade
EDITORA: Nova Fronteira
PREÇO: não definido
AVALIAÇÃO (Folha de S. Paulo): ótimo

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

EM TEMPO: UMA PRECIOSIDADE...



Olá, pessoal! Já falei desta preciosidade aqui em nosso blog (revejam as publicações de setembro). A DURAÇÃO DO DIA é o mais recente livro de Adélia Prado e saiu este ano mesmo pela EDITORA RECORD. Resolvi hoje postar a capa (divulgação), para encorajá-los a adquirirem a obra. A concepção da capa é da própria Adélia Prado. Em dezembro o blog trará mais novidades sobre a autora...

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

A VELHINHA E O TEMPORAL


Imagem capturada de “Rapsódia em Agosto”, um filme de Akira Kurosawa.

Estimados leitores, gastei muitos dias da semana passada tentando descrever a sequência final de “Rapsódia em Agosto” (1991), um dos últimos filmes de Akira Kurosawa (1910-1998). Este grande diretor japonês é um dos meus favoritos no singularíssimo mundo do cinema oriental. E a descrição da sequência final de seu filme, a meu ver, daria uma bela crônica. Porém...
O filme a que me refiro, eu o vi algumas vezes. Mas o final... (peço desculpas pelo mau exemplo!), precisamente o seu final... eu vi cerca de trezentas a quatrocentas vezes. Não exagero!
Estive pensando muito nisso, porque aquela cena é uma das mais admiráveis que a sétima arte já concebeu, ao menos segundo o meu parecer. Sim, eu tenho uma coleção de “melhores cenas” na cabeça, às vezes repasso tudo, e esta é uma delas...
“Rapsódia em Agosto” não é, em minha opinião, o melhor filme de Kurosawa; mas foi, sem dúvida, o mais comercial (isto nem sempre é bom para a reputação de um diretor de filmes de arte), tendo inclusive em seu elenco o ator Richard Gere; e foi também uma das obras mais comoventes de toda a sua filmografia.
O filme rememora o trauma do ataque nuclear norte-americano às cidades de Nagasaki e Hiroshima, em agosto de 1945, mais de quarenta anos depois do acontecido. Aborda, além do trauma (revivido sobremaneira por uma idosa chamada Kane), a indiferença, a ignorância e as ambições mesquinhas da primeira e da segunda geração do Japão do pós-guerra. Em relação ao país outrora adversário (representado especialmente pelo parente nipo-americano), abre-se um caminho para o diálogo, a reconciliação, o perdão...
Mas nada disso importa em minha crônica! O que realmente importava era a porção que eu não soube descrever, porque não cabe em palavras: a tal sequência final. E, sendo assim, tudo não passa de pura indiscrição da minha parte, uma ousadia sem cabimento! Mas por que insisto em escrever? Escrevo porque não escrevo, ora! Escrever sobre não ser capaz de descrever algo, é mais nobre que acovardar-se e não tentar...
Na sequência a que me referi, em tons psicodramáticos, as personagens (re)vivem, simbolicamente, em meio a um majestático temporal, os acontecimentos do final da guerra. A senhora Kane, talvez a personagem mais lúcida da trama, que perdera o marido na explosão nuclear de 45, resolve ir buscá-lo na cidade, quase meio século depois (algo impossivelmente absurdo!), atravessando a tempestade e arrastando consigo as outras personagens que, inutilmente, tentam detê-la. Ninguém, nem os mais novos alcançam o passo da decidida “velhinha”. O que ali acontece – e eu não pude descrever – é coisa de cinema, não cabe em escrita alguma. Uma mulher octogenária e um guarda-chuva, o temporal imenso, o quase impossível “silêncio” introduzido pelo mestre Kurosawa na culminância do drama, mais aquela súbita música, meu Deus!, a (in)esperada música...
Queira, meu aplicado leitor, cinéfilo de carteirinha ou não, ver ou rever o filme – do começo ao fim, nunca seguindo meus maus exemplos de explorar uma única cena trezentas ou quatrocentas vezes! E rendamos graças a quem nos deu essa maravilha, a que podemos chamar de verdadeira obra de arte.
(Crônica ao amigo Guilherme Henrique Nakamoto)

Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 22 de novembro de 2010.
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
E-mail: seridoano@gmail.com

AKIRA KUROSAWA - Grande Mestre do Cinema Japonês. "Rapsódia em Agosto", o filme.


O cineasta Akira Kurosawa (1910-1998)
Foto Divulgação



RAPSÓDIA EM AGOSTO

Título Original: Hachigatsu no Kyoshikyoku (“hachi-gatsu no kyôshikyoku”)
País de Origem: Japão
Ano: 1991
Duração: 98min
Diretor: Akira Kurosawa
Elenco: Richard Gere, Fumiko Honma, Hisashi Igawa, Mitsunori Isaki e outros.

Este filme faz parte da última fase do diretor. A partir de 1975, Kurosawa precisou de dinheiro estrangeiro para viabilizar seus projetos. Consagrou-se no exterior, mas já não era bem visto pelos produtores de seu próprio país. Vítima do ressentimento do Japão em relação ao Ocidente, vigente desde o fim da Segunda Grande Guerra, ele foi chamado de diretor de exportação.
Akira Kurosawa foi um dos cineastas mais importantes do Japão. Seus filmes – dirigiu mais de 30 – até hoje influenciam artistas de todo o mundo. É considerado um dos diretores mais importantes da história do cinema.
Dizem que ele se desesperava se o sol ousasse fugir, durante as filmagens, antes que a tomada perfeita, com a exata luz por ele imaginada, tivesse sido feita.

Outros dois filmes de Akira Kurosawa, mais recentes e bem acessíveis (isto é, possíveis de se achar em locadoras comuns): Yume (na locadora diga “Sonhos”), de 1990 e Madadayo (br.: Madadayo; pt.: Ainda Não!) de 1993.

sábado, 20 de novembro de 2010

A JARRA VAZIA

Inclinei meu coração
E foi como se tivesse deitado uma jarra
Derramando toda a água...

Uma jarra vazia, o que vale?
E esta água no chão?

Quem soube isso
Soube o amor
De Deus ou dos homens...

O amor.

Antonio Fabiano
Direitos reservados

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

RACHEL DE QUEIROZ

Rachel de Queiroz (1910-2003)
Imagem disponível na Web.


Rachel de Queiroz faria hoje 100 anos...
Nasceu em 17 de novembro de 1910, em Fortaleza - CE.
Escreveu romances, peças de teatro e muitas crônicas.
Estreou na literatura com o famoso “O Quinze” (1930).
Foi a primeira mulher a ingressar na Academia Brasileira de Letras (1977). Foi a primeira mulher a receber o Prêmio Camões (1993).
Aos 82 anos lançou seu romance “Memorial de Maria Moura” (1992).
Esta última é a mais extensa e complexa de suas obras.
Faleceu no Rio de Janeiro, em 04 de novembro de 2003.

Seu centenário de nascimento será marcado pela publicação de um livro inédito de poesias: MANDACARU. Edição em fac-símile, esta obra se lança hoje pelo Instituto Moreira Salles do Rio de Janeiro. São dez poemas, versos da juventude, com temas nordestinos. Rachel escolheu nunca publicá-los, projetando-se acertadamente como romancista. Mais de oito décadas passadas, vem à luz esta raridade.
Como será Rachel em versos?

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

FERREIRA GULLAR, EM ALGUMA PARTE… AQUI!


O poeta Ferreira Gullar em fotografia de Antonio Fabiano

Ferreira Gullar, o poeta, esteve semana passada aqui em Belo Horizonte, na Academia Mineira de Letras, para bater um papo conosco, bem informal mesmo!, e lançar seu novo livro, “Em alguma parte alguma”. Foram onze anos de silêncio poético, o que parece muito no tocante a alguém que é tão presente e ativo no cenário intelectual brasileiro. E por que não dizer, também, político? Quem não se divertiu ou se irritou – dependendo de qual lado estivesse! – lendo suas crônicas dominicais, nada poéticas, destes últimos meses que precederam as eleições da República? Pois é, infeliz na política (seu candidato não ganhou), mas muito feliz na poética e no amor! Sua companheira, uns quarenta anos mais nova do que ele, também é poeta. E Gullar, nós já sabemos, é este gênio celebrado em toda parte. Sua obra passada está mais presente do que nunca, e este novo livro só vem confirmar que ele é poeta rei e ninguém lhe tira a coroa. Também disso ele não cuida, nem se importa! Que importa? Sabe o que faz e diz o que quer, sem papas na língua! Tá nem aí!... Aos 80 anos de vida, mais de sessenta de consciente poesia, o menino nascido em São Luís do Maranhão e autor do imortal “Poema sujo” está em pleno vigor! Motivos tem para tanto, não tem? E justiça lhe é feita! Recebeu, há pouco, a mais alta distinção que se dá a escritores em língua portuguesa: o Prêmio Camões. Eia, poeta! Como eu dizia, Gullar veio a nós com o seu reino. Falou-nos de sua poesia, de sua vida – o que, afinal, é a mesma coisa. E, naturalmente, nos fez rir do começo ao fim da fala, falando sempre sério, como ele disse, rindo. Dialogou com um seleto público de pouco mais de cem pessoas que, embora seletíssimas, não se mostravam capazes de formular uma pergunta com raciocínio lógico, começo, meio e fim, diante do monstro sagrado. Que importa? Ele respondia, assim mesmo, com inteligência e irreverência, quase brigando com alguns, teimando com outros, dizendo o que ajuíza sobre tudo, até sobre Deus ou não Deus, naquele jeito de paizão excêntrico que a gente ama. É sempre muito bom reencontrar Gullar! Octogenário e mais jovial do que nunca! Com ele aprendemos muito sobre a vida, experimentamos dupla alegria! Duplo ele mesmo, tal como são dois os “ll” do seu nome! Duplo Gullar porque, segundo ele anda a dizer: “Foi-se formando / a meu lado / um outro / que é mais Gullar do que eu // que se apossou do que vi / do que fiz / do que era meu // e pelo país / flutua”... Quem ousará discordar de um homem assim? Vale por dois, por três... por mil!

Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 15 de novembro de 2010.
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
E-mail: seridoano@gmail.com

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O livro do poeta Ferreira Gullar, EM ALGUMA PARTE ALGUMA, foi publicado no Rio de Janeiro, pela Editora José Olympio. Da referida obra, os versos citados no final da crônica são do poema "O duplo".

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

POSSÍVEL

Hoje estou com vontade de gritar poesia
De não fazer mais nada
Só gritar
Cantar a estridência da vida
Quase ensurdecedora
Esta vidinha
Que eu não trocaria por nenhuma das eternidades.

À felicidade possível!

Antonio Fabiano
Direitos reservados

IPÊS-AMARELOS

Os ipês-roxos se foram
Com olhos secos
E almas tristes...

Vêm agora estes, amarelos,
Que nada devem a Van Gogh
E mais parecem sóis que se antecipam auroras
Em cada flor de flor de flor...

Eu suo de alegria!
É quase insuportável esta felicidade de ipês!...

Antonio Fabiano
Direitos reservados

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

MOACYR SCLIAR: NOSSO HUMANÍSSIMO IMORTAL...


Moacyr Scliar, gigante das palavras. Fotografia de seu Site Oficial. Divulgação autorizada pelo Autor.

Moacyr Jaime Scliar nasceu em Porto Alegre - RS, em 23 de março de 1937. Filho de José e Sara Scliar, imigrantes provenientes da Bessarábia, Rússia, viveu no Bom Fim, bairro que ainda hoje reúne a comunidade judaica. Esta condição marcará notavelmente a sua vida e obra. Nesta, os temas mais recorrentes são a realidade da classe média urbana brasileira, a medicina e o judaísmo.
No ano de 1943 começou seus estudos na Escola de Educação e Cultura, Colégio Iídiche, onde inclusive sua mãe lecionara. Em 48 transferiu-se para uma escola católica, Colégio Rosário. É aprovado no vestibular de Medicina pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul em 1955, vindo a formar-se em 62.
Casa-se em 1965, com Judith Vivien Olivien. Deste enlace matrimonial nascerá Roberto, em 79.
O primeiro livro que se publicou de Moacyr foi “Histórias de Médico em Formação” (1962). Eram contos inspirados em sua experiência de estudante. Em 1968 saiu “O Carnaval dos Animais”, também de contos. O autor considera, a rigor, este segundo livro a sua primeira obra. Daí em diante, não parou mais de escrever... Profusamente, diga-se.
Médico, especialista em Saúde Pública e Doutor em Ciências pela Escola Nacional de Saúde Pública, torna-se também membro da Academia Brasileira de Letras, a partir de 2003, onde ocupará a Cadeira n.º 31.
Deu aulas na Brown University (Department of Portuguese and Brazilian Studies) e na Universidade do Texas (Austin), nos Estados Unidos.
Moacyr Scliar é autor de uma das obras mais prolíficas da literatura brasileira, no tocante ao número de publicações e variedade de gênero: romance, conto, ensaio, crônica, ficção infanto-juvenil etc. É colunista de alguns jornais nacionais e colabora ainda com vários outros órgãos da imprensa do Brasil e do exterior. Scliar é conferencista aclamado, nacional e internacionalmente. Com frequência é convidado para participar de encontros literários em várias partes do mundo.
Seus livros já foram publicados em mais de vinte países, com notável repercussão crítica. Não por acaso é detentor de um invejável número de prêmios. Textos seus já foram adaptados com sucesso para o teatro, o cinema e a televisão.
Cada leitor de Moacyr Scliar pode inclinar-se mais para este ou aquele gênero de sua escolha, sem prejuízo, tal é a versatilidade do escritor e capacidade de dialogar com diferentes públicos em alto nível de qualidade. Todos, no entanto, hão de se encontrar em seu admirável estilo humanista. Aí se reflete uma gama de valores universais, a genialidade deste gigante do nosso tempo, o bom coração de um humaníssimo imortal...

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Moacyr Scliar tem sítio oficial na Web: www.moacyrscliar.com
ALGUNS DE SEUS LIVROS ALTAMENTE RECOMENDÁVEIS:
“Ciumento de Carteirinha”, “O Ataque do Comando P.Q.”, “O Tio que Flutuava”, “O Mistério da Casa Verde”, todos da Ática e todos dirigidos a público juvenil. “O Centauro no Jardim”, “A Majestade do Xingu”, “Manual da Paixão Solitária” (prêmio Jabuti), “Contos Reunidos” e “Eu vos abraço, Milhões” (o mais recente), todos da Companhia das Letras. “O Exército de um Homem Só”, L&PM.

Excelente sugestão de leitura e dica de presente para o ano todo. Afinal, dar ou ganhar bons livros é coisa das mais sublimes.
Faça-se feliz!

MOACYR SCLIAR – entrevistado por Antonio Fabiano


Moacyr Scliar, membro da Academia Brasileira de Letras. Fotografia de seu Site Oficial. Reprodução autorizada pelo Autor.


ANTONIO FABIANO: Moacyr, você é membro da Academia Brasileira de Letras e um dos nossos “imortais” mais conhecidos. Você é muito querido por um vasto público, e sua popularidade é notória, tanto no Brasil, como em outros países onde os seus livros são traduzidos e lidos com grande repercussão. Eu quero dizer que estamos diante de um “imortal” muito próximo dos “mortais”, o que é maravilhoso mas nem sempre comum nas Academias de qualquer lugar do mundo. Como você interpreta esta “imortalidade” que lhe foi conferida, e a que atribui tal capacidade de interação com o público, especialmente com o público jovem?

**MOACYR SCLIAR** Naturalmente sinto-me orgulhoso de fazer parte da ABL, instituição fundada por Machado de Assis, que reuniu muitos dos melhores escritores brasileiros e que tem um papel importante em nosso contexto cultural. Mas devo dizer que isso em nada interfere em meu trabalho literário. Distinções e honrarias são fugazes, a literatura e o leitor permanecem. Portanto, ao escrever penso no leitor, sobretudo no leitor jovem, e assim mobilizo o jovem leitor que um dia fui; quero proporcionar a quem me lê o mesmo prazer e a mesma emoção que o garoto Moacyr sentia ao ler.

ANTONIO FABIANO: Como escrever tanto, oitenta livros ou mais, em tão variados gêneros, sem comprometer a qualidade dessa literatura?

**MOACYR SCLIAR** Em primeiro lugar trata-se de trabalhar muito, e eu faço isso. Acredito que escritor é o cara que escreve e, portanto, sempre que posso estou escrevendo. Fui médico durante muito tempo e aprendi a organizar-me, usando todo o tempo livre para estudar ou escrever. Mas sou exigente com o que faço: escrevo e reescrevo constantemente, e não hesito em deletar o que me parece ruim, e faço isso com muita frequência.

ANTONIO FABIANO: De onde vem a fecundidade rara de sua escrita?

**MOACYR SCLIAR** Do prazer que me dá a arte de mexer com as palavras. Sempre fiz isso, e acabei, claro, desenvolvendo uma boa habilidade neste sentido. Por outro lado, ideias felizmente nunca me faltam; meu problema é, ao contrário, selecionar as melhores ideias entre as muitas que me ocorrem.

ANTONIO FABIANO: Você nos disse outro dia que, quando viaja, identifica-se nas fichas dos hotéis como “médico”. Declarar-se apenas “escritor” é um problema, porque alguns não entendem isso como profissão ou algo confiável... (risos) Fala sério? No âmbito social, ser escritor no Brasil ainda é algo difícil? O ofício de escrever pode ser de fato encarado como uma profissão séria?

**MOACYR SCLIAR** Em nosso país, o ofício de escritor nunca foi levado muito a sério, porque raros eram os escritores que podiam viver da literatura. Isto está mudando, mas é irrelevante; se se trata mesmo de uma profissão não importa muito, o que importa é a qualidade do que a gente escreve.

ANTONIO FABIANO: Já que falei... Como um bem sucedido médico de saúde pública se tornou escritor? Em que o fato de ser médico interferiu no de ser escritor? A experiência do primeiro ofício foi preponderante para a formação do homem de letras hoje maduro?

**MOACYR SCLIAR** Sempre gostei da medicina em geral e da saúde pública em particular. E aprendi muito nas duas áreas, sobre a condição humana e sobre a realidade brasileira. E este conhecimento ajuda muito no trabalho literário. A gente fala com conhecimento de causa, por assim dizer.

ANTONIO FABIANO: Quais outras influências você percebe em sua obra?

**MOACYR SCLIAR** Percebo as influências de escritores que, em diferentes fases de minha trajetória, fizeram minha cabeça: Monteiro Lobato, Érico Veríssimo, Clarice Lispector, Franz Kafka...

ANTONIO FABIANO: Ao ver uma obra sua adaptada para o cinema, teatro ou televisão (transição às vezes perigosa), o que sente? Onde termina a paternidade do autor e começa a autonomia da obra?

**MOACYR SCLIAR** Tenho vários textos adaptados, e aprendi uma coisa: aquilo que a gente vai ver no palco ou na tela é diferente daquilo que foi escrito. É inevitável, faz parte do processo, por isso, dou inteira liberdade a quem vai fazer a adaptação para trabalhar o texto como achar melhor. Posso ajudar, se for necessário, mas não vou “censurar” nada.

ANTONIO FABIANO: O que Moacyr Scliar sempre lê?

**MOACYR SCLIAR** De tudo. Livros, de ficção e não ficção, jornais, revistas, textos de Internet... Sou um leitor compulsivo e o que está em letra de forma sempre me atrai.

ANTONIO FABIANO: Do alto de suas conquistas, que síntese faria da vida pessoal e profissional?

**MOACYR SCLIAR** Eu diria que foi uma vida de esforços, uma vida gratificante, mas ainda não plenamente realizada: continuo estabelecendo objetivos a serem alcançados.

ANTONIO FABIANO: Pode dizer uma palavra para quem é mais jovem e pretende tornar-se escritor?

**MOACYR SCLIAR** Que leia muito, que escreva bastante, que busque ajuda, por exemplo em oficinas literárias, que divulgue nos meios que estiverem a seu alcance, incluindo a Internet, que concorra a todos os prêmios literários possíveis, e que, sobretudo, tenha confiança e tenha esperança.

ANTONIO FABIANO: E a seus fiéis leitores, o que diria?

**MOACYR SCLIAR** Muito obrigado. Vocês deram sentido à minha vida!

ANTONIO FABIANO: Moacyr Scliar é...

**MOACYR SCLIAR** ... um escritor que busca, com esforço e humildade, o caminho da boa literatura.


Moacyr Scliar – Antonio Fabiano
Novembro de 2010
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
E-mail: seridoano@gmail.com

CNE VERSUS MONTEIRO LOBATO? ERA SÓ O QUE FALTAVA!


Dona Benta e Tia Nastácia: personagens vividas pelas inesquecíveis atrizes Zilka Salaberry e Jacira Sampaio. Imagem disponível na Web.

A estupidez humana me entedia! Noticiou-se, em larga escala na semana passada, que o Conselho Nacional de Educação (CNE) viu marcas de racismo em um dos clássicos da nossa literatura. Com tal inferência, o mesmo Conselho emitiu parecer de veto à obra que é distribuída à rede pública através do Programa Nacional Biblioteca da Escola (PNBE). Trata-se do livro “Caçadas de Pedrinho”, publicado em 1933, cujo autor dispensa até menção de nome, tão conhecido que é da nossa gente, tanto quanto a sua obra. Todos sabem – até as minhas sobrinhas gêmeas de um ano – que a criação de Monteiro Lobato (1882-1948), em sua integralidade, é uma das melhores e mais bem sucedidas coisas que já aconteceu em nossa literatura. Aliás, para nosso orgulho, sua obra é porção mesma do patrimônio cultural brasileiro. Então, porque ainda há vida inteligente no planeta, a descabida recomendação de veto não foi aceita. O ministro da Educação, Fernando Haddad, rejeitou essa estapafúrdia. E também a Academia Brasileira de Letras (ABL) manifestou, oficialmente, o seu repúdio ao que foi considerado uma tentativa de censura ao livro. A ABL não concorda com a proibição do acesso ao livro, por parte das crianças: “cabe aos professores orientar os alunos no desenvolvimento de uma leitura crítica”.
Até minhas sobrinhas gêmeas de um ano sabem, com naturalidade, que tia Nastácia é negra, sim, e isso nunca foi problema para nenhuma criança ou jovem (de todas as cores e classes sociais) que leu e amou os livros de Monteiro Lobato. Tia Nastácia é uma das personagens mais queridas do Sítio do Picapau Amarelo, a própria bondade, mantenedora da subsistência humana do grupo e também uma das personagens mais puras e importantes da série. Ela encarna, como disseram os acadêmicos, a divindade criadora, dentro da obra. A ABL pensa: “Se há quem se refira a ela como ex-escrava e negra, é porque essa era a cor dela e essa era a realidade dos afrodescendentes no Brasil dessa época. Não é um insulto, é a triste constatação de uma vergonhosa realidade histórica”.
Não tivesse a ABL se manifestado, com outros tantos seres pensantes, que simultaneamente reagiram ao parecer dessa esdrúxula ideia do Conselho Nacional de Educação, poderíamos recorrer – pirlimpimpim! – ao sábio Burro Falante do Sítio do Picapau Amarelo! Quem sabe ele não poderia nos ajudar?
Depois de ver esse caso na imprensa, fiquei pensando: se estes que chegaram à incrível inferência de um racismo na obra infantojuvenil de Monteiro Lobato pudessem, com inteligência, usar essa extraordinária imaginação criativa para o bem, que magníficas obras não teríamos, dentro de pouco tempo, a enriquecer o patrimônio cultural brasileiro? Monteiro Lobato dizia que um país se faz com homens e livros. Nunca censurando livros...
Quando eu era criança li todos os livros de Monteiro Lobato. Não satisfeito, relia e resumia tudo num caderninho. Os livros eram da biblioteca pública, eu não podia tê-los porque eram raros e caros. Então, copiava-os a meu modo. É incrível, mas também possível que muitos brasileiros não tenham lido Lobato na infância. Caso isso tenha acontecido a você, não se aflija: leia para seus filhos e netos, leia até para crianças carentes e de rua. Eu já fiz isso. Mas, se você ocupar um alto posto na Educação, não tem jeito: leia antes de tudo para si mesmo. Pense! E, meio Ofélia, não abra a boca enquanto não tiver certeza do que vai dizer do alto de sua cátedra. É tão bom ler!... E pensar... Ainda é tempo, não tem idade para coisas boas como essas!...

Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 08 de novembro de 2010.
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quarta-feira, 3 de novembro de 2010

“MAGMA” de JOÃO GUIMARÃES ROSA: um livro de poesia!


Máquina datilográfica de Guimarães Rosa.
Em sua casa museu, Cordisburgo - MG.
Fotografia de Antonio Fabiano


Poemas – Definição
O cigarro de fumaça impalpável e brasa colorida,
que se fuma a si mesmo num cinzeiro,
será um poeta?...
(Guimarães Rosa – “Magma”)

JOÃO GUIMARÃES ROSA escreveu um livro intitulado “Magma”. Seria um livro de estréia, obra poética do escritor de prosa hoje louvado entre os maiores da literatura de nossa língua e universal. O livro recebeu, em 1936, um prêmio de poesia concedido pela Academia Brasileira de Letras (Concursos Literários de 1936). Isto seria bastante, a confirmar-lhe o valor e a autonomia nele existentes. Mas há quem diga que o seu subtítulo poderia ser este: começo e fim do poeta Guimarães Rosa. Este mineiro, como sabemos, não se consagrou por versos... No discurso de agradecimento pelo prêmio, o “poeta” mostrava-se já não muito afinado com o trabalho: “O Magma, aqui dentro, reagiu, tomou vida própria, individualizou-se, libertou-se do meu desamor e se fez criatura autônoma, com quem talvez eu já não esteja muito de acordo, mas a quem a vossa consagração [referindo-se aos imortais da ABL] me força a respeitar” (Revista da Academia Brasileira de Letras, Anais de 1937, ano 29, vol. 53, p. 261 a 263). Curiosamente, o livro permaneceu inédito, tornou-se uma espécie de lenda. Veio a ser publicado somente na década de noventa (portanto, postumamente), mais de meio século depois daquela alvorada! Não faltou quem temesse que algo assim “mediano” desestabilizasse a monumental reputação do escritor. Ora, “Magma” não é tão pequeno ou médio como temiam, estão – isto, sim! – outros livros do autor para além de grandes! Aquele não foi o único livro de sua autoria que o nosso Rosa, mineiro desconfiado, desejou não publicar... Felizmente desobedeceram-lhe, pelo que muito agradecemos. “Magma” está aí, luminoso, em seu lugar modestíssimo, se o compararmos com um grande “Grande sertão: veredas” e outros tantos livros deste imortal monstro sagrado. Mas quem disse que tudo deve ser igual?

Poemas – Riqueza
Veio ao meu quarto um besouro
de asas verdes e ouro,
e fez do meu quarto uma joalharia...

Reportagem
O trem estacou, na manhã fria,
num lugar deserto, sem casa de estação:
a parada do Leprosário...

Um homem saltou, sem despedidas,
deixou o baú à beira da linha,
e foi andando. Ninguém lhe acenou...

Todos os passageiros olharam ao redor,
com medo de que o homem que saltara
tivesse viajado ao lado deles...

Gravado no dorso do bauzinho humilde,
não havia nome ou etiqueta de hotel:
só uma estampa de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro...

O trem se pôs logo em marcha apressada,
e no apito rouco da locomotiva
gritava o impudor de uma nota de alívio...

Eu quis chamar o homem, para lhe dar um sorriso,
mas ele ia já longe, sem se voltar nunca,
como quem não tem frente, como quem só tem costas...

Magma / João Guimarães Rosa. – Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1997.

Interessados podem adquirir o livro “MAGMA” pela EDITORA NOVA FRONTEIRA.

Para Iris Gomes da Costa, com carinho.

terça-feira, 2 de novembro de 2010

OS DESAPARECIDOS

Na cidade proliferam-se
Cartazes de aflição:
Procura-se...
Procura-se...
Procura-se...

São mais que rostos subtraídos
De mães pais irmãos.

Perplexidade mistura-se à indagação:

Para onde vão estas
pes-
-soas
que desaparecem?

Antonio Fabiano
Direitos reservados

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

UM GRÃO DE ARROZ

Um grão de arroz sobre a mesa. E o meu olhar sobre ele. Então, perplexidade ao me dar conta que esta coisinha parou com a mão o meu dia, minha vida talvez. E era como se me afrontasse em sua relativa pequenez, porque de seu tamanho já não ousava emitir juízos de humildade. Era grão, banquete pascal de um núcleo familiar qualquer de formigas, se isto houvesse assim como não há. Ali a pequena massa a me lembrar impotência e fome de miseráveis, aqui, na África e em guerras, no mundo todo onde há gente e se sonha com algo mais que pão, até na dor dos ricos que padecem desse mal e não sabem... Mas também a beleza forjada, enigmas de sedução, potência seminal. Afinal, este grão de arroz não poderia ter sido pó a enfeitar as faces das amigas de minha avó? E eu subitamente me torno um chinês, a sonhar cozido arroz em cena de um filme em preto e branco e palitos de pegar. Há, há... A voz popular brasileira a cantar o que eu já sei: “o amor da gente é como um grão”... Clarão, de mandarim a esta canção. E, o que era só um grão de arroz me humilhou, das baixezas de sua insignificância em face do universo. Eu outra vez pequeno, não gigante, a olhar o que sozinho é quase nada. Eu quase nada, só o universo em expansão... Não, tudo ficaria pequeno, sob o signo deste grão de mostarda transviado! Desafiador era o seu olhar sobre mim, a devorar-me. Política metafísica! Em instantes a minha cabeça, como a de João, numa bandeja de prata. Julgou-me e sentenciou-me este grão de arroz. Mas, então, aconteceu o milagre: nele o Reino, o banquete, festim, a pomba voadora, Deus sorrindo, a colheita, feixes de alegria, baldes de esperança, aviões de Santos Dumont, um punhado de estrelas, tudo, até os meus mortos ressurretos... Aleluia! No grão de arroz existiu meu arrozal!

Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 1.º de novembro de 2010.
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
E-mail: seridoano@gmail.com