Dando continuidade à
análise, tentaremos perseguir o caminho trilhado desde o início, a fim de
desvendar o mistério para a compreensão da significação do poema.
O poeta está fazendo
uma pergunta geral sobre todo o poema que encantou seu mundo de homem-jovem,
expressões que soam estranhas ao ouvido civilizado, mas que revelariam a
essência desse habitante sem raízes que busca no vazio os comprovantes de sua
essência poética:
“Mas
como pode caber
Num
homem tão pequeno
Tanta
poesia
Tanto
sonho e desejo?”
Esses versos mágicos
invocados pelo adulto de hoje, no caso o poeta, revelam um toque de
singularidade no tratamento da temática ubi sunt, uma vez que o poeta
não indaga diretamente pelos seus antepassados, mas procura no tempo a imagem
perdida de si mesmo. – p. 73 - Análise da Obra - Carlos Drumond de
Andrade – Affonso Romano de Sant’Anna.
Finalmente num ímpeto da
alma, ele assim se expressa:
“(Sonho)
Shangri-La
É coração de amigo...”
Nesse poeta, a
reconquista do “paraíso perdido” (“Shangri-La”) obedece a um impulso para
alargar a sua vida, compensando o que as preocupações circunstanciais lhe tomam
cada dia.
Essa volta do passado é
um movimento interno da consciência por abranger todas as direções do tempo
a fim de se conhecer a si mesmo.
O sonho vai justificar
toda a atmosfera do poema, bem como a sua linguagem.
O poeta está empenhado
numa guerra, dentro de si mesmo, para descobrir a sua essência, que toma a
forma de uma preocupação imprevisível, a fim de descobrir o sentido, em sua
mente, das imagens (a sua estrutura profunda).
“Ó
beatitude
Maravilhosa
descoberta:
Todos
os músicos
São
deuses disfarçados!”
O comportamento do
poeta se traduz, neste momento, pelo princípio da IMPREVISIBILIDADE,
ORIGINALIDADE E CRIATIVIDADE. Pois o poeta, surpreendentemente, conseguiu
sentidos novos em relações novas entre as palavras, palavras por sinal bem conhecidas
de todos nós. Mas uma nova construção, uma nova maneira de dizer, produziu novo
sentido, daí o seu caráter de IMPREVISIBILIDADE que ninguém poderia esperar.
CRIATIVIDADE E
ORIGINALIDADE
O poeta soube construir
frases e ideias diferentes, incomuns à maneira de dizer e falar, como por
exemplo:
“Um
canto / Quase inaudível / Veio da ave / Sem nome / Que viu na flor / O mel / Do
seu delírio / Um lírio? / Não tinha nome. / E a beijou? / Qual beija-flor. / Pois
era a cor e / A própria flor / O mel / Do seu delírio. // Voou...”
É nítida a presença do enjabement. O enjabement é, portanto um recurso voluntariamente empregado pelo
poeta a fim de criar uma unidade melódico-emotivo-semântica mais extensa que as
anteriores. – p.185 - A Criação Literária de Massaud Moisés. Veja: “... da ave / Sem nome........ Do seu delírio........
a cor e / A própria flor........ mel / Do seu delírio.”
Isso demonstra um
determinado PROCESSO POÉTICO, A PRÓPRIA POESIA.
Finalmente um momento
ímpar dentro do poema: compreender o mistério que é o da “Serpente Emplumada”
que dá título ao poema.
É um mito asteca: “A Serpente Emplumada”. Os astecas acreditavam que viviam sob o sol de “Quetzalcoatl”, o deus serpente emplumada, deus da criação, da aprendizagem e do vento. O sol se move levado por sua respiração. Quando os guerreiros morrem, suas almas se transformam em raras aves emplumadas e voam para o sol. Quetzalcoatl era o rei da cidade dos deuses. Era totalmente puro, inocente e bom. Muito mais outros fenômenos ele provocava, como fazer chover, por exemplo.
Agora, veja só que
beleza de descrição no poema sobre a serpente emplumada!
“Ondula!
Ondula
Serpente
De
cauda prateada
De
plumas
Enfeitada
Cabeça
Adornada
Como
velhos índios chefes
Banidos
do meu país de nus!”
A colocação das
palavras é tão perfeita que é como se a nossa percepção sensorial visualizasse
o serpear (o andar sinuosamente) da serpente.
Todavia esta é uma
explicação muito superficial do que significa realmente a “Serpente Emplumada”.
Vale a pena lembrar o
que afirma A. Moles (1971) sobre a percepção estética:
“A percepção estética é
o resultado de uma “integração cerebral” que visa obter a unicidade,
procurando um traço de relação na complexidade dos elementos
constituintes. O material dessa percepção (visual ou sonora) é constituído por átomos
de sensação fornecida pela excitação sensorial dos órgãos
envolvidos. Quanto à percepção propriamente dita, ela se identifica com o
reconhecimento de macro signos, conjuntos reconhecidos como totalidades
operantes. A tomada de consciência dos dois canais da percepção do poético,
oral e visual, leva assim a acentuar seu aspecto unitário. (grifos nossos).
A teoria da estética informacional
(A. Moles, 1958), visa também a apreciar e talvez medir (ver os trabalhos de C.
E. Shannon) a ressonância de uma mensagem artística sobre o receptor.
Supomos que o codificador e o descodificador possuíssem os mesmos repertórios
compostos de elementos conhecidos ou facilmente reconhecíveis (regras de
sintaxe, dicionários, sons da língua). Nessa situação, a todos o
artista procura criar uma mensagem composta de tal maneira que traga, àquele
que o receba, certa quantidade de novidade, quantidade que não deve ir além de
determinado limite, a fim de que o receptor possa projetar formas sobre aquilo
que lhe é transmitido.
Nada mais velado (novidade)
do que trabalhar, pelo menos para mim, com o título exótico como o da “Serpente
Emplumada”.
A inquietação inerente a
este estudo volta-se, fundamentalmente, ao desvelamento sistemático do ato de
ler. Verifica-se que esta tarefa exige do inquiridor um trajeto de investigação
que não fuja às características estritamente humanas da leitura. A busca de uma
síntese a partir de diferentes perspectivas ou pontos de vista, discutindo e
“entrelaçando” conceitos iluminados por discursos diversos é que vai garantir a
incisividade e profundidade pretendidas nesta reflexão.
É a teoria da estética
informacional – “a ressonância” – (reforço das vibrações e, portanto, do som),
se confirmando.
Todo o texto enquanto
tal apresenta uma forma ou estrutura e possui, necessariamente, uma essência.
Ao se situar diante de um fenômeno (o texto), na busca de compreender sua
estrutura e essência, o inquiridor coloca entre parênteses sua experiência
anterior e, guiado por sua consciência, designa, nomeia e dinamiza esse
fenômeno no sentido de fazê-lo ganhar maior significação. A palavra não é mais
“ruído e signo sem fundo”. (Barthes, 1953): ela se insere num espaço; e esse
espaço que é comunicado ao mesmo tempo que a palavra, resulta numa geometria
indissociável da sintaxe. (grifo nosso).
A função poética
valoriza os elementos funcionais segundo sua natureza própria. Não apenas
confere “um sentido mais puro às palavras” [N.T.: Mallarmé], mas produz
sentido. O funcionamento sintático não desempenha, necessariamente, um papel
mais importante que os outros; pode até mesmo ser totalmente encoberto por sistemas
recorrenciais, mais poderosos, no plano sonoro ou semântico. – p.106 - Linguística
e Poética - Daniel Delas e Jacques, Filliolet.
Todavia quem se
propuser estabelecer esquemas de funcionamento, por analogia com o
funcionamento poético real, necessariamente conferirá ao funcionamento sintático
um lugar primordial pois este organiza o surgimento do material verbal. (grifo
nosso).
Aqui se observa mais
nitidamente a importância do contexto, ou seja, do elemento sintático. A
palavra isolada é desprovida, por vezes, de significação, justamente porque,
podendo aplicar-se a vários objetos diferentes, impede o estabelecimento da
intencionalidade. Suponhamos o vocábulo “floresta”. Apenas pelo contexto se
define o objeto intencional como fator de fundamental importância na
caracterização da linguagem poética, pois, no caso de figurar num conjunto
frasal: “floresta das almas”, maiores possibilidades oferecerá à experiência
estética.
A expressão “floresta
das almas”, por exemplo, apenas pelo contexto se define o objeto intencional
como um ato militar. Na história lendária da serpente emplumada, quando os
guerreiros morrem, suas almas se transformam em raras aves emplumadas e voam
para o sol. O sol se move levado por sua respiração. Muito mais pode ser lido
sobre a serpente emplumada via Internet, de onde retiramos algumas dessas informações.
CONTINUA...
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