segunda-feira, 28 de novembro de 2011

AUSÊNCIA DE PRESENÇA

Uma das síndromes do nosso tempo é a ausência de presença. Quase ninguém é capaz de estar onde realmente está. E não me refiro apenas ao mundo virtual, à extraordinária capacidade de estar em multilugares... o que é bem legal!
Telefone já é um invento genial! Celular é uma espécie de febre curiosa, frenética, adolescente... Crianças já nascem com um desses aparelhinhos na mão, e velhinhos não têm a menor dificuldade em usá-los, igualmente. Esta é uma das coisas mais democráticas e unificadoras do nosso tempo!
Caminho quinze minutos pelo meu bairro, e vejo pelo menos quatro motoristas falando ao celular enquanto dirigem. Ilegal. Nos passeios todos estão ao celular. Os garis, também, enquanto trabalham falam ao telefone móvel, portátil, pequeníssimo. Pode-se, agora, localizar qualquer pessoa em qualquer lugar. Os telefones cabem dentro do ouvido...
Com a competitividade das operadoras de telefonia ficou relativamente mais barato falar – fale mais e pague menos. Tudo é pretexto para ligar para alguém e falar, falar, falar... Nos lugares mais improváveis e nas horas mais inconvenientes (como no teatro ou durante uma ópera), apesar das advertências, o telefone chama, toca desvairado. Grosseria.
Ninguém está onde realmente está, e longe de mim emitir juízo a respeito desse curioso fenômeno de massa. Moldamos a realidade, mas a realidade – ao menos essa – já nos molda ostensivamente, transformando de maneira mais que avassaladora hábitos e costumes. Valores. Hoje as pessoas se comunicam mais, ou menos?
Eu também não sei se sempre estou onde penso que estou, embora não use todos esses apetrechos. Enquanto espero em filas, leio, leio, leio... Tenho sempre um livro ao alcance da mão. Ou, às vezes, fichas com palavras de algum idioma que eventualmente esteja aprendendo. Exercitar a memória, nessas horas de espera, relaxa a gente.
Bom mesmo é poder estar onde escolhemos estar. Hoje, enquanto todos falam ao celular ou se desligam da realidade ouvindo música em seus fonezinhos de ouvido; hoje, porque o silêncio está impossível; eu paro e ouço o barulho infernal dos automóveis, a celeuma de vozes de fantasmas – pessoas que sofrem de ausência de presença – e me comprazo em estar aqui...
Isto é escolha.

Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 28 de novembro de 2011.
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
E-mail: seridoano@gmail.com

Nenhum comentário:

Postar um comentário