Um grão de arroz sobre a mesa. E o meu olhar sobre ele. Então, perplexidade ao me dar conta que esta coisinha parou com a mão o meu dia, minha vida talvez. E era como se me afrontasse em sua relativa pequenez, porque de seu tamanho já não ousava emitir juízos de humildade. Era grão, banquete pascal de um núcleo familiar qualquer de formigas, se isto houvesse assim como não há. Ali a pequena massa a me lembrar impotência e fome de miseráveis, aqui, na África e em guerras, no mundo todo onde há gente e se sonha com algo mais que pão, até na dor dos ricos que padecem desse mal e não sabem... Mas também a beleza forjada, enigmas de sedução, potência seminal. Afinal, este grão de arroz não poderia ter sido pó a enfeitar as faces das amigas de minha avó? E eu subitamente me torno um chinês, a sonhar cozido arroz em cena de um filme em preto e branco e palitos de pegar. Há, há... A voz popular brasileira a cantar o que eu já sei: “o amor da gente é como um grão”... Clarão, de mandarim a esta canção. E, o que era só um grão de arroz me humilhou, das baixezas de sua insignificância em face do universo. Eu outra vez pequeno, não gigante, a olhar o que sozinho é quase nada. Eu quase nada, só o universo em expansão... Não, tudo ficaria pequeno, sob o signo deste grão de mostarda transviado! Desafiador era o seu olhar sobre mim, a devorar-me. Política metafísica! Em instantes a minha cabeça, como a de João, numa bandeja de prata. Julgou-me e sentenciou-me este grão de arroz. Mas, então, aconteceu o milagre: nele o Reino, o banquete, festim, a pomba voadora, Deus sorrindo, a colheita, feixes de alegria, baldes de esperança, aviões de Santos Dumont, um punhado de estrelas, tudo, até os meus mortos ressurretos... Aleluia! No grão de arroz existiu meu arrozal!
Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 1.º de novembro de 2010.
Blog: www.antoniofabiano.blogspot.com
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Irmão, você é fino até para descrever a importância de um grão de arroz. Um abraço cheio de saudade! JFS
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