TOQUE - LIVROS E CULTURA
Hoje abro espaço para uma resenha do crítico Chumbo Pinheiro, o pseudônimo de Luís Pereira da Silva, que é ensaísta, Bacharel em História pela UFRN, cursa Ciências Sociais na mesma Universidade. Autor de Alguns Livros Potiguares (ensaios) e coautor do livro Nei Leandro de Castro - 50 anos de Atividades Literárias.
Carlos de Souza
[fcarlos@tribunadonorte.com.br]
Publicação: 04/03/15
Terra, rio, poesias e canções
Chumbo Pinheiro
As divisas geográficas da Paraíba e do Rio Grande do Norte mostram-nos que entre estes dois estados brasileiros existe uma interterritorialidade. O Rio Grande do Norte adentra a Paraíba e a Paraíba o Rio Grande do Norte. A terra se irmana num entrelaçamento geográfico aproximando-se além do físico relevo, do clima, da hidrografia, mas também na arte e na cultura fortalecendo suas relações fraternais.
A terra potiguar se orgulha de ter registrado entre seus poetas a paraibana Zila Mamede. Aqui Zila se encantou e encantou-se. Conjugou solidão, amor, terra e mar em versos que navegam pelo Brasil inteiro. Zila sertão, agreste, mas, sobretudo mar. Mar natalense.
Chega-nos a poesia de outro paraibano de coração potiguar. Este traz em suas mãos, por entre os dedos, os grãos da areia, o pó da terra que compõe o chão sertanejo de onde nascem suas canções como raízes que se fortalecem e crescem sob o sol abrasador e o clamor pela chuva. Ei-lo inteiro, no soneto ALMA POTI: “Em chãos da Paraíba eu nasci / Mas cedo vim morar no Rio Grande. / Minh’alma fez-se então monja poti, / Aberta a toda sina que Deus mande.” Terra de chuva escassa, mas berço onde nasce o rio que dá nome ao estado. Nasce em Cerro Corá, terra que acolheu o poeta, e cortando cidades segue seu rumo, abriga o porto de Natal que recebe navios que vão e vêm, além-mar, deixando saudades e levando lembranças. O olhar do poeta traz uma perspectiva nova aos que cantam o Potengi já desaguando e encantando com o seu pôr do sol. Ele o vê da nascente aonde “Nas águas cálidas / Do Potengi / Vai rosa flor / Boiando... / O rio desce serras / Cruza montes / Molha pedras / Abre chãos...” (ÁGUAS DO POTENGI).
A poesia de Antonio Fabiano nasceu ali no sertão com a força e a sensibilidade do sertanejo. Uma poesia feita com inspiração, mas também com rigor metódico e estudo singular. Abre o livro com sonetos, muito bem analisados pelo prefaciador Wilson Azevedo “... Cancioneiro da Terra revela um poeta em pleno domínio do verso...” e seguem-se seis partes as quais como a primeira trazem o substantivo LÍNGUA em seu título, denotando a fala, a expressividade sonora, vocal e espiritual da natureza e da pessoa humana. Dos sonetos ao verso livre, deste ao canto e a écloga (poesia pastoril dialogada pelos campesinos, nos versos do poema AVE CORAÇÃO há essa proximidade), formas antigas que o autor reaviva dando sentido ao título da obra: Cancioneiro da Terra, conjunto de formas poéticas reunidas em um só livro, demonstrando um diálogo hoje cada vez mais intenso do homem contemporâneo e sua arte, com a arte moderna, com o passado e a história.
A diversidade das formas não compromete o autor e nem a obra. Ao contrário, põe o leitor diante da trajetória da própria poesia. Não de forma cronológica, uma que vez, as formas antigas estão inseridas em seu conjunto. Das línguas de pedra e fogo ou línguas de anjos até as línguas avoengas, notamos o encontro do poeta no seu tempo a dialogar com os seus antepassados, com a esperança e a fé sertaneja na vida permanente do rio, no sonho de asas das aves de arribação, fé e esperança nos homens e na chuva que venha talvez do mar e nas lembranças avoengas.
Publicou-se na Tribuna do Norte em 04 de março de 2015
http://tribunadonorte.com.br/coluna/2023
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