sábado, 27 de dezembro de 2014

ALGUNS POEMAS

LIRA E TOADA

Nestes lençóis de águas minerais
Jaz toda a sede em fúria do universo.
No mais profundo azul dorme o reverso
Espelho das auroras boreais.

Nenhuma vaga estampa essa toada
Feita da falsa imagem de batéis.
A pedra escura e funda ao revés
É um olho grande em rota malsinada.

Em soluço de choro extenuado
Um avesso de terra – um descampado
Morre a tecer rendilhas nos lençóis.

Ali não brilha luz nem o inverso
Jaz toda a sede em fúria e nela ingresso
Com lira luminar de três mil sóis.

  
CANCIONEIRO

Vem a noite serena sobre a terra
Em branca nostalgia – negro vão...
O homem sertanejo que espera
As chuvas de inverno abre a mão

E harpeja na viola da esfera
A música sagrada do seu pão
Com ritmo de água que na serra
Compõe cancioneiro – coração.

À noite quando chora o sertanejo
Na tábua de silêncio do seu chão
Brotar faz esperança do desejo...

E reza pela chuva que bem tarda
Mas que um dia chega – salvação!
E dorme na espera sempre larga...

  
NOITES SERTANEJAS

Lá pelos tabuleiros à noitinha
Tudo é escuridão. Só lampião
Faz-se acender na treva do Sertão
Onde alumia fogo sem bainha.

Bem longe cantam céleres os grilos
Num cri... cri... cri... intenso e martelado...
Cantam no lago os sapos do outro lado...
Eis a noturna orquestra em estribilhos!

Quando o véu negro a paisagem cerra
Inusitadas vidas ganham asas
Por todas as paragens d’além casas...

São os filhos das noites sertanejas
Que saem para as brisas benfazejas
Da luz que escuridão nenhuma aterra.

  
PILÃO

Os campos férteis, largos de fartura,
Ostentam as bandeiras verdes. São
Os milharais prolíficos. Fatura
Do homem campesino. Acordeão

Demarca o fim da ira e seu sobejo...
A terra dá à luz – ressurreição –
A vida que ocultava em seu desejo.
Milagra todo o pasto!... Grão a grão

Espigas vão encher nossos celeiros,
Trazidas pelos braços dos ceifeiros,
Moídas pela máquina – pilão.

As vozes da colheita nos roçados
Alvissareiras cantam entoados...
Na mesa posta reina o grande pão.

  
ÁGUAS DO POTENGI

Nas águas cálidas
Do Potengi
Vai rosa flor
Boiando...
O rio desce serras
Cruza montes
Molha pedras
Abre chãos...
O rio nasce e cresce
Corre e brilha
Faz mil curvas
No que trilha
Mas não para
Nunca para
Para não...
Pescam no rio
Amam no rio
Nadam no rio
Morrem no rio...
E ninguém ousa
Apoderar-se
Do mistério
Deste rio
Atravessar
Querer tocar
A um só tempo
As suas margens
E outra margem
A pedra nua
O afogado
Seu bailar...
O rio é grande
E prateado
Leva e traz
Barcos pequenos
O meu sonho
A minha dor
Vai sussurrando
Em seu silêncio
Aquele amor...
Vai rosa flor...
Minha canção...
Cerro Corá
(meu coração)
Até Natal.

  
ACAUÃ

Acauã
Não é apenas uma lembrança
Perdida em meu passado
Antigo.
Doce rio sereno
Mais que um nome
A banhar Acari.
Margem viu passar
Em sua bainha
De rio – areia –
Meus avoengos.
Sonho novo
De águas mansas
E um espelho
De saudades...
São correntes
Que mais prendem
Quando soltam e
Prendem mais.
Acauã
Meu triste canto
De afogado
Em teus encantos...
As estrelas
Refletidas
Nas tuas águas
A boiar...
E boiadas a passar
Cavalo cavalaria
Água morna a tremular...
Minha quinta avó
Cismada,
Sim, matrona sertaneja,
Espada em punho a brilhar...
Acauã
Rio de agora
Que me vê
Peito apertado
Terras minhas
De águas minhas
O meu rosto esfacelado
No teu rosto
A flamular...

  
VIII
ERRÂNCIA

Toda essa tarde
Em bandos passam...
Visão de amores
Ânsia e chegar...

Damas saudades
Almas errantes
A nostalgia
De algum lugar...

  
X
TEOREMA

Trazes no bico
Ave pequena
Uma esperança:
Nunca chegar...

Trazes no bico
Um canto triste
Um canto surdo
Voo e calar...

Trazes no bico
Flor flutuante
Um teorema...
Será amar?

  
CIGARRO DE PALHA

Do alpendre da sua casa
À boca da noite
O homem acendeu
Seu cigarro de palha
Acendeu
A luz da lua
Sobre os cajueiros
Da Serra de Santana
Acendeu
Os lampiões a querosene
Nas casinhas dos grotões
Vaga-lumes
Os postes
Da cidade
As luzes
– elétricas –
Da rua
Próxima e distante
O planeta azul
A Via Láctea
Estrelas
Todos os corpos celestes
Luminosos
Do universo
Inclusive
O da sua mulher
Que não estava tão longe.

  
FOTOGRAFADO

Madrugada de feira em Currais Novos
Alguém de entre as vozes perguntou:
– Ô seo Galvão, tem cauvão?
Ao que se respondeu
Em disparada simplíssima e natural:
– Cauvão tem não, seo João!

O dia acampou na banca
Veloz como um clique e flash
Feito tisna e encantamento.

  
CARACOL

Sou filho do sol
E sei d’onde vim
Nas águas do mar
Dispus-me a amar

Dispus-me a amar
Em salto acrobata
Reinei para o ar
Ditoso a cantar

Ditoso a cantar
Barquinho perdido
Na terra da flama
Do fogo que assoma

Do fogo que assoma
Mistério sem fim
Amor caracol
Sou filho do sol.

  
DIA ENSOLARADO

Como um imbu maduro
O sol caiu do céu
Bateu no lombo de um dromedário
Rolou a duna
Quicou na água da praia
Iluminou toda a cidade
De Natal.

  
CANCIONEIRO DE VELHAS CANÇÕES

Cancioneiro de velhas canções
Antigo baile obscuro
De evocação...
Vozes já mortas
Valsas não dançadas
Coisas herdadas
Às deslembranças
Do coração.

FABIANO, Antonio. "Cancioneiro da Terra". Mossoró-RN: Sarau das Letras, 2014.

quarta-feira, 24 de dezembro de 2014

INDO AO BAÚ BUSCAR ALGUMA COISA...

Antonio Fabiano (arquivo pessoal)

Susana, amiga há mais de vinte anos e artista portuguesa, fez-me hoje esta surpresa: com votos de boas festas enviou de Portugal, por e-mail, essa fotografia dos nossos tempos de International Pen Friends. O cara feliz da foto sou eu em julho de 2001. A felicidade continua, mas de lá para cá alguma coisa mudou no visual, obviamente! rs rs 
Feliz Natal! Grato por tudo!

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

PREFÁCIO de CANCIONEIRO DA TERRA por Wilson Azevedo

 PREFÁCIO

Por qué los árboles esconden
el esplendor de sus raíces?
Pablo Neruda
                                                                                                                       


Cancioneiro da terra é o terceiro livro de poesia que Antonio Fabiano traz a lume, depois de Sazonadas e de Girassóis noturnos, publicados no Rio de Janeiro, em 2012, pela editora Taba Cultural. E seriam muito mais, não fosse o próprio autor seu crítico mais impiedoso, rasgando e lançando à fogueira centenas de poemas que só poderiam ser de fato avaliados por uma visão exterior. [1]
Esse Cancioneiro escapou às chamas, para o enlevo daqueles que apreciam poesia e, especialmente, de quem conhece seu autor. E, certamente, o poeta o salvou por ser este um inventário de seus mais caros afetos: o canto telúrico à terra da qual teve de se ausentar.
Dividido em sete segmentos (da língua dos anjos até as línguas avoengas), Cancioneiro da terra revela um poeta em pleno domínio do verso, pois o primeiro desses segmentos é composto por quatorze sonetos metrificados em decassílabos. E a primeira impressão que se tem desse processo metrificador é que o poeta quer provar o domínio de uma técnica de versificação, qual aqueles modernistas que, depois de cometer “desvarios” como os conhecidos “Sapos” de Bandeira, voltaram a escrever poemas rimados e comportadamente metrificados; sonetos, inclusive.
Mas essa impressão se desfaz no conjunto do livro. Não por aqueles poemas em versos livres, mas exatamente por outro de forma fixa: o canto real [2] em que o poeta fixa a tradição, para dizer que ela morreu e ficou circunscrita àquela forma antiga de fazer poema.
Antonio Fabiano não precisa provar nada, pois se assim quisesse, já o teria feito em Sazonadas com o soneto “Infinito”, digno de figurar entre o que de melhor se produziu no gênero. E mesmo um poema longo como “Serpente emplumada”, de Girassóis noturnos (em versos livres que se estendem por mais de vinte páginas), impressiona pela contenção do verso.
A forma fixa, então, se explica por uma necessidade da estrutura do livro. A primeira parte, composta de sonetos, tem como fim: a) a fixação do sujeito poético: primeiramente, na terra em que nasceu, a Paraíba; depois, na qual foi transplantado ainda criança, o “Rio Grande”; b) a descrição da terra que, afinal, é indivisa: “Nordeste é o mundo inteiro!” (Poema para Francisco J. C. Dantas); c) o inventário das tradições de sua terra (religiosas, culturais...).
Já o canto real (de tradição antiga) é a forma pela qual o poeta evoca os seus (nossos) antepassados. É um modo de expressar a tradição das fórmulas mortas. E é a partir daí que o sujeito é desterrado do seu chão: “Minh’alma deslizou por sobre os mares”.
Esse deslocar errante em tudo contrasta com a primeira parte (Em línguas de anjos) onde estão fincadas as raízes do sujeito poético (por nascimento ou transplante), e reforça toda uma instabilidade do ser já explorada nos poemas em verso livre (em línguas de rios e em línguas de asas, principalmente).
E aqui vale uma observação sobre o tempo do livro. Do conjunto dos quatorze sonetos do segmento “em línguas de anjos”, apenas os sete poemas iniciais expressam-se no presente, predominando o passado, a partir do oitavo, e assim no restante do telúrico Cancioneiro.
E é exatamente em decorrência da predominância do tempo passado, que dizer de Cancioneiro da terra que ele é um livro telúrico seria apenas uma tautologia, pois é esse passado que lhe empresta uma sombra de melancolia. Assim, o Cancioneiro não é apenas telúrico, mas de um telúrico melancólico, pois esse livro vai muito além de um canto de exaltação ao solo: “Em chãos da Paraíba eu nasci, / Mas cedo vim morar no Rio Grande.” Ele não é telúrico apenas no sentido de que é um poema enraizado na terra das lembranças do poeta: “Lancei raízes nesta terra Norte... / Daqui sou filho — alma e coração!”
Isso porque ao inventariar as tradições ancestrais, na busca de suas raízes, o sujeito poético dá-se conta de que é ele próprio um desterrado: “Expatriado é o que eu sou” [...] “Folha de árvore que se soltou” (Talvez os mortos voltem). Assim como em todo o segmento “em línguas de asas”, em que ser degredado não é atributo apenas do sujeito poético, mas do sujeito moderno, embora sem menção explícita a ele, que perdeu suas referências, suas raízes; que não é mais capaz de fincá-las em lugar algum: “São as filhas degredadas do universo” (A chegada).
Dessa forma, telúrico (no sentido do livro) significa uma comunhão com a terra; não a prometida, mas a perdida, onde as raízes que de fato importam são as dos ancestrais (avoengas), pois, diferente dos versos de Neruda, esse Cancioneiro não esconde suas raízes. Elas continuam lá; as árvores é que feneceram, como em “Talvez os mortos voltem”:

“Talvez os mortos voltem
Com suas ilusões de vivos
E eu os ouço à noite
Em seus gemidos.
Nada sobrou dos bens antigos
[...]
Bem inventariados em papel
Que agora as traças comem”.

Outro poema que expressa bem esse telúrico melancólico é “Perfeição”:

“[...]
O que sei e guardo
É o frescor da manhã
O canto das rolinhas
O cheiro do curral
Leite quentinho
E meu indizível avô
Ainda vivo.
Mas outro nome pra isso é perfeição!
[...]”

Isto é, a “perfeição” ficou no passado, perdeu-se no tempo da infância, de quando o avô ainda estava vivo.
E ao circunscrever seu Cancioneiro (no caso desse poema, a “perfeição!”) no passado, o poeta também se insere em uma outra tradição (a que mais importa agora): a tradição poética. Pois é também nesse poema no qual se percebe aquilo que se convencionou chamar de intertextualidade, explícita no primeiro verso, numa clara referência a Drummond: “A lembrança de minha terra dói”; ou ao rio que passa na aldeia de Pessoa: “E agora eu sei que o sol das outras terras / Não é / Como o daqui”.
Parafraseando nosso poeta maior, qualquer leitor (desterritorializado ou não) pode ler este Cancioneiro e dizer: “minha terra é apenas uma fotografia na parede mas como dói”.

Wilson Azevedo *


[1] Refere-se ao episódio de julho de 2012, o qual narrou-se em bem-humorada crônica, aqui mesmo no blog, sob o título de “Julho em Chamas”: http://antoniofabiano.blogspot.com.br/2012/07/julho-em-chamas.html

[2] Canto real (chant royal) é uma complexa e rara forma fixa de origem francesa, composta geralmente de cinco estrofes de onze versos com o mesmo bordão final e um remate (envio ou oferta), além de rigorosa metrificação e rimas determinadas. Surgiu no século XIV e foi bastante cultivado até o século XVI. É uma espécie de variação da balada e absolutamente incomum em nossos dias. (N. do B.)

* Wilson Azevedo é intelectual potiguar e crítico literário.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

CANCIONEIRO DA TERRA por Paulo de Tarso Correia de Melo

Este Cancioneiro da Terra, de Antonio Fabiano, abre-se em sete partes. Arco-íris de palavras como cores que se interpenetram para constituírem um todo temático, o Nordeste, sob feliz epígrafe de Zila Mamede: “A terra de minha origem primitiva me chama”.
Chamado que se faz em várias línguas, nomeadas segundo as partes do livro onde se diversificam formas para cada uma das linguagens. “Em línguas de pedra e fogo” é vazada uma série de catorze sonetos nos quais se tenta uma renovação e regionalização da forma fixa consagrada, o que se consegue no caso de “Senhora da Manhã”:

Senhora das juremas, dos facheiros,
Do xiquexique rude, oiticicas;
Ó tu, Mãe, que a terra plenificas,
Vela por minha gente de ceifeiros!

“Em línguas de rios”, como a água é rara, apenas dois poemas mais alongados, em versos curtos e coleantes.
Chega-se, então, ao que nos parece o ponto alto do livro. “Em línguas de asas”, série de doze poemas que tenta reproduzir o “Estremeço e vibração de pássaro”, epígrafe de José Gonçalves para textos que refletem sobre aves migratórias e a errática migração humana.
“Em línguas de homens”, o sertanejo acende um cigarro de palha cósmico e ilumina o universo.
“Em línguas de chuva”, fala-se de lembranças campesinas de perfeita felicidade.
A língua do mar mostra a força do Cancioneiro em “Caracol” e encerra-se com a série de cinco poemas que finalizam com o refrão: “Navio navegando mares mágoas...”.
       Termina o livro “Em línguas avoengas”, reflexão sobre as mais volumosas águas da lembrança. “A Bicicleta” ensina-nos a pedalar até o fim da vida e o último poema, “O Caminho”, a guardar estrelas para o dia seguinte.

Paulo de Tarso Correia de Melo
Membro da Academia Norte-rio-grandense de Letras


domingo, 14 de dezembro de 2014

SAN JUAN DE LA CRUZ

Manuscrito de Jaén (Cántico B)




Otras del mismo a lo divino

            Tras de un amoroso lance, 
y no de esperanza falto,
volé tan alto, tan alto,
que le di a la caza alcance.  
   
1.

        Para que yo alcance diese
a aqueste lance divino,
tanto volar me convino
que de vista me perdiese;
y con todo, en este trance, 
en el vuelo quedé falto;
mas el amor fue tan alto, 
que le di a la caza alcance. 
   
2.

           Cuando más alto subía
deslumbróseme la vista,
y la más fuerte conquista
en oscuro se hacía;
mas, por ser de amor el lance,
di un ciego y oscuro salto,
y fui tan alto, tan alto,
que le di a la caza alcance.
   
3.

Cuanto más alto llegaba
de este lance tan subido, 
tanto más bajo y rendido 
y abatido me hallaba;
dije: ¡No habrá quien alcance!;
y abatime tanto, tanto,
que fui tan alto, tan alto,
que le di a la caza alcance.  
   
4.

Por una extraña manera, 
mil vuelos pasé de un vuelo, 
porque esperanza de cielo
tanto alcanza cuanto espera; 
esperé sólo este lance, 
y en esperar no fui falto, 
pues fui tan alto, tan alto,
que le di a la caza alcance.  

San Juan de la Cruz (1542-1591)

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

PROMOÇÃO

Olá, pessoal!

Gosto que gostem da minha poesia! Obrigado! Mas não sou eu que distribuo o livro... Na verdade, ele já circulava em Natal-RN há dias quando chegou às minhas mãos nesta semana e eu pude finalmente vê-lo! Ficou bonito. Todavia, tenho aqui em São Paulo alguns exemplares. Escrevam para o meu e-mail e prometo enviar, gratuitamente, alguns exemplares para os que curtem poesia! Farei sorteio. Ah, não se esqueçam de mandar o endereço para correio. E, antes que perguntem, sim, mandarei para os leitores de fora do Brasil. Quando sobrar um tempinho, publicarei aqui no blog alguns poemas do Cancioneiro. Obrigado!
Antonio Fabiano
seridoano@gmail.com


quinta-feira, 11 de dezembro de 2014

ANTÔNIO AMARO (1918-1992)

Antônio Amaro com auxiliar e uma de suas câmeras fotográficas
Foto: Acervo da Família

Antônio Cipriano dos Santos nasceu em 13 de junho de 1918, em Parelhas-RN. Foram seus pais: Amaro Cipriano dos Santos, o renomado Mestre Amaro, e Carmelita Maria da Conceição. Ficou então conhecido pelo nome de Antônio Amaro. Chegou a Cerro Corá-RN no início dos anos 1940. Muito jovem tornou-se motorista. Prestou serviços à Inspetoria de Obras Contra as Secas, abrindo rodovias hoje conhecidas e percorridas por muitos norte-rio-grandenses. Em 1945 casou-se com Inácia Iná Dantas, passando a residir na Várzea dos Evaristos (Cerro Corá), onde nasceram os cinco filhos do casal: Sobrinho, Assis, Geraldo, Juarez e Tárcio. Antônio Amaro desenvolveu outras atividades: fogueteiro, fotógrafo, comerciante, ferreiro. Durante muito tempo fabricou fogos de artifício, na época conhecidos por "fogos de vista", como "balões", "fogos de roda", de "lágrimas", "chuveiros", "foguetões", os quais eram chamados "massa luz". Trabalhava nesse ofício em festas de padroeiros, como São João Batista, em Cerro Corá; Sant’Ana, em Currais Novos; nas novenas religiosas; inaugurações de obras; manifestações políticas e em outras ocasiões festivas. Ao interessar-se por fotografia, logo adquiriu habilidades e vasta experiência nesse campo, tornando-se um profissional competente e desenvolvendo amplo trabalho de cobertura dos acontecimentos daquele tempo, em Cerro Corá e região. Antônio Amaro usava as máquinas fotográficas do tipo caixão, também denominadas "lambe-lambe" ou "mão no saco", as mais modernas do tempo. As fotos que existem até hoje, de excelente qualidade, em preto e branco, eram reveladas por ele mesmo, em casa. Nos últimos anos, num carro-pipa de sua propriedade foi responsável pelo abastecimento de água da cidade. Manteve-se, por um período, no comércio de queijo. Foi também fabricante de silos para cereais, barris, bicas e outros utensílios de uso doméstico e agrícola, em alumínio e zinco. Sua última profissão. Antônio Amaro faleceu em 11 de dezembro de 1992, em Cerro Corá, aos 74 anos, vítima de um câncer na vesícula. Aquele era o mesmo dia de aniversário de emancipação política da cidade que ele amou e escolheu para si.

segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

CANCIONEIRO DA TERRA (2014)


Copyrigth@by Antonio Fabiano
Ficha Técnica:
Fotografia: Antônio Amaro (1918-1992)
Capa: Brito e Silva - DRT/RN 166
Revisão: Leonam Cunha
Projeto Gráfico: Maria do Socorro de Oliveira - DRT/RN 165
Edição: Sarau das Letras

_____________________________________

SARAU DAS LETRAS EDITORA LTDA.
Rua Antonio Vieira de Sá, Quadra 45, Casa 3, Anexo.
Conjunto Portal do Sol, Nova Betânia, Mossoró-RN
CEP 59607-100
Contatos:
davidmleite@hotmail.com
clauderarcanjo@gmail.com
* David de Medeiros Leite e Clauder Arcanjo (editores)

sexta-feira, 28 de novembro de 2014

PAISAGEM SECA - fotografia de Antônio Amaro (1918-1992)

Está prestes a sair meu "novo" livro de poesia: Cancioneiro da Terra (Editora Sarau das Letras). Partilho com vocês a fotografia da capa, em preto e branco e com efeito sépia. A fotografia original (em preto e branco, mas não exatamente nos tons que se veem aí...) foi feita por meu avô Antônio Amaro, em meados do século passado. A original, que pertence ao acervo da família, está em alguns pontos bastante danificada. Portanto, o que aí temos é uma restauração parcial, em duas versões, para que uma delas seja incluída no livro. Os trabalhos de restauração, capa e projeto gráfico foram realizados em Natal/RN, por Brito e Silva e Maria do Socorro de Oliveira.


PAISAGEM SECA

Versão 1
Fotografia de Antônio Amaro (1918-1992)


Versão 2
  Fotografia de Antônio Amaro (1918-1992)

A fotografia original de "Paisagem Seca" já foi exposta ao público em atividade cultural de Cerro Corá/RN, ao lado de outros trabalhos de Antônio Amaro

terça-feira, 25 de novembro de 2014

TÃO QUERIDA IRIS...

Iris Gomes da Costa (foto: Jorge Baumann)

Iris Gomes da Costa é natural de São Fidélis-RJ. Estudou Literatura Comparada (UFRJ). Dedicou-se ao estudo da prosódia, no Brasil, especializando-se nos sotaques brasileiros, fazendo vários trabalhos para a televisão, dentre eles: Grande Sertão: Veredas; Helena; Chapadão do Bugre; Tieta; Memorial de Maria Moura; Renascer; As Pupilas do Senhor Reitor; Serras Azuis; Xica da Silva; A Indomada; O Auto da Compadecida; Meu Bem Querer; A Muralha etc.
Publicou crônicas no Jornal Nova Fronteira (São Fidélis); poemas nos Cadernos Universitários (UFRJ).
Participou da antologia Universitários: Verso e Prosa (Editora José Olympio).
Foi membro da equipe do Prof. Dr. Afrânio Coutinho, na Enciclopédia de Literatura Brasileira.
Diversas vezes premiada, destaca-se o “Prêmio Nacional Alfredo Machado Quintella”, com um ensaio poético sobre o livro Bem do Seu Tamanho de Ana Maria Machado.
A convite especial do Consulado Americano foi escolhida para intercâmbio cultural com personalidades do cinema, da literatura, do teatro e da televisão. Por essa ocasião registrou e gravou na Biblioteca do Congresso de Washington (EUA) a primeira composição do seu livro Pedras D’água, com o título de Acqua Lírica.
Adaptou para a televisão a peça Uma mulher Vestida de Sol, juntamente com o autor Ariano Suassuna e o diretor Luiz Fernando Carvalho.
A pedido da atriz Araci Cardoso, escreveu para o teatro a peça A Teus Pés, em parceria com Mércia Neri, reunindo poemas de Ana Cristina Cesar.
É de sua autoria o monólogo Memória de Embornal, representado pelo ator Jackson Antunes, que marca a estreia da consagrada diretora de cinema e TV, Tisuka Yamasaki, na área teatral.
Também presta sua colaboração ao cinema, tendo participado dos filmes Manôushe, de Luiz Carlos Begazo, O Guarani, de Norma Bengel e A Guerra de Canudos, de Sérgio Rezende.
Rachel de Queiroz, lendo Iris, diz de sua poesia: “Um jogo meio barroco; seria talvez enervante, se não nos enfrentasse um grande, autêntico talento de poeta.”
Especialíssima criatura humana, Iris Gomes da Costa é membro da Ordem dos Carmelitas Descalços Seculares (OCDS). 


OITO POEMAS

Seleção pessoal de oito poemas da minha amiga Iris Gomes da Costa, com quem estive recentemente, aqui em casa, em sempre renovada alegria. Todos do livro PEDRAS D'ÁGUA (Edições Cuatiara, 2001). A numeração entre colchetes é minha, não dos originais.


[1]

Pelo chão
o brilho 
de escamas prateadas:
céu de estrelas
sob o sol

O peixe sem cabeça
A carne tenra

O lábio macio
toca o coração
O beijo
suga a boca
O corpo inteiro
um só torpor

Onde
os olhos do peixe
petrificados
para fixar
o escoante delírio
do amor?



[2]

Por que não apagar a luz
e tentar dormir?

Enfiar o dedo no nariz
remexer uma nova
sempre antiga meleca
ouvir o barulho
renitente
da água da torneira
que pinga
insistente
na pia do banheiro
seguir o motor do carro
que passa ao longe
indo apressado
para um longe
onde não sei
de que adianta?

Por que não apagar a luz
e dormir
encurtando
a prolongada solidão
de minha noite
já que é certa
a certeza
de que você não vem?



[3]

A sala vazia
de nossos móveis
velhos
usados
imprestáveis
mede meu olhar

Emoldurada
no meio da sala
traduzo:
não mais prestamos
um para o outro

Rimo belo com feio
sorriso com lágrima
riso com dor



[4]

Atravessar
a rua / a vida
– partida –
no chão duro
o asfalto / o passo
– a separação –
caminho estéril:
nem mesmo uma pegada
– impossível revenir sur les pas
– voltar jamais – 
partiu-se o fio de Ariadne
labirinto
– sinto –
– minto –
(o solo seco
absorveu a lágrima
barranco
que já foi cachoeira)
– verdade inteira –
verdadeira?
de um lado
– um – 
do outro
– outro – 
no meio
– a rua – 
– a vida –
sinal aberto
preciso atravessar



[5]

Esfinge
tatuo gargalhadas
no ar

– cavalo relinchando – 

(Riso de prazer
ou
grito alucinante
de agonia?)



[6]

Liquidez de pedra
quietude de terremoto
calmaria de vendaval:

eu
no escuro de mim
à espera
de um milagre

(Qual)

– ? –



[7]

O lamento
embalsamado
endurecido
na boca
da Mãe África
escorre
por meus ouvidos
feito gemido
de mulher
a se contorcer
em dores
por parir

– o difícil parto
da Liberdade –



[8]

Poeta:
pássaro da noite
guardião da lua
prisioneiro das estrelas

(Onde 
a gaiola
transparente
aberta
para o voo?)


 COSTA, Iris Gomes da. PEDRAS D’ÁGUA. Belo Horizonte: Cuatiara, 2001.