Fotografia de Antonio Fabiano
Depois de um tempo sem
escrever crônicas neste blog, resolvi voltar a fazê-lo. É possível que alguém
me leia, mas não é nisto que estou pensando agora. Se você quiser participar, caro (hipotético) leitor, ficarei feliz. Mas sinta-se à vontade para parar por aqui, caso não queira passar ao parágrafo seguinte. O que eu vou dizer não serve pra nada... Ou, talvez... só sirva pra nada!
Algumas
vezes caminho e sinto incontrolável desejo de escrever. Será que sou
peripatético ou só patético? Saio a caminhar por prazer e por necessidade,
uma vez que – “oh, tão jovem!” – descobriram-me hipertenso. Olha, estou
confessional já no segundo parágrafo! Perdoe-me, leitor! Isso é tão indiscreto
quanto alguém com menos de cinquenta anos chamar-me, aos 36, de “oh, tão
jovem!” e, com cara forçada de espanto, dizer “já hipertenso!”. As pessoas mentem
de maneira muito indiscreta, quando mentem por educação ou falsa solidariedade.
Mas eu queria mesmo era
falar do prazer, não da necessidade, de se caminhar. Como dizia, saio quase ao
final da tarde e nestes dias de horário de verão há claridade até dentro da
noite. (Ainda era primavera, quando começou o horário de verão, então pensei: soberbo é o verão!) Assim,
posso contemplar o pôr-do-sol sem ter pressa de
voltar a casa. A lua duela no céu com o dia, nestas horas, como nos primeiros
instantes de algumas manhãs.
O que eu mais gosto é
da cor que se forma no mundo, quando a tarde cai de mansinho. Uma dormência
invade a terra e o coração, todos se tornam, ao menos um pouco, contemplativos.
É exatamente esta
indefinição, este trânsito entre o dia e a noite, o não ser mais dia nem ainda
noite, a coisa inominável que amo nos finais de tarde. Não, a palavra não é
crepúsculo! Falo sério quando digo que é inominável, ao menos para mim.
Antigamente,
quando eu vivia em minha cidade de origem, a linda e pequeníssima Cerro Corá,
costumava ir à praça para ver o pôr-do-sol que acontecia bem mais cedo do que
aqui. Sobre o açude Eloy de Souza e as montanhas, as horas desciam sagradas.
Nunca soube
dizer se é laranja ou vermelha a cor de que se pintam os montes quando a tarde
cai relutante, como namorados ao se despedirem. Também nunca soube dizer o que
vai na alma quando vejo esta tela viva das esferas, tarde após
tarde... (sem propósito algum e para poucos expectadores). Quanto tempo dura a tonalidade abstrusa de que se vestem as árvores e tudo o que existe, ao assumir aquele aspecto impenetrável do mistério que se mostra
para se esconder ainda mais? É uma adoção e um desamparo tão grandes! Nunca
poderá chamar-se tristeza ou nostalgia... Nem se assemelha à alegria, porque, diferente
da alegria, essa outra dádiva é incomunicável. Mais parece um
monge a rezar em estado de graça, imóvel como uma estátua, tão dentro dele
mesmo que dirão: “está fora de si, o pobrezinho!... deixemo-lo em paz!”.
Antonio Fabiano
www.antoniofabiano.blogspot.com.br