terça-feira, 7 de novembro de 2017

Jornal SulBrasil - Fronte Cultural por SILVÉRIO DA COSTA

Jornal SulBrasil
Chapecó, Quinta-feira, 20 de Julho de 2017
Ano 23 Edição 6.926

Fronte Cultural
...E HAJA PÉS!...
Por Silvério da Costa

“Nas Pontas dos Pés” é o título do livro que acabo de ler. O seu autor chama-se Antonio Fabiano, um poeta natural da Paraíba, que mexe com o imaginário dos leitores, fazendo-os pensar e enchendo de orgulho a sua geração.
“Nas Pontas dos Pés” é uma obra que permeia o lado existencial da vida e suas contrariedades, exaltando a natureza, a solidão, a saudade, as discrepâncias sociais e até a morte, como símbolos poéticos, através de palavras que se identificam com a linguagem existencial, revestida por um viés típico da contemporaneidade, ancorada num conceito todo seu de poetar, com um ritmo empolgante, fincando na musicalidade das palavras e revestida de visionária efervescência poética, inerente ao seu processo criativo com versos e poemas de dimensões espaciais diferentes e efeitos estéticos que deslumbram!
O autor chega, até, a retroagir no tempo, trazendo para o presente imagens do seu passado, preservando uma linguagem poética densa, às vezes, até, enigmática, mas concebida, sempre, de acordo com os preceitos poéticos que norteiam a arte de poetar, usando, inclusive, a metalinguagem para falar do próprio poema. Está, pois, de parabéns o autor! Mas... melhor que falar dele é ler seus poemas! Vejam...


TRANSGRESSÕES

Papai queria que eu fosse Doutor.
Me fiz poeta...
Foi tão constrangedor!
Mas disfarçaram.

Depois pediram um neto.
Eu disse: Padre.
Mamãe levou três dias só chorando
E quase um ano pra se recompor.

A minha vida foi a um só tempo
Pequena e grande
Em suas transgressões...

O que direi nesta altura
Aos que pedirem conta da minh’alma?


APÓCRIFOS

A letra mata
Mas também dá vida.
Sei o que quer dizer
Fora do cânon
Em meu mundo e livro apócrifos:
A palavra se fez carne...

Escrever dói.
Contudo, quero!
  

ESTRIDÊNCIA

Há dias de sagrado ócio
Em que a vontade é de
Não fazer mais nada

Só beber a estridência de estar aqui
Como quem bebe o canto
De cigarras e grilos

Brindar sua canção
Às vezes tão incômoda
Como a vida

Esta vidinha
Que não trocamos por nenhuma
Das eternidades.
  

O CORPO

O corpo nasce
E se expande
Em sua natureza física
E psíquica.
Pelas ruas de suas veias
Trafegam carros de sangue.
Nos pés põe meias.
O corpo ama
E brinca de se esconder.
Veste-se de beleza
E despe-se
Com igual destreza.
Finge que é eterno
– e talvez seja.
Deitado
Dorme e sonha
O que deseja. 


A VIDA

A vida
Com sua alegria
Despudorada
Calca
Aos pés
O engenho
De nossos
Comedimentos.
Apurada
Passa
Entre grave e risível.

Ninguém a detém.


DE REPENTE O POEMA

De repente o poema me laça
Me maltrata
Dá na minha cara
Dita as regras
Não se entrega
Me consome
Mostra o dedo
E some...
Rouba o meu sono
Desdenha a técnica
Cospe na língua
Da minha língua
Depois fica mudo
Aí fala fala
Grita geme
E para.
Vem quando quer
Diz que é mulher
Mostra seu sexo
Depois vira homem
Coça-se
Azara
Mija no poeta
E – ops! –
Foi-se embora...