SOBREVIDA
Matéria ardente que o fogo
arrebata para si
assim a mariposa.
Venho clamar por clemência:
por que deve fenecer
quem se acumula de luz?
Canto
(portanto)
às escuras.
Maria Lúcia Dal Farra
SOBREVIDA
Matéria ardente que o fogo
arrebata para si
assim a mariposa.
Venho clamar por clemência:
por que deve fenecer
quem se acumula de luz?
Canto
(portanto)
às escuras.
Maria Lúcia Dal Farra
e jogava ao pião com Deus
enquanto minha mãe estendia roupa
e o meu pai mendigava pão
e minha alegria nesse tempo
era muito próxima da dos meninos
e de Deus que ganhava sempre
e não sei quem perdi primeiro:
o pião ou Deus
apenas sei que Deus continua
a jogar com outros meninos
e que no Outono quando saio à praça
nos sentamos e falamos muito
do suave rodopiar das folhas
Daniel Faria
Oxálida, 1992
Observei-te sabendo já que eras um homem – a cabeça
De
pelicano dobrado
O bico
que te rasgava para fora
Adoeci
como lâmpada que se funde
A coroa
de espinhos sobre mim – a lembrança
Dobrei-me
nas tuas asas
Nas
chagas ainda quentes
No voo
como gota de sangue no peito
Que vive.
No coração
Que
partes e distribuis com as mãos
*
Todas as
minhas fontes vêm de ti
As
nascentes
E amo-te
com a constância do moribundo que respira
Já sem
saber de que lado o visita a morte
Procuro a ligação entre ti e a luz muito
[miudinha depois dos temporais
Entre a
luz e os estilhaços nas ruas bombardeadas
Desconheço
o colar onde unes tudo
Procuro
entender como é que moldas
Os meus
pés ao equilíbrio que os desloca no chão
Sei que
és tu que me levantas
Que
remendas o meu corpo cada dia
Em ti
encontro a pulsação
Que
rebenta – uma artéria como nunca
Tinha
jorrado. Cratera onde durmo
Recluso,
árvore à chuva
Em
dificuldade extrema
De
respiração
Ponho a cabeça entre os ramos, lanço
[os braços para fora
Como um
pássaro entre um bando
De
disparos
Tu moves
as agulhas, tu unes de novo
As minhas
asas à curva do céu
*
E desço à
verdura das tuas mãos
Como as
manadas que buscam as minas
Faltam-me
apenas os pés feridos dos que
[peregrinam
Faltam-me
no chão duro das promessas
Os
joelhos
Queria
tanto andar em redor, rodear-te,
[se soubesses como
Queria
amar-te tanto
O que sei
da unidade é a túnica
Tirada à
sorte. O que sei da morte e da vida
É o livro
escrito por dentro e por fora
Silêncio
escrito por dentro
Palavra
escrita a toda a volta da história
O que sei
do céu
É a mão
com que sossegas os ventos
Desço à
escritura como os veados aos salmos
FARIA, Daniel – POESIA – Edição Vera Vouga. Publicado em Portugal
por Assírio & Alvim. Porto
Editora, Ltda. 1ª edição: maio de 2012.
Há muitos metros entre um animal que voa
E a escada que desço para me sentar no chão
Mas basta-me um quadrado de sossego
Para a distância absoluta
Está para além do que se vê a janela
[onde me
debruço definitivo
Não é uma aparição
Nem se pode alcançar sem se ir em frente caindo
Só no fim da paisagem estou de pé
[como um
para-quedista que desce
Suspenso como os santos num arroubo místico
Erguido como um anjo em suas asas
E sinto-me ser alto como um astro. Nuvem
Como se fosse um homem
Que levita
POESIA de Daniel Faria. Edição
Vera Vouga. Publicado em Portugal por Assírio & Alvim. Porto Editora, Ltda. 1ª
edição: maio de 2012.
Sonhei que ‘stava morto... Ai que tristeza!
E tu me vinhas ver, em grande pranto...
Diziam-me, teus lábios, triste canto,
Enquanto eu – só – jazia na frieza.
Estranho luto, aquele, em teu burel!
No pobre esquife, a pálida aspereza
Da vida extinta, lânguida certeza
A esvaecer-se em face d’outro véu.
Amor... tu me choravas tanto e tanto,
Que os deuses, comovidos, de repente
Realizavam cândida proeza:
Ressuscitar ditoso... No entanto,
Fora melhor ‘star morto, brutalmente!
Pois não ‘stavas aqui... Ai que tristeza!
DONA MORTE
Dona Morte
a Senhora está aprontando
demais
na minha porta
– sem falar no estrago
intempestivo o mês passado
devastando minha horta.
Como reverter tamanha
intromissão?
Sei que tem lá seus
misteres
sei que é tarde, já
escurece.
Espere um pouco, Dona
Morte
eu queria apenas
jogar só mais um pouco
com os três amigos que me
restam.
Affonso Romano de Sant’Anna
Sísifo desce a montanha, Rio de Janeiro: Rocco, 2011.
nesta escura floresta de
sentidos
é o sem sentido brilho
de uma tela...
Os meus dedos magros
mastigam teclas
pisam mundos
como quem pisasse nos
astros distraída
se musa fosse ou Deus.
Antonio Fabiano
Se anda na chuva
quem se importa?
Já beijou na chuva
um beijo roubado –
a coisa mais pura!
A rua é um rio
de lama
que leva para o açude
lá onde o sol se põe
qual ovo
de galinha.
Antonio Fabiano
O pôr do sol da capital mineira
é macio e escoa
como café passado no pano
bem à moda antiga.
Tem uma coisa que tem!
Nada de braçada este sol
sobre o triângulo
como se derramasse sem pena
tinta vermelha para todos os lados.
Perguntem mineiros do norte!
Respondam mineiros do sul!
Eu que agora sou do vale
expatriado desde a eternidade
de todas as capitais:
não pergunto nada
não respondo nada.
Olho o pôr do sol
com o coração das gerais.
Esta tarde é tão bonita
que eu queria guardá-la numa caixinha
para não esquecer nunca mais...
Súbito o barulho dos carros desaparece
os prédios encolhem
as palmeiras crescem
uma carroça atravessa a travessa
entra e desfila na praça
grassa e atropela um menino
que se levanta sorrindo
mais lindo do que quando caiu.
São milagres de Minas
e no horizonte vermelha ainda
o pôr do sol da capital.
Antonio Fabiano
pixabay
A vida é escura e esquiva.
Um enxame de abelhas corta
meu pensamento
abre aos ponta pés a porta.
Meu coração está guardado
bateu
se gastou e escondeu.
A vida é fria.
Geleira de tão dura
se parte.
Eu digo palavras puras
como nas madrugadas
em que na rua alguém diz:
a vida é um penhasco
eu pulo.
Antonio Fabiano
Amo de amor sem cura
plátanos
vem a tarde sobre eles
de outono
folhas ficam de outra cor
além paleta
passeios se vestem
desse encanto
letras arcanas
mãos moucas de vento
no inverno
esqueletos nus ao infinito
amo
amo.
Antonio
Fabiano
Os meus amigos que têm mais de 30 anos,
têm menos de trinta
dinheiros.
Os que têm menos de 30
anos
não chegam a ter três
dinheiros.
Eles enfrentam a poluição,
a dor,
a fome e a esperança.
Navegam em ônibus, os
braços
erguidos, apoiados em
argolas
– pássaros que ensaiam o
voo
que os levará à rotina
onde manipulam
máquina, enchem papéis com
letras e carimbos.
Meus amigos sabem que a
vida não é fácil
embora se enjaulem em
salas calafetadas
onde o ar se condensa.
Eles enfrentam todos os
dias
o gigante do progresso
para que
as suas famílias se
alimentem,
se vistam, sorriam e falem
em civismo.
Mas meus amigos são
livres.
Não lhes prendem o ouro e
a cobiça de todos os poderes.
Eles são ricos em seus
mundos subjetivos.
E eu me visto de silêncio
para escutá-los.
São os momentos mais puros
de poesia
quando as suas verdades
explodem como rosas
ou estrelas no céu.
Daqui saúdo os meus amigos
que não tendo trinta
dinheiros
jamais me venderiam como
se fossem Judas.
E mais aos que, tendo três
dinheiros,
seus talentos sendo pobres
de espírito,
alcançarão o reino dos céus.
Ave, Myriam (1984)
CANTO DE ESPERA PARA O PRIMOGÊNITO
Artífice, a mãe se completa moldando o filho de sua argila
– em seu invento ela se multiplica, ousada, para outro espaço.
A suavidade de seu ventre improvisa ninho de rouxinóis
de inesperados trinos e notas musicais
para o filho – pássaro cego – navegar nos corredores de sangue.
Com impossíveis cristais inventa canções e embalos
e torna alegre o pesado silêncio de suas entranhas.
Onde a semente germina e a seiva cresce, lentamente com a voz
– um lírio, talvez, uma espiga de dourado trigo, desabrochará.
CANTO DE ESPERA PARA O SEGUNDO FILHO
O filho cresce de antiga semente
e se agita em meu ser com libações de pássaro.
A argila que o inventa torna-o semelhante e lúcido dentro do tempo
que o completa e o reclama, integral e ousado.
O Sangue, o Gesto, a Palavra, a Humana Contingência
e essa argamassa de Poesia – minha herança –
espreitam de seus mistérios e se integram à ousada forma.
Bem-aventurada em meu afã de criar
eu me engrandeço de humildade de não merecer a Dádiva
e glorifico e exulto o Homem que há de vir.
__________________
COELI, Myriam. “Branco & Nanquim: Obra Poética”, org.: Cristiana Coeli Goldie & Elí de Araujo. Natal: Sol Negro Edições, 2018.
O coração do mundo é um muro enorme
a palavra bate
e
se
e s f a c e l a
– coroa-de-monge
ao vento –
inútil inútil
passageira...
quebra-se no rochedo
a água
imóveis
quebram
-se
falésias
heras imaginárias
direito
onde?
último raio
última flor
último pássaro
pausas
humanitárias
não vêm
diplomacia
falha
brilho
brilho no céu
brilho
brilho
não de estrelas
brilho
cavalo de vento
brilho
mísseis a embalar
o sono de crianças
palestinas.
Antonio
Fabiano
pedro
pula
o poço
aperta
o passo
para
pensa
passa
paulo
pede
pão
à porta
do padeiro
pão
peixe
perdão
um potro
pasta
Do livro Rosa
de Pedra (1953):
SONETO
PARA O MOMENTÂNEO REENCONTRO DA PERDIDA INFÂNCIA
Não.
Esse não, porque esse quadro encerra
os
seus limites infantis de outrora
quando
plantava as mãos de medo e terra
nos
flocos de algodão sujos de aurora.
Não
esse quadro antigo em que se aferra,
surda,
uma dor que uma antes criança chora
perdida
no caminho que a desterra
e
no pranto que então seus anos mora.
Esse
não: que ainda busca o procurado
abismo
de onde os traços seus, feridos,
surpreendam
voz pedindo claros sons.
Não
essa inútil forma em céu crestado
descolorindo
os ecos ressurgidos
nos
dedos que inventaram lírio e tons.
(p.
219)
SONETO
TRISTE PARA MINHA INFÂNCIA
De
silêncios me fiz, e de agonia
vi,
crescente, meu rosto saturado.
Tudo
de mágoa e dor, tudo jazia
nos
meus braços de infante degredado.
Culpa
não tinha a voz que em mim nascia
pedindo
esses desejos – sonho ousado
por
onde o meu olhar navegaria
de
cores e de anseios penetrado.
Buscava
uma beleza antecipada
–
a condição mais pura de harmonia
nessa
infância de medos tatuada,
querendo-me
embeber de inacabada
procura
que, em meu ser, superaria
a
minha triste infância renegada.
(p.
224)
CANÇÃO
DA MINHA RUA
Rua
triste
rua
feia
rua
velha
sem
calçadas
rua
fria
tão
distante...
Sim,
és triste
feia
e velha
és
distante
mas
não importa.
Mesmo
assim
és
minha rua
onde
vivo os meus sonhares
onde
sofro os meus pesares
onde
sinto os meus amores.
Para
mim
tu
tens belezas
que
não há
nas
outras ruas.
Se
alguém
te
tem desprezo
deixa
que
eu te quero bem.
Eu
conheço a tua história
tu
me contas teus sonhares
tu
me contas teus pesares
tu
me dizes
bem
baixinho
teus
segredos
teus
amores.
(p.
236-237)
Do livro Salinas
(1958):
POEMA
DE VIAGEM
Na
estrada cinzenta e desigual
o
automóvel se abisma.
Onde,
o sono da mulher
carregando
uma criança nos olhos?
A
fala da criança
ficou
dependurada lá fora
no
tempo
a
vestiu as árvores magras,
as
árvores nuas,
os
cactos tristes dos caminhos.
De
tudo,
durou
apenas
na
memória
a
última estrela
do
ante-amanhecer.
(p.
155)
CANTO
INÚTIL
Na
penumbra do quarto me distingo
frase
morta, que as grandes mãos do tempo destruíram
sem
ecos,
sem
remorsos,
sem
furor.
Somente
nesse nada se restringe
a
condição recôndita do medo
que
na memória dorme.
Se
em mim fonte já não chora
retesam-se
meus olhos.
Em
palavra existi:
agora,
em
sombras permaneço decomposta.
Frias
letras indicam-me
sem
nome,
explicam-me
sem
vida,
sem
lugar.
Fendeu-se-me
o caminho.
Meu
nome,
há
muito não se faz chamar.
(p.
161)
Do livro O
Arado
(1959):
ANTECOLHEITA
Ah
te saber distante, embora a chuva
amareleça
em frutos e a colheita
não
tarde. Já meus dedos se presentam
como
instrumento* à terra matinal.
Ausentes
os teus braços, a charrua
nega-se
à lida, caminhança e bois;
o
cata-vento remudece as hastes
que
calentavam cedo anoitecer.
Não
sei que faça dos celeiros. Vem:
setembro
amadurece nos folhados
deixando-se
nascentes para o estio.
Vem
que me espanta o apascentar das ramas
e
minhas mãos, de frágeis, agonizam
nessa
visão de lavras, de eira e sol.
(p.
136)
* A edição “Navegos/A
Herança” (2003) traz essa palavra no plural (aqui omitido), diferentemente da edição
“Navegos” de 1978, organizada pela própria Zila. Infelizmente não pude cotejar
com a edição original de “O Arado”, 1959. O plural pareceu-me pretensa correção
ou lapso da nova edição, pois além de mudar o sentido do poema, muda também sua
cadência, destruindo a possibilidade de elisão, quebrando – num amadorismo de
escansão que Zila dificilmente incorreria – a metrificação, antes gramatical e
poeticamente perfeita, do verso. (Opinião do autor deste Blog)
UM
PÁSSARO ME HÁS DE DAR
Em
manhã de pastoreio
ovelhas
apriscando
largarás
de tuas cismas
e
cajado
que
um pássaro me hás de dar
quando
me amares.
Leve
levemente mo trarás
das
fontes dos teus olhos
sem
nenhum pensamento
sem
gesto liberto
a
mansidão do teu silêncio
apenas.
À
minha face matutina
descerá
uma carícia
de
pássaro
pousado.
(p.
148)
Do livro Exercício
da Palavra (1975):
A
PONTE
Salto
esculpido
sobre
o vão
do
espaço
em
chão
de
pedra e de aço
onde
não
permaneço
– p a s s o.
(p.
69)
AEROPORTO
Do
pássaro invoado
–
o antipássaro –
vibram
sons de turbinas de emoção e sangue
Onde
o pouso-cantar do pensamento?
Onde
as artérias – medo em combustão?
Desce
o pássaro
toca
o chão
toma
posse da pista asfaltoamor
Há
o impacto da espera
permanência
na esfera
nos
espaços
nos
ritmos de aço
de
astronave novopartindo
chegando
pairando
sem
aportar
alterar
alunizar
Propulsão
que te
(nos)
perde
em
plataformas
do nada.
(p.
97)
Do livro Corpo
a Corpo (1978):
PROCISSÃO
Quando
vem a procissão
no
seu passo de perdão,
Alcaide,
comendador
dominam
o povo e andor
Cada
grupo de irmandade
empunhando
uma verdade:
A
das Filhas-de-Maria
virgindade
em romaria
Do
SS. Sacramento
vermelha
de emproamento
Do
Senhor Jesus dos Passos
roxo
em santos e devassos
Irmãs
da Ordem Terceira
terço
em mãos de camareiras
Os
meninos da Cruzada
fome
na barriga inchada
A
Banda da Prefeitura
solo
e soldo de amargura
Estandartes,
confrarias
escondem
velhacarias
O
Santo vai carregado
pelos
donos do mercado
E
o povo segue inocente
descalço,
nu, paciente:
–
A compacta multidão
carente
de Deus e pão.
(p.
51-52)
CAIEIRAS
Memórias
há (vão e vêm)
das
queimadas de caieiras:
a
vida deslembra a gente
da
vida que não se tem.
Fumaça
assobe na frente
labareda
vem depois.
Tijolo
e telha cobrindo
a
querência de nós dois.
Viola
bem assentada
no
florir dos cajueiros,
alpercatas
batucando
o
chão do chão do barreiro,
as
mulatas ressurgindo
com
seus dengues noveneiros,
as
comadres se benzendo
frente
ao santo milagreiro.
Aluás
somem dos potes,
fogem
em risos de tropeiros,
nas
prendas dos namorados,
no
aboio dos vaqueiros,
na
presença do Senhor
da
Casa-Grande – o festeiro,
no
fogaral projetando
seu
calor pelo terreiro.
Caieiras
milavoengas,
tijolos:
encantação
de
caminhos não batidos,
de
telha embicada vã,
dos
pedregais dos açudes
(sem
água), de solidão:
o
tempo resumiu tudo
em
vida-palavra-chã.
(p.
57-58)
Do livro A
Herança (1984):
CHICO
DOIDO
a José Bezerra
Gomes, em memória
Chico
Doido, doido e Chico
cavaleiro
de Roldão,
de
dia catando esmolas;
de
noite: fiel seguidor
da
fantástica milícia
do
“Padim Frei Damião”.
As
baladeiras nos bolsos
do
dólmã sem forma e cor.
A
espingarda (brinquedo),
no
velho saco-de-estopa.
No
roto chapéu-de-massa,
casa
e abrigo. Na canção
tirada
no realejo
de
sopro, fabulação
de
arcanjo. Da rustiquez
do
capote inseparável,
o
reaquecer nas sessões,
nos
catarros, nas insônias.
No
cinturão de soldado
ajaezado
nos quadris,
imaginário
punhal.
Na
curva da orelha, as pontas:
piúbas
secas, entrepalhas,
cuspe
de fumo em chão, no ar.
No
fiapo da fita fosca
do
deslavado chapéu,
marca
de outra devoção:
Relíquia
milmuito amada
na
fome, na dor, na fé
–
“meu Padim Ciço Romão”.
Sem
tantos dentes sãos: sujos;
unhas
de luto tão garras,
punhos
de tão frágeis; ferro.
Toda
a alma era um passarinho
sorrindo
no inconsciente
do
insano Chico, do Doido
cavaleiro
de Roldão
na
luta por um cruzado
para
lamparina e gás.
p.
276-277
_____________
MAMEDE,
Zila. NAVEGOS / A HERANÇA. EDUFRN –
Editora da UFRN. Natal (RN), 2003.
Veja também:
https://antoniofabiano.blogspot.com/2014/10/selecao-de-poemas-de-zila-mamede.html