Hildeberto Barbosa
Filho [*]
De olho na estante (7)
Segundo Ferreira Gullar, “Nas pontas
dos pés” (Mossoró: Sarau das Letras, 2015), de Antonio Fabiano, possui
“linguagem fluente, sem ênfase”, alçando-se, portanto, “acima da banalidade da
vida”. Antonio Carlos Secchin, por sua vez, em breve texto de apresentação,
releva o tom recatado e delicado de sua dicção lírica, “despojada de toda
pompa, e, por isso mesmo, cúmplice das pequenas maravilhas de que se tece o
cotidiano”.
Temos, assim, ressaltados pelos
poetas/críticos elementos de forma e fundo peculiares à poética desse paraibano
de Patos, que cresceu e viveu em Cerro Corá (RN) até 2004, ano em que ingressou
na Ordem do Carmelo Descalço.
À sutileza e à limpidez da linguagem
corresponde uma temática voltada para as experiências do dia a dia, aquilo que
poderíamos denominar de o complexo da “vida simples”, para lembrar uma
expressão de Jurandy Moura, transfigurado, no entanto, pelo poder das palavras,
em suas possibilidades imagéticas, rítmicas e ideativas.
Frei Antonio Fabiano não teme o apelo
silencioso, mas urgente, das coisas comuns e das circunstâncias banais que o
circundam no plano existencial, para, com os utensílios idiomáticos, utilizados
com parcimônia e sabedoria poéticas, transcender o imediatismo pragmático das
vivências que a realidade nos impõe, desvelando seus aspectos essenciais e
imperceptíveis.
Em “O bailarino”, diz que “voava / Por
sobre a copa das árvores / Enchia de nada a noite”; em “A luz bruxuleante”,
acerca-se de sua “nudez / Tangida pelo dedo de um demônio”, assegurando, mais à
frente do poema, que “Por entre bicicletas / Moinhos e tímidos
sorrisos / Existimos”; em “Grão milagre”, descobre que “não se pode
interromper / Com as mãos a dança de um rio... / A gente é e para isso nasce. / O
pulso às vezes dói mas é sublime e / – mesmo que eu não quisesse – / Morava e
ainda mora e há de morar / Nas veias como em ostra o grão milagre!...”.
Motivos como a casa, o pai, a
infância, o corpo, a poesia, o palhaço, a velhice, entre tantos outros, são
contemplados pelo olhar lírico desse poeta que, como poucos, sabe unir a
dimensão lúdica do texto (ver, sobretudo, “Poema nuvem”, à página 31) a seu
viés reflexivo, onde, em particular, impõe-se a força do pensamento poético. Um
poema como “Estridência” ilustra bem o que quero dizer. Vejamos: “Há dias de
sagrado ócio / Em que a vontade é de / Não fazer mais nada // Só beber a estridência
de estar aqui / Como quem bebe o canto / De cigarras e grilos // Brindar sua
canção / Às vezes tão incômoda / Como a vida // Esta vidinha / Que não trocamos por
nenhuma / Das eternidades”.
O mesmo se pode afirmar de “Isto não
é um haicai”, em seu recorte autoirônico: “Um dia não haverá / Lembrança disto
que fomos / (Por mais belos que sejamos)”.
Além dessa coletânea, o autor
publicou, em 2012, “Sazonadas” e “Girassóis noturnos”, e, em 2014,”Cancioneiro
da terra”. Sua poesia tem sido reconhecida, em seu valor intrínseco, por
professores e poetas, como Maria Lúcia Dal Farra e Paulo de Tarso Correia de
Melo.
***
[*] – Hildeberto Barbosa Filho é professor universitário, escritor, crítico literário, poeta e jornalista. Ocupa a Cadeira nº 06 da ACADEMIA PARAIBANA DE LETRAS.
Bibliografia atualizada deste artigo: Revista da Academia Norte-Rio-Grandense de Letras. Nº 45. Natal, outubro-dezembro de 2015 (páginas 14-15).
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