segunda-feira, 16 de agosto de 2010

E SE EU NÃO VOS FALAR DE DEUS...

Parece estranho que este fradezinho, em seus escritos “bloguísticos”, fale de pedras, ventos, peixes, ipês de todas as cores, cores, fale de tantos homens e mulheres, atrizes, amores e tudo... e não fale de Deus! Terá perdido a fé? Não caberia em seu discurso, mais adequadamente, uma fala apologética, em tempos como estes? Ou, quem sabe, uma exaltação da Santa Cruz? Um tratado sobre a virgindade fecunda de Maria? O amor de Deus e Seu Sagrado Coração? Quem sabe, até mesmo um apelo à conversão dos pecadores? Tantos, tantos!!!... E por que faz versos pra um cravo e não faz versos pra Deus? A Igreja, não lhe bastaria? E este fradezinho perdido em miudezas!... Desesperou da salvação?

Ah, meus amigos, quando me dizem isso eu rio e um rio corre solto dentro de mim! Nessas horas eu me lembro do velho poeta do Sul, Quintana, o Mário, em seu poema, aquele, “Se eu fosse um padre” e tal... Ele versejou que, se ele fosse um padre, em seus sermões não falaria nem de Deus nem do pecado, muito menos do... “Anjo Rebelado”. Também não falaria, terminantemente, nem de profetas nem de santos! Pra quê? Ele citaria – se ele fosse um padre – os poetas! E sabem por quê? Responde, ó Quintana: “Porque a poesia purifica a alma / ...e um belo poema – ainda que de Deus se aparte – / um belo poema sempre leva a Deus!”

Não sou tão poeta quanto Quintana! Mas acredito nisso! Na poesia nos encontramos todos! Quando lemos um poeta mulçumano, judeu ou cristão, um poeta ateu, agnóstico ou... qualquer um!...: na poesia nos encontramos todos! Os místicos – de todos os credos e não credos – falam a mesma língua e essa língua é uma língua de (fogo? não!; espada? não!) poesia! Na poesia eles se esbarram e... se calam! (Abismados que estão no mistério mais subido!). Porque ali, na linguagem suprema, mora o silêncio. Os poetas emprestam a voz pra isso: pra que se faça silêncio... No fundo nem são poetas pra eles mesmos, apenas abrem as mãos e agarram uma fagulha quase imperceptível do grande mistério da vida. E se dizem bem o não dizível, é de todos o dom! Ninguém é dono da poesia! Ela é que se assenhoreia de nós e nos poetiza. Ai, pronto, o milagre acontece!...

Poesia é difícil de explicar: é absolutamente inútil! Explicar é impossível, inútil mesmo é a poesia! Já o disse. É coisa de quem ama, fracassa, perde, chora, goza, ri, tudo!, não necessariamente nessa ordem, mas com toda a extensão e imprevisibilidade da vida. Poesia é coisa de gente! Poesia é coisa de doido! E, graças a Deus, só os muito normais não a percebem! Mas eu não digo só de abrir um livro, pra ler versos, coisa e tal... Se você alguma vez sorriu ao – por exemplos – ver seu filho dormir... ou cantou sozinho no banheiro, só porque recebeu aquele olhar daquela pessoa... ou fala com seu bichinho de estimação... ou viu passarinho verde e tá rindo à toa... ou amou alguém (tem coisa mais patética que o amor?)... ou fechou os olhos para ouvir pela milésima vez aquela canção... ou, sei lá, acha que dar ou ganhar uma rosa pode fazer alguém feliz e até mudar sua vida... Se você já fez ou viveu algo assim, você... (desculpe dizer, mas...) você... Você não é normal! E o que é pior, você é poeta! Pronto, disse! E depois de um poema... ah, depois de se sujar de poesia, com a reputação por terra... você se descobre verdadeiramente humano! Tudo se humaniza e se diviniza... o que, no final das contas, dá no mesmo!

Já ouvi Adélia Prado dizer não sei quantas vezes nada sobre um poema do Carlos Drummond de Andrade. É um poema que fala de uma tarde de maio. Eu já o li (não por causa dela, mas por causa dele), quase bastantes vezes, e também não canso. Dá-nos uma comoção de espírito, uma reviravolta nas entranhas, um aperto no coração e uma alegria quase de grito (com aquela vontade ridente de chorar)... Mas o poema não fala de nada! É sério!!! E isso é poesia! Mas também seria poesia se falasse de qualquer coisa ou tudo! Basta que seja poesia! É como Deus! Não precisa ser mais nada, basta-se! E eu nunca vi alguém morrer de poesia, mas de coisas muito sérias sim!

Você já reparou que tem coisa que a gente só vê depois de ser poeta? Eu vi uma pedra, pela primeira vez na vida, aos 21 anos: depois de ler aquele poema bobo do Drummond. Tem gente que só viu estrela depois de ler Bilac. Outros só amaram de verdade quando lhes aconteceu Vinícius. E por aí vai... Tá, eu não sou normal. E se você sentiu (sem precisar entender) isso que eu disse, você também não é normal. Então, porque poetizados, estamos quites!

Antonio Fabiano
Belo Horizonte, 16 de agosto de 2010.
Blog: http://www.antoniofabiano.blogspot.com/
E-mail: seridoano@gmail.com

6 comentários:

  1. Que alegria começar a semana com essas palavras, querido Frei. Ao ler seu belíssimo texto me veio à mente uma frase de Victor Hugo: "A palavra, como se sabe, é um ser vivo". Ouso acrescentar que a poesia é o melhor habitat para esses seres cuja espécie só os anormais sabem compreender...Grande abraço!

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  2. Meu querido fradezinho!!! kkk, só vc mesmo pra se intitular fradezinho, quando na verdade muitos queriam ser uma fagulha ou ter uma de suas virtudes. Não vou elogiar muito, pois vc é humano e sei de suas peripécias kkk. Bom, esses trechos belissimos do seu texto, me fazem lembrar Adélia Prado, quando ela dizia que a poesia a aproximava de Deus, mesmo sem falar dele...não sou poeta, mas vejo que os poetas são místicos, mas a mística que eles tratam é das coisas simples. Aqui lembro Santa Teresinha que fez da simplicidade sua maneira mais profunda de relacionar-se com Deus. Continue nos aproximando de Deus com seus escritos e digressões...Abraços, meu querido Fradezinho.

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  3. Nossa! Frei fabiano, fico feliz de poder ver você escrever sobre a poesia e seus poetas e mim pergunto. O que seria do mundo sem os sonhadores, sem os visionáios.felicidades!

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  4. Querido amigo Fabiano. Desculpe pela falta do frei, mas é difícil para mim, colocar frei antes de amigo. Amigo das letras, das poesias, do Navegos, do pouso...
    Que lindo blog! Só podia ser seu mesmo, seu jeito, suas palavras, seus sentimentos.
    Estarei sempre por aqui, lendo para me inspirar, se assim o permitir.
    Um abraço bem apertado dessa amiga que sente muito a sua falta.
    Rúbia Montenegro

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  5. Querido amigo Frei Fabiano, como fiquei feliz em encontrar seu blog; agora posso dizer que encontrei reflexões que muito irão ajudar-me nesse meu novo estilo de vida. Também me identifiquei bastante com su jeito de escrever e de ver a vida. Que O Espírito Santo continue te inspirando e que vc estja sempre aberto a escutar a voz de Deus que fala em tudo e em todos. Com orações e carinho, Ir. Elisabete, ocd( Vanessa) Bananeiras - PB

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