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sábado, 26 de novembro de 2011

CONSCIÊNCIA NEGRA

“A Biblioteca Nacional e a Secretaria de Promoção da Igualdade Racial da Presidência assinam na segunda acordo para publicação de uma coleção de e-books sobre a questão do negro. O projeto, lançado no mês da consciência negra, prevê a implantação de dez pontos de leitura em terreiros e comunidades quilombolas.”

Nota da Folha de S. Paulo – E2 ilustrada – sábado, 26 de novembro de 2011.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

LITERATURA E AFRODESCENDÊNCIA NO BRASIL

Definitivamente este é um acontecimento a se celebrar: lança-se pela Editora da UFMG um monumental trabalho, em quatro volumes, intitulado “Literatura e afrodescendência no Brasil: antologia crítica”. Trata-se do resultado de mais de uma década de pesquisa, liderada pelo professor Eduardo de Assis Duarte, com a colaboração de 61 outros pesquisadores de 21 universidades brasileiras e seis estrangeiras. É evidente que um trabalho assim obriga-nos a considerar muitos aspectos da literatura brasileira até então ignorados. Aliás, a própria obra se insere numa categoria importantíssima dos estudos literários na contemporaneidade, que é a do “resgate”. Maria Aparecida Andrade Salgueiro, professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, pesquisadora e visiting international scholar do Dartmouth College, Estados Unidos, diz que: “Lançando foco sobre 100 escritores afrodescendentes, vindos de tempos e espaços diversos, por meio de ensaios e referências biográficas e bibliográficas sobre cada um deles, dos tempos coloniais até os dias de hoje, a coletânea procura organizar a ainda dispersa reflexão acadêmica atual sobre o tema, num percurso histórico que vai de clássicos (Machado de Assis, Lima Barreto, Cruz e Sousa) a contemporâneos (Nei Lopes, Paulo Lins, Ana Maria Gonçalves), passando por nomes importantes ‘esquecidos’ (Maria Firmina dos Reis, José do Nascimento Moraes). A antologia deixa claro que seu real objetivo é ‘mostrar que existe uma produção literária importante que caminha na contracorrente das normas ainda vigentes no circuito literário’.” (Estado de Minas//Pensar – 19 de novembro de 2011). Esta é, portanto, uma obra de grandíssima relevância, verdadeiro marco nas letras do nosso país. Por isso terá lançamento em pelo menos seis capitais do Brasil e um lançamento oficial no Rio de Janeiro, no Teatro Machado de Assis da Biblioteca Nacional. Aqui, em Belo Horizonte, o lançamento acontecerá hoje às 19h, na Biblioteca Pública Luiz de Bessa, com homenagem a Carolina Maria de Jesus e ao poeta Adão Ventura, além da presença dos escritores Ana Maria Gonçalves, Ana Cruz, Anelito de Oliveira, Anísio Viana, Aroldo Pereira, Cidinha da Silva, Conceição Evaristo, Edimilson de Almeida Pereira, Eustáquio José Rodrigues, Jussara Santos, Leda Martins, Marcos Dias e Waldemar Euzébio.

Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 21 de novembro de 2011.
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
E-mail: seridoano@gmail.com
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As informações acima transmitidas constam no caderno Pensar do jornal Estado de Minas, deste último sábado 19 de novembro de 2011.

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

RUY DUARTE DE CARVALHO (1941-2010)


“Uma memória a ter-se
mas não aquela que o futuro impeça”


(Do poema “Abertura”. In: Ruy Duarte de Carvalho. Hábito da Terra. Poesia. Luanda, União dos escritores Angolanos, 1988, p. 41.)

Fonte: União dos Escritores Angolanos.

A terra que te ofereço - Ruy Duarte de Carvalho

1

Quando,
ansiosa,
pela primeira vez
pisares
a terra que te ofereço,
estarei presente
para auscultar,
no ar,
a viração suave do encontro
da lua que transportas
com a sólida
a materna nudez do horizonte.

Quando,
ansioso,
te vir a caminhar
no chão de minha oferta,
coloco,
brandamente,
em tuas mãos,
uma quinda de mel
colhido em tardes quentes
de irreversível
votação ao Sul.

2

Trago
para ti
em cada mão
aberta,
os frutos mais recentes
desse Outono
que te ofereço verde:
o mês mais farto de óleos
e ternura avulsa.
E dou-te a mão
para que possas
ver,
mais confiante,
a vastidão
sonora
de uma aurora
elaborada em espera
e refletida
na rápida torrente
que se mede em cor.

3

Num mapa
desdobrado para ti,
eu marcarei
as rotas
que sei já
e quero dar-te:
o deslizar de um gesto,
a esteira fumegante
de um archote
aceso,
um tracejar
vermelho
de pés nus,
um corredor aberto
na savana,
um navegável
mar de plasma
quente.

Ruy Duarte de Carvalho
(A Decisão da Idade, 1976)

OS PAPÉIS DO INGLÊS

...só se fosse olhar o céu
as cortinas da chuva
adormecer na brisa do calor
e borbulhar suor
no eco dos trovões...



Para quem? Ou a quem?

(...)

Era uma hipótese deslumbrante, delirante, aterradora, sublime, essa de que afinal tinha sido atrás dos papéis do Inglês que o meu pai tinha acabado por colocar-me! Eu estava siderado de emoção, e não era caso para isso?, e saí de casa com a certeza de ir descortinar baleias nos horizontes da Praia Amélia. Vi as baleias, sim, o que é sinal de sorte. Anunciavam o que estava para vir, no imediato e a dar lugar à estória, à nossa estória, enfim.

Ruy Duarte de Carvalho
In: Os Papéis do Inglês ou O Ganguela do Coice
(Ficção angolana)

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Trechos de “Os Papéis do Inglês” (2000) de Ruy Duarte de Carvalho, angolano de origem portuguesa, escritor, cineasta e antropólogo. Autor de vários livros de poesia e uma das vozes mais importantes de Angola e da lusofonia. Recebeu em 1989 o Prêmio Nacional de Literatura de Angola.

Ruy Duarte de Carvalho (Santarém, 1941 – Swakopmund, 2010)

Ruy Duarte de Carvalho - Luís Barra

segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

FILINTO ELÍSIO, NOSSO QUERIDO IRMÃO...

Filinto Elísio, poeta cabo-verdiano (Foto disponível na Web)

Com ares de alvíssaras reverenciamos hoje este nome das letras cabo-verdianas, Filinto Elísio. Cada vez mais conhecido e amado pelos brasileiros, o poeta da República de Cabo Verde, arquipélago atlântico do Noroeste da África, tem sido um dos grandes agentes incentivadores do crescente interesse do Brasil em relação às chamadas literaturas africanas de língua portuguesa. Com certo atraso o Brasil se volta agora para a escrita do grande continente, sempre tão rico, belo e fascinante, mas ainda muito desconhecido entre nós. Se é verdade que nós brasileiros somos, como o disse Eça de Queirós, portugueses desabrochados ao calor dos trópicos, com mais razão pode-se dizer que nos configuramos todos de algum modo também africanos. Isto é o que somos, orgulhosamente!

VEJA ENTREVISTA E POEMA INÉDITO DE FILINTO ELÍSIO NESTE BLOG.

FILINTO ELÍSIO - ELE E OBRAS


FILINTO ELÍSIO CORREIA E SILVA nasceu na Cidade da Praia, no Arquipélago de Cabo Verde, em 1961. Poeta e autor de crônicas, revelou-se há pouco também romancista. É bibliotecário e administrador de empresas. Lecionou em Boston e em Somerville, nos Estados Unidos da América. Consultor Internacional para políticas públicas em Cabo Verde e Administrador do Seminário “A Nação”, foi ainda assessor do Ministro da Cultura de Cabo Verde.

OBRAS:

“Do Lado de Cá da Rosa” (Poesia)
“Prato do Dia” (Crônica)
“O Inferno do Riso” (Poesia)
“Cabo Verde: 30 Anos de Cultura” (Antologia)
“Das Hespérides” (Poesia, Prosa e Fotografia)
“Das Frutas Serenadas” (Poesia)
“Li Cores & Ad Vinhos” (Poesia)
“Outros Sais na Beira Mar” (Romance)

ENTREVISTA DE FILINTO ELÍSIO – ESCRITOR CABO-VERDIANO – A ANTÓNIO FABIANO


Filinto Elísio - Foto Divulgação


ANTÓNIO FABIANO: Poderia nos contar um pouco da sua história, até chegar ao seu envolvimento com o Brasil?

**FILINTO ELÍSIO** Bem, a minha história, como a de todos os cabo-verdianos, está intimamente ligada à África, Europa e Brasil. Antológica e ontologicamente cruzada com o Brasil. Há, em certa medida, um processo antropológico e histórico comum, determinando não só os nossos pathos e ethos diferenciados, mas também aqueles comuns e até convergentes. Nesse sentido, as histórias individuais e existenciais, como a minha, cumprem, em recorte particular, o rio maior que nos impõem as grandes viagens. Sempre encontrei a presença do Brasil em casa, seja pela música, seja pela poesia, e cresci numa família que, em pleno tempo colonial, via no Brasil uma espécie de «terceira dimensão/solução» para a condição de Cabo Verde, independente de Portugal só depois de 1975. Por sorte e honra, estudei Biblioteconomia em Minas Gerais e acompanhei, desde essa altura, o Brasil como uma pertença também minha.

ANTÓNIO FABIANO: Como aconteceu a literatura em sua vida?

**FILINTO ELÍSIO** Igualmente, a literatura foi para mim «arte de berço». Soube que a minha mãe me ninava com declamação de poemas de António Gedeão, de Ribeiro Couto e Jorge Barbosa. Por isso, sou visceralmente poeta. Durante a minha infância e a minha adolescência o ambiente era de literatura e de cinema, pois o meu pai também era gramático, leitor interessado e cinéfilo. Permitiu-me conhecer alguns intelectuais brasileiros, como Glauber Rocha e Jorge Amado. E introduziu-me cedo o gosto pela Bossa Nova e a Tropicália. Ouvíamos Gil, Caetano, Chico, Jobim, Bethania e Gal, de manhã à noite. E declamávamos Vinicius, Drummond e João Cabral de Melo Neto nas nossas noites de festa familiar. Mas escrever mesmo só aos 14 anos, depois de ler o «Diário de Anne Frank e o «Processo de Kafka». Só depois do «choque» de ter lido «O Estrangeiro», de Albert Camus. Definitivamente, depois de mergulhar nas faces múltiplas de Fernando Pessoa. Escrever mesmo só depois de ter lido «O Velho e o Mar», de Ernest Hemingway e de imaginar o velho Santiago, na sua luta para pescar o merlin e voltar para o porto apenas com a carcaça comida por tubarões. Mas também muito me despertou «O Amante», de Marguerite Duras, e a consciência crítica, mas angustiosa, da solidão existencial. Terá sido impossível apreciar esse manancial de apelos estéticos e não querer puxar para mim tamanho élan.

ANTÓNIO FABIANO: De todas, quais as principais influências literárias, culturais, que recebeu ao longo desse itinerário intelectual?

**FILINTO ELÍSIO** Provavelmente dos poetas todos que li. Não tive aquilo que Maquiavel, num rasgo de subtileza, chamou de «pensamento da praça pública». Fui muito pelas margens e devorei poetas consagrados e marginais.

ANTÓNIO FABIANO: Como tem sido a receptividade de sua obra entre os brasileiros?

**FILINTO ELÍSIO** Boa em termos de crítica, mas muito reduzida em termos de público. Não posso assumir que seja conhecido no mercado brasileiro, infelizmente. Para qualquer escritor desta nossa língua portuguesa não ser conhecido do leitor brasileiro se configura como um grande handicap. Tirando o Ceará, onde já lancei dois livros, e São Paulo, onde em meios académicos alguém sabe da minha escrita, bem como Imperatriz, no Maranhão, em que sou membro da sua Academia de Letras, o Brasil é um fabuloso espaço a «conquistar». Não falaria do mercado em si, mérito e vantagem dos meus editores, mas do conhecimento e da interacção com os leitores brasileiros que me encantam. O meu romance «Outros Sais da Beira Mar» e o de poemas «Li Cores & Ad Vinhos», este com a participação plástica de Fernando (Mito) Elias, já fizerem um percurso tímido pelo Brasil.

ANTÓNIO FABIANO: Actualmente você percebe um crescimento na relação entre nossos países irmanados pela língua? Como?

**FILINTO ELÍSIO** O incremento é real e a ampliação é um ditame destes novos tempos. Entretanto, todos poderíamos fazer mais. Precisamos de mais intercâmbios, de mais leituras e de mais revisitações uns dos outros ou uns aos outros. Quem sabe, o Instituto Internacional da Língua Portuguesa, da CPLP, com sede em Cabo Verde, não possa fazer mais e ser o pivot deste novo desafio? O Brasil tem um papel dorsal. Portugal idem. Sem os africanos a lusofonia estaria mais empobrecida. O elemento fundante da lusofonia não é só a língua portuguesa, mas a história, a cultura e o destino comum. Há uma ancestralidade borbulhante que nos une e nos mantém coesos na diversidade.

ANTÓNIO FABIANO: O que foi o Movimento Claridoso? Pode nos falar um pouco disso e de como brasileiros tiveram parte nele?

**FILINTO ELÍSIO** Claridade foi sem dúvida um grande marco estético, sociológico e linguístico. Mais uma vez, o Brasil teve o seu espaço na literatura cabo-verdiana, neste caso por via do Realismo Nordestino. O Movimento, iniciado em 1936, abriu espaço para um fazer literário mais realista e moderno, rompendo a geração anterior. É a modernidade em termos formais e de conteúdo. Entretanto, a literatura cabo-verdiana não começou com a Claridade, nem ficou por ela. A própria Pós-Claridade já não se coloca. Estamos num novo momento, nem saberei dizer se movimento, da literatura cabo-verdiana. Arménio Vieira, o prémio Camões 2009, nada tem a ver com a Claridade. Actualmente, temos escritores de linhas bem mais abstractas e de outras alquimias das formas.

ANTÓNIO FABIANO: Quais autores cabo-verdianos você gostaria de ver publicados no Brasil?

**FILINTO ELÍSIO** Falei há bocado de Arménio Vieira. Mas também gostaria de ver nas estantes e escaparates brasileiras os escritores Corsino Fortes, Osvaldo Osório, Mário Lúcio Sousa, José Luís Hopffer Almada, José Luís Tavares, Fátima Bettencourt, Dina Salústio, Valentinous Velhinho e Dani Spinola, entre outros. Falei há dias com a Professora Simone Caputo Gomes, da USP, uma das autoridades em estudo da literatura cabo-verdiana, sobre a História da Literatura Cabo-verdiana. É uma plêiade de nomes, tantos que estamos a pensar já na criação da Academia Cabo-verdiana de Letras, a primeira da África de expressão oficial lusófona. Entretanto, não anuncio a academia com glória alguma, diga-se, já que o labor literário não está sob a toada da «imortalidade» dos académicos que tal como os prémios e as condecorações não servem para nada. O poeta, digno de tal nome, não se torna imortal pelas honrarias enganosas. Chinua Achebe dizia que «o poeta que não tem problemas com o rei, tem problemas com a sua própria poesia. Qual a glória de criarmos a Academia? Nenhuma. Entrementes, gostaria de ver todos os nossos escritores nas livrarias e nas bibliotecas brasileiras.

ANTÓNIO FABIANO: O que aproxima e diferencia nossas literaturas?

**FILINTO ELÍSIO** Provavelmente a língua e outros activos e passivos histórico-culturais correlatos. Mas em verdade não há uma resposta cabal sobre isso. Em tese, uma literatura, a par de ser de um lugar e de um tempo, é de um indivíduo. Não a vejo com a lógica marxista, de processo histórico. Vejo-a como uma complexidade que não se explica. Não se sabe. É um mistério. As literaturas têm um substrato comum que se lhes pressente. Nada muito nítido, claro e cartesiano como pretendem as academias e os estudiosos. Em «O Arco e o Lira», Octávio Paz problematiza tal tormentosa questão (o que é a poesia?), e múltiplas respostas, longe de nos saciarem, trazem outros labirintos.

ANTÓNIO FABIANO: Você tem projetos para 2011 no Brasil?

**FILINTO ELÍSIO** «Me_xendo no Baú» é um livro de reverberações filosóficas e crioulas, no espaço e em seu limite no qual dialogo com as necessidades do humano em mim. Será publicado em Lisboa, no mês de Abril. Creio que consigo transpor neste livro a perspectiva do conflito social, contingencial e emocional. Sou mais cerebral, no víeis cabralino do termo. Persigo nele a pura filosofia da composição como justificação e referência da escrita. Poema enquanto objecto lapidado. A edição vai ser inovadora e fora do formato, já que divido o livro com o pintor cabo-verdiano Tchalé Figueira e será um livro de mesa, com um dvd com declamações do dramaturgo João Branco e peças para uma opereta com dançarinos a coreografarem a palavra e não a música. A música ulterior, se quisermos. Outro projecto será «Conchas de Noé & Arcas Ostras (Cantos, contos e causos)». É edição brasileira e aponta-se para Maio.

ANTÓNIO FABIANO: Poderia nos dar o prazer de um dos seus poemas?

**FILINTO ELÍSIO**

f_ado

negro corpo
e o des_tino

chora-se fado
e o s_ado corre

tudo é rio
U de tudo

um dia
por me_lodia

vasculha-se-lhe
exis_tindo

ouro preto
re_nasce em nie_mayer…


Filinto Elísio
in: Me_xendo no Baú
(inédito)

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FILINTO ELÍSIO a ANTÓNIO FABIANO
Dezembro de 2010
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
E-mail: seridoano@gmail.com

(Por deferência manteve-se aqui a ortografia do português de Cabo Verde).