terça-feira, 17 de novembro de 2015

MANUSCRITADO...


Fac-símile publicado na revista da Academia Brasileira de Letras.
Revista Brasileira - Fase VIII - Julho-Agosto-Setembro 2015 - Ano IV - Nº 84 


O CORPO

O corpo nasce
E se expande
Em sua natureza física
E psíquica.
Pelas ruas de suas veias
Trafegam carros de sangue.
Nos pés põe meias.
O corpo ama
E brinca de se esconder.
Veste-se de beleza
E despe-se
Com igual destreza.
Finge que é eterno
– e talvez seja.
Deitado
Dorme e sonha
O que deseja. 

quinta-feira, 12 de novembro de 2015

O GADO RUMINA... O VAQUEIRO RUMINA...

ABOIO

Na hora crepuscular
do retorno,
quando o tangedor
nos encaminha
para o resguardo
de mais uma noite
que se avizinha,
seu aboio plangente
nos conduz numa espécie
de levitação.

E ao identificarmos
nosso nome
pronunciado na
melódica e arrastada
condução,
somos tomados
por um sentimento
que transpõe
a estremeção.


CONTRASTE

Festa no alpendre
dança e alegria
colóquio e cantoria.

Bebidas, aluares e refrescos,
leitãozinho e frango assados.

Em meio a tanta algaravia,
olho para o estábulo
e tudo é calmaria...


David de Medeiros Leite
In: RUMINAR (2015)
Sarau das Letras Editora Ltda.

quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Olívia e o Oceano | Wescley J Gama | Campos Grandes Reunidos



Clipe feito com trecho do filme "Vidas Secas" (1963), de Nelson Pereira dos Santos. Composição: Wescley J. Gama e Iara Maria Carvalho. Músicos: Alan Kleiber (bateria); Tiago Felipe (guitarra solo); Wescley (violão de aço e voz); Márcio Pinheiro (baixo); Saulo (teclados, guitarra Lap Steel). Disco "Campos Grandes Reunidos" (2016).

Olívia e o oceano
ao seu sono fluvial retorna
uma sereia desativada
para peixes e homens

segunda-feira, 5 de outubro de 2015

SARAIVADA: poesia de Iara Maria Carvalho

Capa: João Antônio de Medeiros Neto

Quem resistirá à sedução, ao canto e encanto desta poesia de Iara Maria Carvalho? A mão que a escreve é resoluta. Ou, talvez, devamos dizer: a voz que aí canta sabe o que canta e como cantar. Iara, esta pessoa linda, encanta pela afinação de sua lírica; seduz, porque toda poesia verdadeira traz em seu bojo uma irresistível sedução. Que voem os mundos, a beleza triunfa nesta obra, ainda quando o poema é dor e dói até transfigurar! Eis uma mulher desfeita em versos, a brindar-nos com seu timbre afiado, a fazer vibrar as cordas de seu poderoso instrumento com o que há de melhor. Afinadíssima está Iara. Erótica, selvática, santa... Não é apenas a “ursa bipolar” que aí urra, é uma mulher infinita, ou todas as mulheres que cabem dentro de uma só e revela-se mistério, para nosso enlevo e perplexidade. É a graça de Maria, a cultuada milenar teimosia do carvalho, o que espoca nestes versos. Ninguém mais que Iara merece o nome que tem, do começo ao fim. Parece-me ser este o seu mais belo livro, de todas as coisas inéditas e publicadas que dela eu li, em quase duas décadas de amizade e interlocução literária.

Antonio Fabiano 
[texto publicado no livro]


URSA BIPOLAR

já fui mais intensa
mais humana
nem saudade tenho de ser aquela outra
que pulula nas lembranças.

– hiberno porque ouso –
nem todos entendem a beleza de ocultar-se
e saber-se desaparecida
entre os moídos do dia
e as coisas miúdas das gentes.

um dia,
tive um sonho de escrever,
mas os oceanos me roubaram o ócio e o desejo
e, mesmo que meus ainda fossem,
eu só estaria viva pra contar
que está vazia metade do meu coração
e, a metade cheia que dizem me caber,
desconheço:

embora, mesmo sem querer,
procure.

Iara Maria Carvalho
Saraivada, Sarau das Letras, 2015.



Foto Divulgação