sexta-feira, 1 de junho de 2012

10. Cláudia Ahimsa


O dono do taxímetro
dono circunstancial do meu silêncio
no percurso que àquela rua conduz.

– Sabe que bicho gosta de viver
naquele mato?
– Não, senhor.
– Gambá, e deve estar cheio deles
ali.

De passagem, mal se vê
o emaranhado verde no escuro.
Duas amendoeiras se entrosam
sobre o teto de zinco.
Fito.
De verbo quase em desuso.
“Rubião fitava a enseada.”
E o elevado decliva
na Enseada de Botafogo
constelada de penumbras. Entro
pela palavra gambá – entro no poema
com táxi e tudo.

– Gambá come galinha, não é mesmo? –
Ouvi dizer que quem tem galinheiro
costuma atirar em gambá...
– É um problema matar esse bicho,
disse,
compungido.
– Fede?
– Não, não por isso.
Um dia, pensei – é feio – é mesmo que um
ratinho e matei só por matar. Um horror.
Ele chora. Chora alto. Morre chorando. Eu vi,
os olhos brilhavam. Eu vi as lágrimas. Não, não.
Um horror

(Enseados














afundamos em ruas
cinco esquinas em silêncio até o portão)
A cidade tornaria a entrever no escuro
                                                                                  o olhar

de um dos animais mais antigos da Terra.
Contemporâneo nosso e do tiranossauro!
Em alguma amendoeira carregada de súplica...
No espelho retrovisor daquele táxi.


História natural

Cláudia Ahimsa


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