segunda-feira, 26 de setembro de 2011

O QUE GRITAM AS CIGARRAS?

A obsessão de Jerônimo pelas cigarras voltou. Na verdade, sempre volta, quando elas, as cigarras, voltam. Todo ano é a mesma cantilena, por semanas. Até de madrugada! Eu não tiro as razões de Jerônimo, nem seu direito de estar obcecado por estas criaturinhas de almas lúdicas.
É que nesta época as cigarras – como leite entornado sobre o livro das lamentações e em frenética loucura de viver tão desesperadamente – gritam convulsas, inconsoláveis, talvez pelo amor que perderam no último verão e agora de novo o buscam.
Berram quais adolescentes histéricas, soluçam o infinito, como se alguém do mal tivesse roubado suas lindas asas transparentes – as famigeradas translúcidas!
Cigarras são seres assombrados. Elas gritam atônitas e mais que isso: caaantam... dentro e fora de Jerônimo. Jerônimo está atônito também (ele não consegue disfarçar o seu ouvi-las!). Jerônimo é um homem de vida interior. Mas se você, leitor, estivesse obrigado a horas de silêncio por dia, ouvindo centenas – talvez milhares – de cigarras nas árvores do seu convento, você enlouqueceria ou procuraria entender o que elas dizem. Jerônimo não enlouqueceu. Ele descobriu o que gritam as cigarras quando cantam, cantam, cantam sem parar, dentro e fora dele. Ele as escutou e ficou tão contente e finalmente pôde meditar!...

Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 26 de setembro de 2011.
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
E-mail: seridoano@gmail.com
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Para Everaldo

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