segunda-feira, 27 de setembro de 2010

PARA QUE SERVEM OS POLÍTICOS?

Ando desconfiado de uma coisa: políticos são seres encantados, criaturas diretamente saídas de um conto maravilhoso! Amo políticos. Você pode até dizer: são como bruxas, yo no creo... pero que las hay, las hay! Hay? Ai! É que eles aparecem e desaparecem como os super-heróis japoneses daqueles filmes antigos, que víamos com encantamento, mas hoje nos arrancam gargalhadas por seus precários efeitos especiais. Exceção para o faCto: entre ninjas e políticos, estes não são normalmente os “mocinhos”, e suas entradas e saídas não são tão performáticas, ainda que nos façam gargalhar pra não chorar.
Eles, os políticos, misturam ficção com realidade e fazem essa coisa incrível que vemos de anos em anos. Se estiverem na mira de espectadores, agirão como santos, sem a discrição dos santos, obviamente. E quando ninguém os vê, bem, aí é outra história... Câmeras escondidas nos atestam coisas... Eu não vou dizer. Vocês lêem/vêem jornais. Sim?
Alguns políticos chegam a supor, em tempos de eleição, que estamos no país das maravilhas, ou logo entraremos nele... Somos Alice! Políticos são quase “messiânicos”, ou mais que isso. Nem El-Rei Dom Sebastião quis tanto! Não sei se o protótipo de messias que temos no inconsciente ousaria tanto quanto alguns desses políticos! Eles ousam mais, eu acho. Porque o meu Messias (crido Deus) já veio, pretendeu bem menos nessa esfera, e nem de longe resolveu tudo!
Agora que as eleições estão prestes a acontecer, eles, os políticos, “pirlimpimpim”... desaparecerão! Nada de sorrisos (pra lá de artificiais), apertos de mão calorosos, extremado amor aos pobres, visitas às periferias, cafezinhos nos botecos, promessas, promessas, promessas... Desse espetáculo cíclico, o que aprenderemos? Que daqui a quatro anos seremos outra vez imbecilizados? Que nunca nos respeitarão? Que só querem nosso voto e nada mais?
Sim, políticos hay. O que não hay é defasagem na educação, escolas em péssimas condições, hospitais em estado de calamidade, negligência explícita em vários setores públicos etc. Graças a Deus políticos hay, para que essas coisas não hayam, e receio que os melhores do mundo, os mais eficientes, estejam em meu país. O que não hay: miséria, fome, violência, corrupção. Ai! Não, corrupção não hay mesmo! Tudo isso é ficção, coisa dum cinema nacional pessimista e apelativo! A minha pátria é bela, como só ela! Nem paralela, é bela, quase paranormal! Coisas ruins, claro, não hay! Mas se não hay, se tudo está perfeito, para que servem os políticos?
Quase me inclinei a pensar hoje cedo – pequei, Senhor! – que (não, não vou dizer... vou dizer...) nossa democracia é uma farsa! Exagerei. Peço perdão! Porque pensei (mal) que o povo é refém de corsários, e eu não gosto dos que ultrajam o povo! Seja na política, seja na religião ou no que for. É que políticos me deixam tonto, com seus discursos. Eles tentam me convencer do que dizem. Mas, o que dizem? No dia em que eu os entender, eu morro! Eu sei que eu morro! Preciso voltar pra escola e aprender tudo de novo! Sou tão burro! Nem português a gente sabemos direito! Eu não entendo o que eles dizem, e dizem que eles não dizem nada! Aí me sinto culpado, por não entender sequer o nada que eles dizem!
O melhor dos ficcionistas sentiria inveja, se reparasse bem, sentiria inveja do traquejo desses que tudo podem com um microfone na mão. A outra (mão) deve estar bem ocupada! A língua que eles, os politikói, falam é coisa que nenhum poeta alcançou! Eu os invejo, vem talvez daí o meu despeito! Acho que me insultam, mas eu não entendo. Cospem na minha pequena inteligência, e eu entendo menos ainda. Subestimam minha vontade às vezes boa, às vezes ruim. Dizem o que eu sei desdito desde o primeiro instante. Coisa que nem Deus pôde, eles podem... Que inveja Deus deve sentir dessas criaturinhas! Seus olhos piedosos, enquanto discursam, não me convencem mais. Acho que perdi a fé neles. Tirando um ou outro “bonzinho”, que los hay eu sei que hay si hay, tirando estes, a grande maioria se declara, por pensamentos e palavras, atos e omissões, grandissíssimos filhos da pátria, a que os pariu para a América nacional. Eu ia dizer “merda”, mas por pudor me contive. Como seguir acreditando, se eu quero viver cem anos, mas aos 31 já tenho a memória carregada de frustrações políticas? Eu até tento crer, mas os jornais todos os dias me mostram fichas sujas e mais que tudo, o que eu não queria ler, aquela palavra horrível e tão frequente no cenário nacional: CORRUPÇÃO. Mas esta não hay, deve ser intriga da oposição. O que hay são políticos, políticos hay...
Mesmo sem fé, alguma esperança me acompanhará e a cada patrício, semana que vem, na importante visita à caixinha eletrônica, mágica, das votações... Votemos!

Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 27 de setembro de 2010.
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
E-mail: seridoano@gmail.com

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

ADÉLIA PRADO, IGUAL A ELA MESMA.


Adélia Prado em imagem do Programa Sempre um Papo disponível na Web

ADÉLIA PRADO nasceu em Divinópolis - MG, em 13 de dezembro de 1935. Filha do ferroviário João do Prado Filho e de Ana Clotilde Corrêa. Perdeu a mãe em 1950 e, a partir de então, escreveu versos. Fez o curso de Magistério, de 1951 a 1953, dando aulas logo em seguida. Em 1958 casou-se com José Assunção de Freitas. Na década de 1960 começou a estudar filosofia, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Divinópolis. Em 1972 perdeu o pai. Formou-se em 1973. Por essa época enviou originais dos seus poemas a Affonso Romano de Sant’Anna, que os fez chegar ao poeta Carlos Drummond de Andrade. Este último, por sua vez, os recebeu com grande entusiasmo e reclamou urgente publicação. O resultado dessa ventura é a grande obra inaugural de Adélia, “Bagagem” (1976), que começa com estes versos de impacto:

COM LICENÇA POÉTICA

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.

Lança-se Adélia Prado, madura, já mãe de cinco filhos e consciente do fazer poético. “Não sou matrona, mãe dos Gracos, Cornélia, / sou é mulher do povo, mãe de filhos, Adélia.” (Bagagem, ‘Grande desejo’). O livro “Bagagem” foi publicado no Rio de Janeiro, e em seu lançamento estiveram presentes, dentre outras pessoas, Antônio Houaiss, Carlos Drummond de Andrade, Clarice Lispector, Raquel Jardim, Nélida Piñon, Juscelino Kubitscheck, Affonso Romano de Sant'Anna, Alphonsus de Guimaraens Filho.
Em 1978 lançou “O coração disparado”, ganhador do Prêmio Jabuti de melhor livro de poesia. Não parou mais de escrever, poesia e prosa. Outros livros de POESIA: “Terra de Santa Cruz” (1981). “O pelicano” (1987). “A faca no peito” (1988). “Poesia reunida” (1991). “Oráculos de maio” (1999). “A duração do dia” (2010). Em PROSA: “Solte os cachorros” (1979). “Cacos para um vitral” (1980). “Os componentes da banda” (1984). “O homem da mão seca” (1994). Manuscritos de Felipa (1999). “Prosa reunida” (1999). “Filandras” (2001). “Quero minha mãe” (2005). “Quando eu era pequena” [infantil] (2006). Os livros de Adélia Prado estão sendo agora editados ou reeditados pela Record. Alguns de seus trabalhos foram traduzidos para outras línguas, além de seu nome constar em várias antologias. O espetáculo “Dona doida: um interlúdio”, baseado em textos de Adélia Prado, foi encenado por Fernanda Montenegro, com grande sucesso no Brasil e no exterior, em 1987. Em 2000, Adélia gravou “O tom de Adélia Prado”, CD no qual recita poemas de “Oráculos de maio”. Em 2003, “O sempre amor”. Ambos pelo selo Karmim.
Profundamente religiosa (cristã católica), sua poesia é marcada pelo sagrado. Deus é personagem maioral em sua obra. Mas equivoca-se quem pensa que esta é panfleto de ideologias ou via de proselitismo à fé que a autora em nível pessoal professa convictamente. Leituras pouco profundas, nesse sentido, foram feitas até por bons críticos, mas são por si mesmas insustentáveis.
Também o cotidiano adquire relevância em sua criação: “Eu só tenho o cotidiano e meu sentimento dele. Não sei de alguém que tenha mais.”, diz com frequência. Antes de ressurgir com o livro “O homem da mão seca” (1994), Adélia passou por um difícil tempo de “desolação”, um longo silêncio, período em que ficou sem publicar nada: “você quer, mas não pode. Contudo, a poesia é maior que o poeta, e, quando ela vem, se você não a recebe, este segundo inferno é maior que o primeiro, o da aridez.”
Críticas, toda pessoa importante as sofre, tão mais quanto seja exposta às vistas alheias no muito grande que faz. Há quem não entenda que alguns fazem a arte que podem, outros a que querem, porque podem e sobra talento. Adélia pertence a este grupo de abastados. Delineou cedo seu rumo poético, muniu-se de bagagem própria (não alheia), é coerente naquilo que faz e não desvirtuou sua opção para agradar a quem quer que fosse. É precário dizer que ela se fez “refém” das influências primeiras que jamais negou. Drummond? Guimarães Rosa? Quem dentre vós (maiores e melhores do meu país) nunca tiver devido algo a eles, que atire a primeira pedra! Mas, antes de tudo e como eles, Adélia é mineira! Nasceu sabida dessa “mineirice” inimitável. Ela só é igual a ela mesma. Reside talvez aí a dificuldade de enquadrá-la no cânon previsível de qualquer das escrituras cristalizadas. E isso é insuportável para alguns que não sabem o que fazer com a poesia desta mulher. Se avexem não, nós não críticos sabemos! (Antonio Fabiano)

[Algumas informações biográfica e as "falas" da autora foram coletadas dos seus livros editados pela Record].

Antonio Fabiano
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E-mail: seridoano@gmail.com

“A DURAÇÃO DO DIA” (2010) – ADÉLIA PRADO.


Adélia Prado (Foto Divulgação)

“Sem avisos se mostra / a duração perfeita, / forma que de si mesma se acrescenta / e na mesma medida permanece.” (O vivente, p. 81).

“A duração do dia” (2010) é o mais recente livro de versos de Adélia Prado. Uma boa surpresa! Pelo título somos imediatamente levados a crer que, como nas obras anteriores, aí também se privilegiará a temática do cotidiano. E é o que acontece. Ao lado disso vem com acentuada força o seu outro bordão predileto, de teor religioso: a experiência de Deus. Esta, em “A duração do dia”, parece dramaticamente intensificar-se. É curioso o sofrível latente, na gozosa relação entre Deus e sua criatura (amada). O livro é dividido em grupos de poemas que se separam por citações em sua maioria bíblicas. Tais blocos não possuem títulos como nos livros anteriores. É uno o dia, transcorre ininterrupto. Letras santas ou falas norteiam-no, sutilmente, sem qualquer ruptura ou ideia de capitulação.
O poema de abertura já nos coloca diante de um “eu” que se esconde “no porão / para melhor aproveitar o dia”, “pra rezar, / agradecer a Deus este conforto gigante.” (Tão bom aqui, p. 9). O enfoque recai sobre o mínimo: “Eu só quero saber do microcosmo, / o de tanta realidade que nem há. / Na partícula visível de poeira / em onda invisível dança a luz.” (idem). Este paralelo “visível - invisível” atravessará “A duração do dia”, é um problema de fundo e moção na obra. Não se busca no entanto uma solução, frui-se o problema. Nisto, de fato, vemos que, se a predileção recai sobre o pequeno (mínimo), este é paradoxalmente potência motora do “dia” e tem matiz evangélico: “minha fortaleza é a da mostarda. / Um grão.” (O noviço e a abstinência de preceito, p. 44).
No primeiro momento desta obra, “As matemáticas suplantam as teologias / com enorme lucro para minha fé.” (Uma janela e sua serventia, p. 10). Ou, “Como oráculos bíblicos, / os paradoxos da física me confortam.” (Pensamentos à janela, p. 19). Visão romanesca da ciência quântica. Alternam-se luzes e lágrimas, reminiscências nostálgicas ou muito boas da explicitada mulher, a sombra de Deus aterradora e aprazível, as contradições do amor. Este livro não se exime de trazer-nos sobejados ecos de outros tantos da autora, diga-se de passagem. Tudo, porém, revestido de uma “coisa” nova (original), certo entretom em sua voz poética, algo sutilizado na maioria dos versos, mas bem perceptível ao leitor iniciado de Adélia Prado. Pode causar algum estranhamento, isso, mas é bom.
“Deus há! E pode que haja o diabo, / o que não tem é morte.” (Como um parente meu, um Riobaldo, p. 17). A presença da morte, pela sua aproximação ou memória dos que já se foram (ancestrais revivem), é reincidente no conjunto desta obra, mas nem de longe tem aí seu triunfo. Exceto em fala irônica (cf. Rua do Comércio, p. 48) ou de tentação (cf. Anjo mau, p. 71). A morte é “a que não existe.” (Epigráfico, p. 33). Ou, “Só morrem os muito velhinhos / que pedem pra descansar.” (Aqui, tão longe, p. 21). Ela é uma insistente sombra no “dia”, sem dúvida, mas tanto como o tempo é relativizada: “não se tem certeza de que vamos morrer, / (...) / São os relógios / o mais obsoleto dos inventos.” (Dádivas, p. 42). Todo o mais é cotidiano poetizado, metamorfoseado pelo maravilhoso de uma “memória dourada” que traz “mentira meio existida, / verdade meio inventada.” (Aqui, tão longe, p. 21). Não importa se faz noite neste “dia” de Adélia Prado: “Estrelas na escuridão são ícones potentes.” (Pensamentos à janela, p. 19). Importa “que amanhã seja outro dia, / igual a este dia, igual, / igual a este dia, igual.” (Aqui, tão longe, p. 22).
No livro aparece ainda o drama em palavras da palavra que não (?) acontece. Em face da luz eterna “Quis dizê-la e não pude, / ingurgitada de palavras / minha língua se confundia. / (...) / Aquiesci gozosa, / a língua muda, / a folha branca, / a mão pousada” [o poema “termina” sem ponto final] (Divinópolis, p. 13-14). Esse drama é a luta da “escrivã” (poeta) pelo sentido mais profundo das coisas. “A beleza transfixa, / as palavras cansam porque não alcançam, / e preciso de muitas pra dizer uma só.” (A escrivã na cozinha, p. 25). Sabe-se desde sempre que “as palavras são dúbias” (O clérigo, p. 50). Luta-se com elas, como Jacó lutou com Deus (se me permitem essa imagem bíblica). Diz-se: “Perdi a conta das vezes / que retomei esta escritura / sem avançar de sítios pantanosos, / (...) / Foi ontem e já tem cem anos, / faz um minuto só, / foi agora e foi nunca, / jamais aconteceu, / não há, não houve,” porque, para além de brincar com a atemporalidade das melhores letras, no “dia” de Adélia Prado “o que não tem palavras não existe.” (Nem parece amor, p. 92). Note-se ainda o problema da palavra, complexificado, em “(...) língua / para todas as línguas traduzível / sem prejuízo” (cf. Querido louco, p. 93).
Se nos deparamos com certa insuficiência das línguas ante o inefável, é natural que até as matemáticas do primeiro momento não mais possam dar conta do milagre em evolução: “Neurônios não explicam nada.” (A escrivã na cozinha, p. 25). E o que dizer de versos como estes: “Como o cão, minha língua ladrava / à aterradora beleza.” (Constelação, p. 87)? O drama da palavra, em face do indizível, é vivido em modulações de gozosa agonia, como todo o mais deste “dia”. Tal ira aplaca-se, no entanto: “E só Vos dei palavras, ó Deus santo. / Quando achei que exigíeis / cabeças sanguinolentas, / um punhado de versos aplacou-nos.” (O penitente, p. 65). A conclusão não poderia ser outra: “Toda compreensão é poesia, / clarão inaugural que névoa densa / faz parecer velados diamantes.” (Esplendores, p. 88). Sobrevive-se.
O sofrimento é também lugar comum no “dia” duradouro deste livro: “Avia-te para sofrer – conselho pra distraídos –, / cristãos já sabem ao nascer / que este vale é de lágrimas.” (A escrivã na cozinha, p. 26). Esta agonia – sempre gozosa – de ser ou existir no mundo é, inclusive, partilhada por solidário Deus. O sofrimento não parece ser anômalo ao “dia” adeliano, é parte de seu mistério. Como o medo: “Ter medo é saber do inaudito, / ninguém até hoje explica / por que batem as pálpebras.” (Epigráfico, p. 33). Em todo o contraste vivido na obra, confessa-se sem pejo: “estou feliz e dói.” (Olhos, p. 29). Dói, mas nunca em sentido totalmente negativo. Dói dor saudável e previsível, como a dor de um parto.
É, pois, a consciência ou suspeição de um “plus” divino, o que dinamiza esta obra, movimentando personagens e demais coisas. Isso transubstancia toda a realidade habitual, deifica o mundo das rotinas e chega, com similar naturalidade ou estático espanto, aos sacrários e às cozinhas da existência humana. Igual.
O mundo com todos os seus desvãos é a passarela basilar das múltiplas formas de “cotidianização” deste “eu” lírico, na obra de Adélia Prado. Inclusive o divino é “cotidianizado”. Assim, Deus muitas vezes é feito à imagem e semelhança do homem, ou talvez devamos admitir que o humano é mesmo divino e feito de Deus. As duas leituras são possíveis na obra, não há aí qualquer incompatibilidade. Não obstante alguma coisa, este mundo/tudo (em seu viés original) é assentido: “que bom estar no mundo / a esta hora do dia! / De maneira perfeita tudo é bom” (Dádivas, p. 42).
No “dia” põe-se então holofotes sobre o que já está aí. Nada de grande se inventa, maravilha-se do que há. É a trama das coisas que se enfoca, quase sempre a partir da ótica da mulher, seja a perspectiva feminina ou virilizada. Esse mundo é, portanto, palco da ação de Deus (às vezes “deus”), que se apresenta ora amoroso, terno, ora terrível em seu poder e rigor antigos. Aqui a experiência de Deus é a experiência do sentido radical da existência/vida, sem qualquer divórcio entre sagrado e profano. Se o Deus da obra é onipotente em suas epifanias, cuja glória até chega a doer, ele também é um Deus carente: “É Ele, Deus, quem me dói pedindo amor / como se fora eu Sua mãe e O rejeitasse.” (Consanguíneos, p. 99). Há aí sobejante cumplicidade: “Jungidos como estamos em formidável parelha, / enquanto Ele não dorme eu não descanso.” (idem).
O corpo tem neste livro a mesma visibilidade nunca preterida na vasta obra adeliana: “Este é meu corpo, / corpo que me foi dado / para Deus saciar sua natureza onívora. / Tomai e comei sem medo, / na fímbria do amor mais tosco / meu pobre corpo / é feito corpo de Deus.” (A necessidade do corpo, p. 28). Dir-se-ia, em jargão tomista, que este corpo é transubstanciado, torna-se corpo de Deus, hóstia viva (não por acaso aí também figuram as palavras evangélicas da ceia eucarística, ditas em cada missa: “tomai e comei”). O corpo é sacralizado pela presença/ação de Deus. A carne (visível) dá sentido ao mais sagrado (invisível), e o que não alcança isso é vão: “Contra o que se sente / toda filosofia é mesmo vã, / o livro é sagrado / quando o que apregoa / é revelado na carne” (Epigráfico, p. 33). A carne não é prescindida pelo esplendor epifânico. O ápice deste é, mais que tudo, encarnação!
“A duração do dia” sugere ainda reclusão: fala-se a partir do porão, de dentro da casa, de dentro de si, de trás das vidraças, das não poucas janelas etc. Porém nunca se insinua aprisionamento, tudo se reveste de serenidade e até resignações heróicas. Quando há sentimento diverso, este participa do que chamei de “agônico gozoso”. É o bom multifacetado nas contradições de um mesmo “dia”.
A condição humana é exposta de modo desconcertante em toda a obra de Adélia Prado. A grande extensão do mistério humano se mostra em dramático teor psicológico igualmente profundo aqui. Bastam estes versos para ilustrar o que se diz: “Quem me dera os lobos fossem fora de mim, / bastava um pau e os afugentaria. / Mas seus fantasmas é que uivam inalcançáveis.” (Alcateia, p. 73). Dentro. E fundo.
Alvíssaras chegam na hora boa. Neste livro como em outros da autora, a misericórdia se mostrará intacta e a salvação vaza para todos os lados, ainda que custe a suspensão do “dia” no sono do Cordeiro/pastor e esquecimento dos pecados: “A salvação, mais que viável, / é certa para santos e réprobos.” (A suspensão do dia, 78).
Pode não agradar a todos (o que é normal), mas este é um livro maduro, bom, de quem está muito segura do que faz e sabe o que quer. Alguns de seus poemas erigem-se tão acima da média, que podem figurar em qualquer antologia. Adélia escreveu a poesia dela (nossa), como ela mesma (a poesia) pediu para ser escrita. Sem artifícios. Sem enfeites. Só poesia. Nuinha. Três versos do mesmo livro, aplicados aqui a nosso propósito, serviriam para sintetizar em clímax “A duração do dia”: “a lâmpada de repente partindo-se / com estrondo e multiplicado clarão, / tudo sequencial, tudo no mesmo dia!” (Credo, p. 31).
Dancemos com essa luz. Amém.

(Bibliografia das citações: PRADO, Adélia. “A duração do dia”. Rio de Janeiro: Record, 2010.)

Antonio Fabiano
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ADÉLIA PRADO EM ENTREVISTA A ANTONIO FABIANO


Adélia Prado - Fotografia de Antonio Fabiano

ANTONIO FABIANO: Quando li aqueles versos do seu novo livro – “Minha mãe a minutos da morte me ordenou profética: / ‘Vai calçar um trem, / agora mesmo a casa enche de gente’” – fui tomado por um sentimento tal de urgência e ressurreição. Naquela noite me senti como uma represa que, depois de um imenso estampido, estoura e se derrama pelos mundos... Sua palavra poética tem inimaginável força. É neste espírito que começo a entrevista...

(silêncio)

Adélia, o seu legado poético é indisfarçável. Sua obra tornou-se adulta, autônoma, parece não mais precisar de nada. Explico-me... Sua voz – para além de você mesma, a poeta – já é dona de si e pode ir sozinha aos confins do mundo. É como a grande profecia do profeta, que cresce e sobrepuja o seu arauto, sendo inclusive esta a glória do arauto. O tom de Adélia já possui, a meu ver, aquela afinação inconfundível dos bons poetas, dos poetas maduros que podem tudo e já não devem nada a ninguém... Destes anos todos de poesia, como você vê seu próprio itinerário? Como você se vê diante do estarrecedor milagre dessa obra?

ADÉLIA PRADO: Toda vida ‘soube’ que a poesia é maior que o poeta. Crer nisso me descansa. A poesia é mesmo um milagre, epifania, algo terrível na sua beleza que de repente se mostra. Czeslaw Milosz falou disso e usei seus versos como epígrafe geral do livro. Como me sinto? Pequena e imensamente feliz, sou o ‘pobre de blusa nova ganhada’.

ANTONIO FABIANO: Dizem que escrever é muito perigoso. Você concorda com isso? Em sua relação com a palavra, já experimentou alguma vez o fracasso? Se sim, como o transpôs?

ADÉLIA PRADO: É muito perigo se você frauda o trabalho colocando-o a serviço de ideologias, doutrinas filosóficas ou religiosas, quando visa resultados, porque arte é “expressão pura”. Engajá-la é crime de lesa poesia. É perigoso porque conspurca sua natureza, que obedece a leis mais altas que as do seu desejo. Fracassar é não conseguir dizer. Quando acontece, para-se e espera-se que a forma se mostre de maneira perfeita. Uma vez publiquei em um livro uns três poemas, que refiz em nova edição, por causa de uma advertência crítica que acolhi. Uma pedrada no meu orgulho, mas foi ótimo também. Percebi que havia versos sobrando e a poesia não tolera excessos. Pequei por entusiasmo, mas pequei.

ANTONIO FABIANO: Alguns escritores são lidos e respeitados, o que já é muito. Você, além disso, é amada e conta com uma legião de interlocutores que gostam da sua palavra e pessoa, a mulher. O que digo não acontece apenas aqui em Minas, onde os nomes de Adélia Prado e Deus se confundem (risos), mas constato a mesma dileção, o mesmo respeito, em quase todo lugar aonde tenho ido. A que você atribui esse fascínio que exerce, mesmo sem querer, sobre tantas pessoas de boa vontade? E como lida com isso?

ADÉLIA PRADO: Bom, pessoas de boa vontade são para isso mesmo. Para amar tudo, inclusive essa senhora mineira. Espero que não por condescendência – o que não seria amor – mas por causa da poesia, ela sim, de natureza amorosa, fraterna, que a nada e a ninguém exclui, provocando em nós a alegria da comunhão humana. Lido com isso dando graças.

ANTONIO FABIANO: Seu público é eclético, vai de intelectuais de peso a pessoas sem tais pretensões e até analfabetas. Estas e aqueles captam sua poesia sem embargos, relacionam-se com ela da veneração religiosa à crítica mais mordaz. Você é lida na academia e nas cozinhas do povo, concomitância esta que é impressionante e muito rara. Qual o segredo dessa fluência, tão ambicionada pela maioria dos escritores e alcançada, mesmo dentre os melhores, por pouquíssimos?

ADÉLIA PRADO: O segredo só pode estar na poesia. Tenho certeza.

ANTONIO FABIANO: Uma pergunta inevitável... Como se dá a relação de sua obra literária com a mística cristã? Sua espiritualidade pessoal interfere na obra, ou a obra é antes geradora dessa vivência religiosa que nos testemunha?

ADÉLIA PRADO: A arte (a poesia) é religiosa na sua natureza íntima e não por causa do tema, do enredo, da casuística. Não é porque falo em Deus, em religião, ou devoções que um poema é religioso, mas por causa da forma, que não é formato, mas a própria beleza, escopo de toda arte. Experimentar a forma, a beleza é experimentar um centro de significação e sentido que alegra, consola e nos aponta para algo (acredito que Deus), a pessoa divina que nos fala através da obra, coisas como: a vida é eterna, ressurgiremos, a beleza de agora é apenas sinal, pegada da verdadeira beleza, a que nos aguarda ao final de nossa vida. A mística e as obras dos místicos são experiências poéticas e portanto religiosas. Os salmos são poesia. Um poema falando de um homem no seu cavalo ou de ondas do mar pode levar-nos a um sentimento de reverência diante do mistério e isso é religioso.

ANTONIO FABIANO: “Oráculos de Maio” (1999) pareceu-me, desde o advento de sua grande e imbatível “Bagagem” (1976), a obra mais perfeita de todo o conjunto poético. Já lhe disse isso. A crítica mais autorizada não deu, a meu ver, a devida atenção a esse acontecimento que o tempo, sem dúvida, reclamará a lhe [à obra] fazer justiça. Agora nos vem “A Duração do Dia” (2010), a confirmar o passo firme dessa trajetória. A recepção tem sido boa... Em sua opinião de leitora daquilo que escreve, já não tanto como autora ou “mãe” da obra, este livro traz surpresas ou é apenas mais do mesmo velho bom vinho?

ADÉLIA PRADO: Cada autor só tem uma coisa a dizer. É sempre o mesmo mas, a cada vez de um lugar diferente. As paixões boas e más permanecem conosco e serão expressas de maneira mais jovem, mais madura, mais experiente, segundo a vivência do autor naquele momento. Fico pensando num quadro feito por um pintor em décadas, dos dez aos oitenta anos. Será o mesmo vinho e conforme se acredita, melhor.

ANTONIO FABIANO: Uma vez você me disse que “Bagagem” é o livro primevo (eu diria, perfeito) que a sua pena tenta reescrever toda vez que trabalha numa nova obra... Ainda pensa assim? É o que pensa também em relação a “A Duração do Dia”?

ADÉLIA PRADO: Se me lembro bem, disse que todo livro quero escrevê-lo como escrevi Bagagem, numa alegria de descoberta e fundação. Todo poeta sabe disso, porque uma das qualidades da poesia é a sua incorrigível juventude. Não intentei isto com o novo livro, não é preciso, acontece necessariamente e, quando não acontece, não publico, a não ser que me equivoque.

ANTONIO FABIANO: Eu sou mendigo e você é pródiga... (risos) Que verso me daria dos seus muitos, neste momento, para que eu o partilhasse – nunca avaro – com os amigos e leitores do meu Blog?

ADÉLIA PRADO:

NO CÉU

No céu, os militantes,
os padecentes
e os triunfantes
seremos só amantes.

Este é um poema de Oráculos de Maio.

Meu caro Antonio Fabiano, respondi com muito gosto a suas perguntas, que achei muito pertinentes. Foi uma alegria e você é muito gentil. Obrigada por suas boas palavras...



ADÉLIA PRADO & ANTONIO FABIANO
Setembro de 2010
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
E-mail: seridoano@gmail.com

LITURGIA DAS CIGARRAS

Tenho bastantes fantasias
Para provar-me humano
E escandalosamente
Poeta.

Já quis recitar aos berros
Quase histericamente afobado
Um poema de Bandeira
Que diz
Eu quero a Estrela da Manhã!...

Ah, isso foi há muito tempo!
Eu decantei tal paixão
Não dei vexame
(comedido demais que sou)
Nem hei de fazê-lo, agora, depois de frade
Num convento onde silêncio é tudo!

Mas sou um homem de fraquezas.
Por isso à boca da noite
(esta que vai nos engolir)
Quando estou sozinho em minha cela
E as cigarras começam a cantar
Nas árvores lá fora
Eu abro solenemente um livro
Bagagem
E recito com mãos trêmulas
Certo módulo de verão.

Tudo faz sentido depois disso!

Eu, que antes odiava com ódio mortal as cigarras,
Passo a amá-las generosamente
E chego a pensar
Que Deus criou esses insetos tolos
Que cantam até estourar
Só para que se escrevesse um poema
E eu me saciasse em tal mistério
Na crueza de secretos versos
Em dias quentes como este
De propagação de som no espaço
E calor de fogo no espírito!...

Isso mais do que estranho é sublime!
Faz valer à pena toda a vida!...
De tal modo o é
Que culmino assim minhas Vésperas
Dentro de alta noite...

Antonio Fabiano
Direitos reservados

PS: Aproveito para trazer à baila este poema antigo, dedicado a Adélia Prado.

AMOR É ESCOLHA...

Escrevo pra mim, não pra você. Lição não dou pra ninguém. Amor é escolha, decisão, resolução de fortes. Não se reduz a um sentimento edificante, nem à reciprocidade dos que se afinam. Vê nossos velhos pais? Amam-se, mas não como os adolescentes apaixonados que foram um dia. Amam-se no ceder, na renúncia, na confiança que depositam nessas coisas duradouras... Apostar no que dura pra sempre é difícil! Pagamos um preço bem alto, pelo que não se acaba com o tempo. Mas que graça teria a vida se tudo fosse fácil e barato? Quer ver? Podemos agir por impulso, mover-nos só pela empatia, estar com quem diz o que queremos ouvir, acreditar que são nossos amigos aqueles que não nos perturbam, não nos questionam, não nos aborrecem... É fácil ir a qualquer lugar com pessoas fáceis. Mas pessoas fáceis geralmente são fúteis. O fútil dura só um momento, não deixa marca em nós que valha a pena. Difícil é conter em nossa atmosfera pessoas que nos amam tempestivamente. Que nos amam! Pessoas que vão fundo. Pessoas que bagunçam nossa vida, mas nos querem bem. Pessoas que nem sempre são a nosso modo agradáveis, mas nos adoram de verdade. Pessoas que se importam conosco em longo prazo, que não pensam só no imediato, no riso barato de agora, no fluxo fácil do rio que evapora-se e não leva a mar algum. Quer saber?: qualquer relação é mesmo escolha. Não importa o que aconteça, você escolheu e pronto! O amor patológico murcha. O da escolha, enquanto houver a resolução, não. O tempo dirá quem está do nosso lado, o que é verdadeiro ou falso, o que fica e o que passa. Há coisas e pessoas que passam por nossa vida e não acrescentam nada. Há, por outro lado, quem tenha vindo pra ficar, fazendo a enorme diferença. De fato uma só coisa é necessária... Mas só nós – e ninguém mais por nós – podemos escolher a melhor parte!... Muitas relações não duram porque as pessoas se escolhem por conveniência, afinidades pueris, coisas transitórias, comodidades afetivas, inseguranças, vícios. Porém, aqueles vínculos que se dão na paciência de um agricultor, que lança suas sementes em terra boa e esquecido espera que elas germinem, como de fato o fazem, silenciosamente; aqueles vínculos que se dão na tolerância e no respeito mútuo; tendem a durar e às vezes tornam-se árvores frondosas, de refrigerante sombra, com flores, frutos... Não é assim toda árvore plantada junto às nascentes de água viva? Ora, ora, quem bagunça a nossa vida – quando há amor – e nos desestabiliza presta melhor serviço que os ventos faceiros, vagabundos, que passam por nós e não mudam nada, tocando-nos só muito superficialmente e roubando-nos míseras folhas secas. A sinceridade que dói é ainda melhor que gentis mentiras. Quando acordarmos deste sono, veremos o verdadeiro quilate dos que nos cercaram, dos que de perto ou de longe nos amaram ou só fingiram nos amar. Um dia tudo estará tão claro e tão seguro, tão pleno de certezas! Então diremos: Que escola maravilhosa é a vida! Que mistério tão rico é o tempo a dar sabor aos vinhos de nossos odres!...

Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 20 de setembro de 2010.
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
E-mail: seridoano@gmail.com

sábado, 18 de setembro de 2010

MUITO BOM! VALE A PENA LER DE NOVO!


Todo intelectual que visitou ou viveu o Brasil das últimas três décadas, leu ou pelo menos ouviu falar deste livro do Affonso Romano de Sant'Anna: “Que País É Este?” (1980). Reeditado pela Rocco neste ano de 2010, conta com bonito projeto gráfico, editoração e capa de Fatima Agra. Infelizmente a foto digital não permite ver os delicados relevos da capa... Fica aí mais uma SUGESTÃO de leitura! Quem não leu, leia! Quem já leu, vale a pena ler de novo! Fragmento (desconfigurado) do poema Que País É Este? : “Deveria derribar aflitos mapas sobre a praça / em busca da especiosa raiz? ou deveria / parar de ler jornais / e ler anais / como anal / animal / hiena patética / na merda nacional?” (Affonso Romano de Sant’Anna). Publicado em plena ditadura militar!!! Há mais sobre o poeta e seu livro em postagens antigas deste Blog.

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

CLAUDE CHABROL (1930 - 2010)


Chabrol - Prêmio Carreira no Festival de Berlim (2009) - (Fabrizio Bensch)

Faleceu neste domingo 12 de setembro, em Paris, o diretor e roteirista francês CLAUDE CHABROL (1930-2010). Ele revolucionou a sétima arte, integrando a Nouvelle Vague, movimento que evoca ainda outros grandes nomes do cinema como os de Jean-Luc Godard, Alain Resnais ou François Truffaut. Em 1959, Claude Chabrol dirigiu seu primeiro filme, “Le Beau Serge”, o qual se tornou manifesto de abertura da Nouvelle Vague.
Segue-se listinha básica de só alguns dos seus muitos trabalhos:
Nas Garras do Vício (Le Beau Serge) – 1958; Os Primos (Les cousins) – 1959; As Corças (Les Biches) – 1968; A Mulher Infiel (La Femme infidèle) – 1969; O Açougueiro (Le Boucher) – 1970; Dez Dias Fantásticos (La Décade prodigieuse) – 1971; Amantes Inseparáveis (Les Noces rouges) – 1973; Os Inocentes de Mãos Sujas (Les innocents aux mains sales) – 1975; Frango ao Vinagrete (Poulet au vinaigre) – 1985; Um Assunto de Mulheres [Portugal: Uma Questão de Mulheres] (Une Affaire de femmes) – 1989; Madame Bovary (Madame Bovary) – 1991; A Dama de Honra [Portugal: A Dama de Honor] (La Demoiselle d'honneur) – 2004; Uma Garota Dividida em Dois [Portugal: A Rapariga Cortada em Dois] (La Fille coupée en deux) – 2007.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

LEIAMOUÇAMVEJAM - com "M" de cabeça para baixo!

Olá, pessoal, revisitem os tópicos deste Blog referentes a WILMAR SILVA. Estão muito interessantes e eu sei que muitos de vocês apreciaram as matérias. Obrigado! Além dos e-mails postem mais comentários, por favor, mesmo que sejam anônimos, não tem problema! Wilmar Silva é um artista sério, faz promoção de boa cultura e a viabiliza para todos. Gosto disso! Apresento-lhes um breve “inventário” de sua Obra. Acho que todos gostarão de conhecê-la integralmente, não pelo que eu disse ou digo, mas pelo que ele (Wilmar) ou ela (a Obra) diz. Tirem suas próprias conclusões... Caso alguém se interesse por esse trabalho, pode buscar mais informações (não mais comigo) e adquirir os seus livros etc. pelo e-mail wilmarsilva@wilmarsilva.com.br Leiam ouçam vejam e algo mais::: ANU (Confraria do Vento, RJ); SILVAREDO (Anome Livros, BH); ESTILHAÇOS NO LAGO DE PÚRPURA / LÁGRIMAS EN EL LAGO DE PÚRPURA (PORTUGUÊS/ESPANHOL, Tropofonia Editorial/AR); YGUARANI (Cosmorama Edições, Portugal); NEONÃO (CD Poesia Biosonora c/ Wilmar Silva e Francesco Napoli); MUSICACHA CACHAPREGO (CD c/ Wilmar Silva e Gilberto Mauro); PORTUGUESIA (LIVRODVD c/ 101 Poetas de Portugal, Guiné-Bissau, Cabo Verde e Minas Gerais, Livro 512 páginas, DVD 2hs videopoesia).

LABIRINTO

Eis a libélula bélica – de asas translúcidas –
A pairar sobre o labirinto das macerações!

Nós demolimos este e aquele sistema
Colossal,
Quebramos todas as pedras filosofais,
Blasfemamos e rimos
De nossos pérfidos ancestrais,
Reinventamos o mundo... (ética... ética?)
E ainda somos como foram
Nossos pobres renegados pais.

Eis o mundo! Novo mundo!
Mundo... Mundo... Vastíssimo mundo
Entre ruínas e ultraprogressos...

“Façamos guerra em prol da paz!”
“Guerra! Guerra!”
“Pela paz!”
“Deus nos impele!”
“Matemos mais!”
“Guerra! Guerra! Pela paz!”

Um louco grita:
“Quero a roda,
O fogo primeiro,
A caverna!”

O ser de asas translúcidas
Paira sobre nós...

Antonio Fabiano
Direitos reservados

VISÃO NOTURNA

Vi, aterrorizado, um girassol à noite
E nele a viva imagem da desolação do mundo!...
Os girassóis não foram feitos pra visões noturnas!

Digo-lhes, senhores, não há coisa mais petrificante
Que a visão de um girassol à noite!

Chora-se ali o desperdício de amarelo
Em cada pétala sem luz
E a solidão de um ser sozinho macerado!...

Mas quiçá por mercê do que ainda há de secreto nessas cores
Ou porque existiu Van Gogh,
Eles, os girassóis, nunca são eles mesmos.
Quer faça dia ou seja a noite escura!

Antonio Fabiano
Direitos reservados

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

IMPLOSÃO

O século XX testemunhou um dos maiores acontecimentos do seu milênio: o atentado de 11 de setembro de 2001. Daqui a mil anos falarão disso, como hoje falamos, por exemplo, das quedas de Roma (476 d.C.) e Constantinopla (1453 d.C.). O leitor esperto sabe que no Ocidente o Império Romano caiu na primeira data, mas perdurou incólume no Oriente até essa segunda data. E de tantos que o mundo teve, aprendeu esta máxima: impérios caem. Sim, estrelas mudam de lugar (poeticamente falando, ou cantando...); o mal muda de nome; mas, impérios caem!
Vimos ruir em tempo real as Torres Gêmeas, o World Trade Center. Quando isso aconteceu, na hora exata, ninguém podia mensurar a proporção do estrago, tampouco as consequências. Lamento, ainda não podemos. Sabemos o número de mortos e feridos nos seus corpos... Os outros casos e respectivos cálculos, estes nunca saberemos ao certo. Aquilo pareceu-nos irreal. Era como um sonho ruim, de algo impossível que de repente acontece. Depois, o orbe nunca mais foi o mesmo, nem esta data, nem nós.
Paira uma sombra de desolação sobre este aniversário maldito, todos os anos, quando nos levam a fazer memória do inesquecível... No último sábado era maior a tensão em algumas partes do planeta, especialmente nos Estados Unidos, onde a ameaça de um fanático religioso “cristão” (!?), de queimar o Corão, livro sagrado do Islã, elevou ainda mais o nível de histeria e insegurança das pessoas.
Vocês se lembram de um brasileiro que, por ser latino, era obviamente suspeito de ser terrorista ou qualquer coisa do mal e morreu cravejado de tiros em um metrô de Londres? Aconteceu em 2005. O rapaz era inocente. Seu nome: Jean Charles.
Há muito, já não podemos andar sossegados. Nem voar sossegados. O inimigo usa disfarces impossíveis. Qualquer um pode ser seu inimigo e, em nome de..., explodir. O cristão desvirtuado se atavia de loucura e, em nome de..., ameaça queimar, punir, salvar.
Decerto, uma parcela do mundo perdeu a razão. Ou a fé, no que quer que seja. Evoluímos para isso. O racionalismo exacerbado (nos) ensandeceu, a fé doentia (nos) fanatizou e eu, tu, eles, em nome de..., ou por causa de..., ameaçamos explodir.
Vivemos num tempo de mentiras bem contadas, num tempo de verdades nunca ditas. Num tempo de tempo nenhum. Confusão! Nós, vós, ele e ela somos filhos da... testemunhas de...
Pérfida geração, a que dirige o mundo em seu desgoverno para não se sabe onde, a que se julga fazedora de... Sim, fazedora de... Assim estamos, e não há perspectiva d...
Estou tão saturado que não vou mais escrever.

Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 13 de setembro de 2010.
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
E-mail: seridoano@gmail.com

domingo, 12 de setembro de 2010

WILMAR SILVA


Wilmar Silva - Fotografia de Paulo Lacerda

Wilmar Silva (1965) está longe de ser um poeta previsível, tipo convencional. Entre gênio e louco, até podem ser divididas algumas das opiniões mais superficiais a seu respeito! De fato ele faz questão de fugir dos gastos padrões vigentes. Mas isto é natural nele, nunca artificial! Espontâneo. E, gostem ou não de sua poesia, admitam ou não seu ambicioso projeto de “desconstrução da língua” etc. etc., ele (Wilmar Silva) e ela (a poesia dele) estão aí como uma surpresa a cada aparição, como um delicado insulto aos mais puristas! Uma coisa é certa: Wilmar Silva sabe o que faz, quer fazer exatamente como está fazendo, e o faz sempre com extravagante inteligência e aquilo que também podemos chamar mais brandamente de saber/sabor genuíno, artístico!
Em alguma de suas apresentações performáticas, você pode se surpreender vendo-o comer um buquê de rosas vermelhas... Ou, no meio de uma entrevista, assisti-lo a rasgar um de seus livros – que, aliás, têm admirável projeto gráfico de edição. Você pode também não entender nada da “poesis biosonors” ao ouvir em seu programa “Tropofonia”, pela Rádio Educativa UFMG, na frequência 104,5, às noites de segunda-feira. Mas o que você ou ninguém pode é negar que o poeta é poeta! Do jeito dele! Poeta!
De origem bem simples – zona rural de Rio Parnaíba (MG) –, Wilmar Silva é filho de campesinos semianalfabetos. Com eles, certamente, teve sua primeira e melhor escola, de vida. Mas só aprendeu as primeiras letras quando se mudou com a família para a cidade. Aí cresceu, em todos os sentidos. E da cidade Wilmar Silva ganhou o mundo, promovendo a poesia (não simplesmente promovendo-se com a poesia) na América Latina, África e Europa, por exemplo. Um de seus livros – “Estilhaços no Lago de Púrpura” – saiu em edição quadrilíngue (português, espanhol, francês e inglês). Ele é curador do projeto “Terças Poéticas”, levou a cabo recentemente o “Portuguesia”, obra de inaudita ousadia, com artistas lusófonos de várias partes do mundo. E tem fôlego para mais, muito mais! Seu recente trabalho é o NEONÃO, de experimentação sonora (ou, como ele diz, de poesia “biosonora”). Divide-o com Francesco Napoli, também poeta, compositor, exímio guitarrista e professor de filosofia e história da arte.
Segundo o escritor português Fernando Aguiar, “Neonão” poderá soar para muitos – inclusive poetas – como “Neonada”. É ouvir, sem preconceito, pra decidir! A sonoridade dos poemas é quase integralmente patenteada pela voz do poeta, sem muitos recursos técnicos para além da guitarra falante do Napoli, que (re)cria ambientes sonoros – a componente acústica – para o dicção de Wilmar Silva.
Neonão? Poesia, sim!

Poeta Wilmar Silva, livros: “Cachaprego” (Anome Livros, 2004); “Estilhaços no Lago de Púrpura” (Anome, 2006); “Anu” (Confraria do Vento, 2008); “Yguarani” (Cosmorama Edições, 2009); “Astillas en el lago de púrpura” (Angeles de Fierro, 2010). Performances: “O sétimo corpo”, “Ee tu mao”, “Eusmaranhados”. Além de videopoemas, dentre os quais um exibido no Museu da Língua Portuguesa de São Paulo.

Antonio Fabiano
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
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INTERVISTA WILMAR SILVA A ANTONIO FABIANO


Wilmar Silva - Fotografia de Sebastián Moreno

1) Wilmar Silva, a sua obra acontece e obviamente não acontece desvinculada do mundo. Ela se avulta a cada dia, isto é fato. Se define cada vez melhor, se faz notar, ganha mais e mais expressão... Então (para não irritá-lo e evitar dizer canonicamente “em nossa literatura”...), que espécie de papel, em sua autocrítica, ela (a sua obra) representaria no palco do mundo?

O desejo de não ser arremedo. Mas ser aquilo que se perde entre a existência e a eternidade, sendo a poesia em estado de orgasmo.

2) Quais suas influências imediatas e, independente disso, que artistas você mais frequenta? Depois, quais poetas (especificamente) lê ou ouve?

As influências do ser humano em sua metamorfose mineral, vegetal, animal. Artistas líquidos em pássaros, pedras, árvores. E poetas, além da realidade, na pararealidade.

3) Sobre o seu novo trabalho, o “Neonão”... Depois de pronto, você o vê com plena satisfação? Pode nos dizer algo de sua gestação? E desta velha parceria com o Francesco Napoli?

Não. NEONÃO nasceu porque é impossível o mesmo espelho. Francesco Napoli é um amigo de infância que conheci nos jardins internos de 23 de junho de 2009.

4) O Brasil favorece o surgimento de artistas como você ou de obras como a sua? Pode definir em poucas palavras a poesia “biosonora”? E, não obstante, qualquer coisa, hoje são muitos os que se aventuram em território nacional a fazer essa poesia de experimentação?

Sim, porque o Brasil é um abismo de contrastes. E não, porque a liberdade nunca é livre. Poesia biosonora é a minha etnopoesia. Não.

5) Que paralelos há entre a poesia que se faz hoje no Brasil, de modo geral, e a que você tem visto acontecer em outras partes do mundo? Como vê, então, o fenômeno poético em território nacional?

Todos, porque fazer poesia é se perder além de qualquer Sol LeWitt. O Brasil é uma América Latina de poéticas originais, mesmo sob as vanguardas do século XX.

6) Há pessoas íntimas que inspiram sua obra e vida? A família, por exemplo, acompanha os largos passos do artista? Que influência essas pessoas exercem em seu trabalho e também a gente humilde de suas origens?

Sim, mesmo inconsciente. E até mesmo um estranho, de repente, no equinócio. A família, perto e longe do coração selvagem. Sou o lavrador que foi meu pai.

7) Pode deixar algumas palavras para os amigos deste Blog?

& eye ye vindo do meu centro de dentro
& eye ye alma de menino &
& eye ye o menino pássaro & eye ye o menino cavalo
& os insetos ye eye & as pedras ye eye & eu madrepérola

eye ye eu feito de eye de sol ye de sol & eye as mãos
& eye os pés & eye eu & e eu eye
subindo ao amanhecer &
subindo ao entardecer &

eye sou hey um animal eye
eye sou hey um vegetal eye
eye sou hey um mineral eye

i yum animal naturalis humanus
i yum vegetal naturalis humanus
i yum mineral naturalis humanus


WILMAR SILVA - Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 12 de setembro de 2010.
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
E-mail: seridoano@gmail.com

sábado, 11 de setembro de 2010

SE EU SOUBESSE DIZER...

Se eu soubesse dizer o que é a vida
Diria de um modo a tocar o coração dos homens
Diria tão baixinho
Como o canto de uma mãe que canta
Para o filho dormir
E este dormindo não mais quisesse despertar
Enquanto houvesse sonho...

Mas eu não sei dizer o que é a vida
Eu precisaria ser talvez poeta de verdade ou santo
Gente de alta patente interior
A vislumbrar uma porção desta façanha
De gigante
E ainda assim muito se ficaria por dizer...

Então me rendo a não saber dizer
O que é a vida
E fico em silêncio diante dela
Dentro dela
Maravilhado com o dom de estar aqui
E nada mais poder dizer do que é a vida.

Antonio Fabiano
Direitos reservados

DESEJO DE CASA E SILÊNCIO

Quero uma casa e um silêncio.
Sempre estive cercado de montanhas
Mas continuei pequeno.
É abissal o mar das significações
Em que me insiro. Por isso
Se alguém ousar seguir meus passos
Morrerá...
Como quem vê Deus, o Terrível!
As luas cheias me fascinam...
Fascinam marés e cães no cio.
Estes ladram pelas ruas.
Eu gosto da cidade à noite
Só minha.
Isso às vezes sói, mas passa
Quando é dia.
Quem apazigua meu doido coração
E este desejo de casa e silêncio?

Antonio Fabiano
Direitos reservados

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

FERREIRA GULLAR - 80 ANOS


Hoje o poeta FERREIRA GULLAR faz 80 anos. É um dos escritores mais respeitados da atualidade. Em maio deste ano foi contemplado com o Prêmio Camões, o mais importante da língua portuguesa, instituído pelos governos do Brasil e de Portugal. Ferreira Gullar (José Ribamar Ferreira) nasceu em São Luiz do Maranhão. Escreveu, dentre outras coisas, o seu POEMA SUJO (1975), um dos maiores acontecimentos da língua vernácula na segunda metade do século passado. Opinião. Recentemente o encontrei nos jardins internos do Palácio das Artes, aqui em BH. Está mais afiado do que nunca!

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

ANTONIO FABIANO - SINOPSE BIOGRÁFICA (publicações antigas)

ANTONIO FABIANO DA SILVA SANTOS
Dele sabemos que nasceu em 05 de julho de 1979. Em Patos, na Paraíba. Mas existiu no Rio Grande do Norte, por isso é potiguar (disso nunca teve dúvida!) e até escreveu um poema intitulado “Alma Poti”.
É primogênito de José Juarez dos Santos, comerciante, e Francisca Maria da Silva Santos, dona Francisquinha, professora aposentada que educou incontáveis gerações de cerrocoraenses e mereceu em 2000 o título de “A Professora do Século”. São seus irmãos: André Luiz e Ana Priscilla.
Estudou na Escola Estadual “Querubina Silveira” de Cerro Corá/RN. Lá se destacou em Redação e recebeu muitos estímulos para continuar escrevendo. Concluiu os primeiros estudos em Currais Novos/RN. Ainda criança leu todos os livros de Monteiro Lobato e escreveu, com precoce domínio da língua, seus próprios livros e alguns poemas de caráter social ou ecológico. Da sua infância conservou-se um grande número de grafismos, desenhos e pinturas, de um período anterior aos seus dois anos de idade até aproximadamente sete ou oito. Estes trabalhos foram catalogados por sua mãe. Desenhava com as duas mãos e dizia que ia ser pintor, o que não vingou.
Em 1996 publicou uma obra de cunho religioso, intitulada "Deus salve os que crêem pela loucura de sua mensagem". Este trabalho foi difundido especialmente entre os grupos de jovens dos quais fez parte e onde também atuou como ator e autor de muitas peças de teatro. Escrevia, nesse tempo, para "A Semente", um jornalzinho católico que ele e seus companheiros de pastoral criaram, o qual circulou por toda a sua diocese e entre amigos de pelo menos dez estados do país. No mesmo período participou de shows católicos, como vocalista e animador. Coordenou o Zonal 2 da Diocese de Caicó, no tocante as lideranças da RCC.
Apresentou, na Rádio Cultura Serrana de Cerro Corá, o programa oficial da Paróquia de São João Batista, "Trinta Minutos com Cristo", programa dominical. Depois, aos sábados, emitido pela FM Liberdade, o programa "Boas Notícias: Uma Hora com Deus". Nesta última rádio apresentou ainda, em curta temporada, um outro programa intitulado "Voz Carismática".
No ano de 1997 foi publicado através da Rádio Internacional da China, em Pequim, o seu poema "Hermosa China", sem tradução para o português. No período em que era correspondente da Sección Español da referida emissora, participou de alguns concursos de conhecimento e foi ganhador, dentre outros prêmios, do 1° prize of the 1998 'MACAO Knowledge Contest’.
Em 1998 ingressou na Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, onde assumiu a Diretoria de Comunicação do Centro Acadêmico de Letras do Campus de Currais Novos. Ali fundou, no mesmo ano, o Jornal Navegos, com outros destacados contemporâneos que continuam a fazer história nas letras potiguares. Este Órgão Informativo circulou nas principais universidades do Rio Grande do Norte e além fronteiras do estado e do país com positiva repercussão. Participou ativamente da política estudantil do seu tempo. Foi Diretor de Comunicação do Centro Acadêmico por três gestões consecutivas. Promoveu, com seus companheiros, diversos eventos culturais.
Em julho de 1999 publicou o conto "O Milagre das Rosas". Este conto foi prefaciado pela Mestra Elizabeth de Souza Araújo que o chamou de "poeta-filósofo", "dissecador de almas e devassador de intimidades", "o espírito mais lúcido de toda a região seridoense". Isso ocorreu na culminância do V EPEL, Encontro Potiguar dos Estudantes de Letras, momento histórico da convergência dos estudantes dos diversos Cursos de Letras do estado na seridoana "capital da scheelita".
Foi voluntário do AFS - American Field Service - Intercultura Brasil. Esta entidade que surgiu depois das duas Grandes Guerras do século XX, a partir de motoristas de ambulâncias, intenta promover a paz no mundo por meio de intercâmbios entre jovens de diversas nacionalidades e culturas do planeta. No AFS, ele foi professor de língua portuguesa para estrangeiros. Sua atuação filantrópica neste campo fez com que o seu nome figurasse entre 120 autores classificados de todo o país numa lista de voluntariado brasileiro em 2001.
Em julho de 2000 a escritora Maria Lúcia Dal Farra o intitulou "poeta exuberante", numa entrevista especial para O Galo, que era certamente o jornal literário mais importante do Rio Grande do Norte. Esta mulher respeitada nacional e internacionalmente seria proclamada, pela Revista Veja de 14 de agosto de 2002, a melhor poeta do Brasil.
Grande apaixonado pela música, além dos trabalhos escritos em prosa e verso, compôs melodias para poemas de outros poetas - herança materna, pois cresceu ouvindo a sua mãe interpretar canções de autoria própria. Em sua casa todos manuseiam algum instrumento musical.
Na Secretaria de Educação de Cerro Corá, como coordenador do Departamento de Cultura, desenvolveu diversos trabalhos. Fundou o anual Concurso "Jovens Escritores Cerrocoraenses".
Em 2003 publicou sua Sinopse da História de Cerro Corá, mais que um trabalho científico foi sem dúvida alguma a sua eloquente declaração de amor à cidade serrana e despedida.
Ingressou na Ordem do Carmelo Descalço em 2004. Aí passou a chamar-se Frei Fabiano de Santa Maria do Monte Carmelo.
Em 2006 entrou para a faculdade de Filosofia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Na mesma universidade cursou Teologia, a partir de 2009.

[*] Texto extraído e adaptado do painel "Inteligências Múltiplas" da I Feira da Cultura Cerrocoraense em 10 e 11 de dezembro de 1999. Da I Exposição Navegoana de Artes Plásticas, Poesia e Prosa Literária da UFRN em novembro de 2000. Do livro Sinopse da História de Cerro Corá (2003).
[BIOGRAFIA DESATUALIZADA]

terça-feira, 7 de setembro de 2010

PUC MINAS – MAIOR DO MUNDO

O jornal ESTADO DE MINAS noticiou nesta terça-feira 7 de setembro de 2010 que a PUC Minas recebeu o título de “maior universidade católica do mundo”. Existe há 52 anos, tem 63,5 mil estudantes e 4 mil funcionários – somando-se professores do quadro permanente (quase todos doutores ou mestres) e empregados da área técnico-administrativa. Desde 2003, recursos destinados a laboratórios e projetos de inovação cresceram de R$ 500 mil para R$ 30 milhões. A PUC Minas coleciona recordes, já considerada a maior universidade do estado e uma das cinco primeiras particulares de todo o país.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

DA HIPERBÓLICA CRÍTICA NIETZSCHIANA À MORAL DE KANT

Antonio Fabiano

Como sucede aos mais fecundos pensadores, Kant pôde contar com uma legião infindável de discípulos para a sua doutrina filosófica que apresentava traços originais e novíssimos. Não poucos, nem menos ilustres mestres, debruçaram-se sobre escritos seus para pretensa ratificação ou retificação. Isto, enquanto ele vivia e postumamente. Veja-se, oportunamente, o idealismo pós-kantiano e também aquilo que denominou-se neokantismo. Immanuel Kant teve notável prestígio, mas enfrentou a oposição de muitos e respeitáveis intelectuais. Propositalmente evocaremos apenas Friedrich Nietzsche, esta figura emblemática que nos dá hiperbólica mostra disso.
Sempre que lhe pareceu convir, Nietzsche atacou Kant em seus escritos. E, como era de seu feitio, não o fez apenas em nível doutrinal, mas também pessoal. Para Nietzsche, que se ocupa assiduamente em demolir toda moral “padrão”, a de Kant expressa perfeitamente o que ele chama em "Humano, demasiado humano" (1878) de famigerada antiga moral, algo ironicamente tido como belo e ingênuo (NIETZSCHE, 2005, p.33). E não apenas aí a moral de Kant é destroçada por este outro alemão.
Scarlett Marton desenvolve em seu livro "Nietzsche: das forças cósmicas aos valores humanos", um excelente capítulo dedicado inteiramente à crítica feita por este último filósofo à doutrina moral kantiana [1]. Não há como negar a genialidade e perspicácia do espírito de Nietzsche, que opõe-se desvairadamente ao “chinês de Koenigsberg”, ridicularizando-o de diversas maneiras, desde “fanático da moral à la Rousseau” a “idiota” etc. Para ele, o propósito de Kant na primeira Crítica era impor limites à razão para poder destarte forjar a moralidade em um mundo transcendente. Segundo Nietzsche, só para viabilizar um “reino moral”, Kant se obriga a inventar um mundo indemonstrável, a fim de fazer este mesmo “reino moral” absolutamente invulnerável, inclusive e talvez principalmente à própria razão. Marton escreve: Para ele [Nietzsche], o filósofo [Kant] seria hipócrita, pois lançou mão dos mais diversos estratagemas para tornar a moralidade invulnerável. (MARTON, 1990, p. 109). Scarlett nos inteira, com clareza de percepção: Nietzsche não pode acatar a idéia de autonomia, ponto central da doutrina moral kantiana, nem aceitar o seu rigorismo e formalismo. Diferença de perspectivas! Mas Kant é antes analista do que moralista (MARTON, 1990, p. 110) [2]. Realmente não seria tragável, a Nietzsche, todo o viés da moral kantiana, ainda mais quando se tem em conta as evidentes diferenças de perspectiva até no que cada um deles entende por filosofia. Impossível seria pôr em acordo estes dois gênios. Dentre observações pungentes, Nietzsche não rechaça apenas a idéia de Kant pretender autenticar a moralidade em um mundo supra-sensível. Ele se espraia em mais sutilezas e por isso pode-se dizer que cai em alguns equívocos:
"em Kant, a idéia de autonomia tem por horizonte a universalidade. Se o homem, ao submeter-se à lei moral, obedece apenas a si mesmo, é porque a autoridade do dever é a autoridade da própria razão, ou seja, da faculdade pela qual ele é homem. Ora, Nietzsche parece identificar universal e coletivo; é por essa razão que despreza a idéia kantiana de autonomia, investe contra a universalidade do imperativo categórico, pensa a lei moral como fruto de mera convenção e talvez seja levado ainda a considerar a doutrina moral de Kant defensora dos interesses gregários." (MARTON, 1990, p.118).


NOTAS

[1] Capítulo III. Intitula-se “A crítica à doutrina moral kantiana”.
[2] “Para que uma ação tenha valor moral, Kant não exige que seu autor se despoje de seus sentimentos e afecções, mas que, ao agir, se deixe guiar apenas por sua vontade governada pela razão. De natureza híbrida, o ser humano revela-se dotado de razão e sensibilidade, não podendo desfazer-se em vida de nenhuma delas. Referindo-se ao homem, disse Pascal: “ni ange ni bête”; e Kant talvez dissesse, num sentido análogo: “ange et bête”. Não se trata, portanto, de um ser humano tornar-se insensível para capacitar-se a agir moralmente – e sim de eleger como único motivo de uma ação a obediência incondicional à lei moral, sem levar em conta, em momento algum, qualquer móvel baseado em inclinações sensíveis. Aqui mostra o rigorismo da doutrina kantiana: ela não procura aconselhar nem persuadir, mas quer apreender a moralidade em seu estado puro. O rigorismo é, pois, rigor de pensamento: mesmo que nunca tenha existido neste mundo um ato feito por puro dever, isso em nada altera as exigências da moral. Para Nietzsche, esse aspecto da filosofia prática trai, ainda uma vez, o apelo ao transcendente: ‘se se chega a supor que a norma moral, como pensava Kant, nunca foi perfeitamente realizada e permanece suspensa sobre a realidade, como uma espécie de além, sem nunca nela cair, então, a moral implicaria um juízo sobre a totalidade em si, que permitiria colocar a questão: de onde ela se arroga o direito para tanto? como a parte vem a erigir-se aqui enquanto juiz do todo?’ (XII, 7 (62)).” (MARTON, 1990, p. 110-111).


REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

LEFRANC, Jean. "Compreender Nietzsche". 3.ª ed. Petrópolis: Editora Vozes, 2005.

MARTON, Scarlett. "Nietzsche: das forças cósmicas aos valores humanos". São Paulo: Editora Brasiliense, 1990.

NIETZSCHE, Friedrich. "Humano, demasiado humano". São Paulo: Companhia das Letras, 2005.

MEU QUERIDO HAWKING E SEU NOVO LIVRO


Imagem da NASA StarChild de Stephen Hawking em 1999.

Fomos surpreendidos esta semana com mil notícias de que Stephen Hawking, o cientista britânico, publicará em breve seu novo livro – The Grand Design. Ora, isso já se esperava e a notícia não é nova! Ocorre desta vez (e é precisamente isto que a mídia divulgou com mui ígneos entusiasmos, também não por acaso às vésperas da visita do papa Bento XVI à Grã-Bretanha) que ele (ele, Hawking, pelo amor de Deus me entendam!) teria excluído, em sua nova teoria, a possibilidade de Deus ser criador do universo. Até então suas próprias ideias, expostas em outras obras, não viam (grandes) incompatibilidades aí. Mas diga-se que Stephen Hawking foi sempre e sem embargos um homem de ciência positivista. Poucos dias antes da publicação do novo livro – que ambiciona tornar-se best-seller, como alguns dos anteriores – divulga-se este detalhe (da “exclusão” de Deus) e, não sejamos ingênuos, muito oportuna e propositalmente. É excelente meio de chamar todas as atenções para um produto em foco de estratégia comercial. Tudo pela ciência, claro, mas não sem bilionários lucros para partes diversas. Aliás, basta lembrar as deliciosas polêmicas levantadas também em torno de Saramago, nosso Nobel de literatura, no tocante às questões de religião etc., quando este lançava novos livros. Saramago é o tipo de gênio intelectual, diante do qual me curvo reverente. É um grande homem, um gigante. Mas nem tudo que escreveu é ouro. Sua cultura teológica, bíblica e de história das religiões é muitas vezes pueril (para evitar a palavra infantil ou medíocre). E quando nos pomos a falar do que não conhecemos bem...
Claro que ainda não li este novo livro de Stephen Hawking (será lançado amanhã nos EUA e dia 9 de setembro no Reino Unido), mas livros, eu nunca os julgo pela capa, nem pelas frases de efeito que se põem neles ou pelo que se diz deles nos jornais, quando estes de fato dizem alguma coisa. O que sei é que Hawking é um astrofísico brilhante e muito respeitado. Conheço bem seus outros livros, porque física teórica é para mim leitura de diversão. Quanto a esta polêmica, pensei: grande bobagem! O novo mundo da ciência está repleto de gênios que negam de alguma forma Deus ou sua atuação na história do cosmos. Que novidade há nisso? Já foi até muito chique confessar-se ateu, agnóstico, pernóstico... ops, isto não! Se Hawking mudou de opinião, ele o faz com certa frequência, assumindo erros e rindo sem embaraço das teorias que defendeu e que não se sustentaram. Teorias são somente teorias, ele mesmo o diz. Basta olhar a evolução da ciência nos últimos séculos, para nos espantarmos com a mobilidade de suas verdades. Assim como rimos hoje das crendices dos nossos ancestrais, crendices aquelas consideradas por milênios muito científicas (em noção diferente da que temos hoje de ciência) e inquestionáveis, também rirão mais tarde das nossas pretensiosas verdades “absolutas”. Não nos maravilhemos se amanhã disserem que esta foi a idade da pedra lascada da ciência! Mas para que isso aconteça, é preciso que não destruamos – com a ajuda da ciência, inclusive – o planeta, ao menos enquanto não colonizamos outros para onde possamos ir, como nos filmes de ficção científica.
No fundo de tudo isso permanece ainda aquele debate roto: religião ou fé versus ciência. Há dogmatismos em ambas as partes, despotismos e interesses aqui e ali. Ou alguém negaria que a ciência às vezes exige fé tão ou mais cega que a das religiões? E estas, por que entram em transe (não elas, mas seus fanáticos) quando um cientista, que também quer a verdade, diz o que pensa amparando-se em inconclusos cálculos ou nem isso, que é o que se busca numa teoria que, afinal, é só mais uma teoria? Caberia Deus num cálculo matemático? Se não, por que sobressaltos? Fato é que, com ou sem fé, cabecinhas unilaterais não suportam incertezas!

Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 06 de setembro de 2010.
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
E-mail: seridoano@gmail.com

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

QUE FAZER SE HOJE ACORDEI BARROCO?


Habacuc - Profeta de Aleijadinho
Fotografia de Antonio Fabiano

SEM PEIAS

Às vezes quando ligam e ao telefone me perguntam “quem está falando?”, respondo:
“Eu, filho do carbono e do amoníaco /
Monstro de escuridão e rutilância”!...

(Cito os dois primeiros versos do soneto “Psicologia de um vencido”, de Augusto dos Anjos).

POESIA NA SEMANA LITERÁRIA DO ISTA

Com seleção de FELLIPE TOLEDO e ADRIANO OLIVEIRA, alguns poemas meus estarão expostos na VIII Semana Literária do ISTA, que se realizará nos dias 08, 09 e 10 de setembro. Valeu, rapazes!

PALHAÇO

Andam peregrinos pelo mundo
Andam pés e passos pelo espaço
Do que chamam mundo.
Vagabundo vago
De plaga em plaga...
Como rei do mundo
Como rei dum paço.
E na poesia
Bem no seu regaço
Me disfarço
Me desfaço...
Mas não passo!
Permaneço
E esqueço
(que tudo no mundo finda)...

– Sou palhaço!...

Antonio Fabiano
Direitos reservados

FACES E FASES

Se o amor vem com a chuva
Ou como a chuva,
Que importa? Quem se importa?
As coisas vêm...
As coisas vão...
Fases? Ah, até mesmo a lua as tem!
Quem não as tem?

Mas amor passa?
Amor, passas?
Passa?

O mundo em suas voltas
E desvoltas
Ele e elas vem e vão... vêm...
Vão...
O mundo eleva
Baixa
Quebra
Leva
Enfaixa...
Sempre traz!
Traz! Traz!

A chuva
Em suas faces
Pluviais
Também tem fases...

Onde haver mais?

Amor amor não passa!
Passa?

Antonio Fabiano
Direitos reservados

POEMA INACABADO PARA MÃOS


Certas mãos são fortes
Porque já foram destroçadas pela vida
E aprenderam disso o seu sentido
Mais profundo.

Delas cada dedo é uma torre
Anelada de vitórias!
Só quem conhece o azul da dor
Pode tocar silêncios...

Algumas mãos têm chagas
Mas são cariciosas para a felicidade
E sabem sem temor o centro entre hemisférios
Onde mora o mistério
O que se toca e tece em dia a dia no labor.

Têm calos e lados – como dados –
Certas mãos...
Em suas linhas correm afoitos mil destinos.

Algumas até
Tocam piano e violino!...

Antonio Fabiano
Direitos reservados